6 Mar, 2024

“A Patologia Clínica é a Medicina Interna dos meios complementares de diagnóstico”

Helena Brízido é Presidente da Sociedade Portuguesa de Patologia Clínica e, em entrevista ao SaúdeOnline, destaca a relevância de uma especialidade que pode, inclusive, evitar que o doente passe por exames mais invasivos.

Quais são os principais desafios da Patologia Clínica atualmente?
O grande desafio passa por evidenciar o papel do médico patologista clínico e a importância da sua integração em equipas multidisciplinares onde, com a sua formação base em medicina e uma especialização em laboratório, desempenha as funções de consultor, orientando e otimizando a prescrição das análises clínicas feitas pelas outras especialidades médicas.

Conseguimos, assim, rentabilizar recursos e reduzir custos, diminuindo substancialmente o número de análises solicitadas e a sujeição do doente a exames mais invasivos de forma desnecessária. Ainda assim, a Patologia Clínica continua a ser uma especialidade médica desconhecida para muitos. Apesar da sua importância, continuamos a lutar pela afirmação da Patologia Clínica junto dos nossos pares e do público em geral.

É uma especialidade transversal. Como avalia a interligação com outras especialidades médicas, nomeadamente dentro de equipas multidisciplinares?
Utilizo, frequentemente, uma frase que define muito bem a transversalidade desta especialidade: a Patologia Clínica é a Medicina Interna dos meios complementares de diagnóstico. A nossa especialidade cobre todas as áreas médicas (Hematologia, Química Clínica, Microbiologia, Imunologia e Genética), pelo que está presente em todos os processos de prevenção, diagnóstico e follow-up de todas as especialidades. O conhecimento específico do médico patologista clínico é crucial na decisão nas diversas fases da prescrição das análises clínicas, pelo que consideramos fundamental a sua integração nas equipas multidisciplinares, aumentando a interligação com as outras especialidades médicas.

“A Patologia Clínica continua a não ser muito atrativa quando chega a hora de escolher a especialidade a seguir… Acredito que essa falta de atratividade esteja mais relacionada com a falta de conhecimento do potencial desta especialidade”

É uma área que implica muita tecnologia. Os patologistas clínicos sentem que no SNS têm as condições mais adequadas, já que a evolução tecnológica implica sempre verbas?
 A importância de acompanhar a evolução tecnológica e adequar a resposta técnico-científica do Laboratório acaba por se sobrepor e justificar o investimento em novas tecnologias, contribuindo para a melhoria qualidade da atividade assistencial. Muitas vezes, no próprio SNS estas novas tecnologias são mais rapidamente implementadas, sem que seja avaliado de forma aprofundada o custo-benefício da medida e a futura melhoria na eficiência.

A especialidade é atrativa para os jovens? Quando se pensa em Medicina existe muito a ideia de que todos querem contactar diretamente com os doentes…
A Patologia Clínica continua a não ser muito atrativa quando chega a hora de escolher a especialidade a seguir… Acredito que essa falta de atratividade esteja mais relacionada com a falta de conhecimento do potencial desta especialidade do que pelo pouco contacto com os doentes. Aliás, esse é mais um dos mitos e desconhecimento em relação à nossa especialidade. Há contacto com os doentes em diversas áreas da Patologia Clínica: durante a realização de exames mais invasivos, como a colheita de medula óssea ou durante as consultas de hipocoagulação, por exemplo. Será importante dinamizar o contacto com a Patologia Clínica durante a formação universitária pré-graduada e a formação geral do Internato Médico, abrangendo as diversas vertentes do nosso trabalho, para assim motivar os colegas para esta escolha.

“Os próximos 3 anos serão desafiantes e fundamentais para consolidar a afirmação da Patologia Clínica no panorama nacional, sendo a assinatura do protocolo de colaboração com a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, o primeiro passo”

No Congresso deste ano vai haver uma sessão sobre “Saúde Mental dos Internos”. Como presidente da SPCC, o que mais a preocupa neste âmbito?
Este tema e preocupação é transversal a todas as especialidades e preocupa-me que, muitas vezes, seja descurado ao longo de uma fase tão difícil e exigente por que todos os médicos especialistas atravessam, o internato da especialidade. Saliento a importância de se assumir a saúde mental como primordial e a importância de se definir estratégias para promover o equilíbrio pessoal-profissional.

Relativamente à atividade da SPCC, o que gostaria de destacar para os próximos tempos?
A SPPC tem como principal objetivo representar e empoderar os médicos patologistas clínicos, pelo que pretendemos continuar a investir na formação contínua, dirigida aos médicos internos e especialistas. Iremos desenvolver, para além do nosso congresso nacional anual, outras atividades. Mantemos o habitual ciclo anual de webinares nas diversas áreas de atuação e teremos, pela primeira vez, um evento dedicado à divulgação e promoção da Patologia Clínica junto dos colegas mais novos, o Patclinopen. Pretendemos atrair os médicos recém-formados a escolher a nossa especialidade ao mesmo tempo que tentaremos aproximarmo-nos dos recém-especialistas, envolvendo-os na dinamização dos nossos grupos de trabalho.

Os próximos 3 anos serão desafiantes e fundamentais para consolidar a afirmação da Patologia Clínica no panorama nacional, sendo a assinatura do protocolo de colaboração com a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, o primeiro passo para reforçar a presença da especialidade junto dos nossos pares. Está igualmente prevista a assinatura de colaborações com sociedades internacionais, nomeadamente a Sociedade Espanhola congénere.

Finalmente, estamos a desenvolver o projeto de elaboração de um Manual de Patologia Clínica com o intuito de auxiliar na prática todos os Patologistas clínicos, através da uniformização de procedimentos e divulgação da informação mais atual do estado da arte nas várias valências da especialidade.

MJG

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