25 Out, 2023

O custo do Estado por cada doente em diálise decresceu 21%

Um estudo da NOVA IMS demonstra que “a quebra no financiamento do tratamento da doença renal crónica não acompanha nem o crescimento do número de doentes em diálise, nem o aumento nos custos devido à inflação”.

O custo do Estado por cada doente em diálise decresceu 21% entre 2010 e 2021, um cenário que contrasta com o aumento de 40% do número de pessoas em diálise e de 22% da despesa total per capita em saúde. Esta é uma das principais conclusões do Estudo ‘Dialysis financing models: is there a sustainable financing model in Portugal?’, desenvolvido pelo NOVA Center for Global Health Lab, centro de investigação da NOVA Information Management School (NOVA IMS).

De acordo a investigação, o modelo de financiamento da diálise vigente em Portugal, por preço compreensivo, e que engloba os tratamentos por hemodiálise e diálise peritoneal, registou igualmente uma redução de 27% no preço semanal real gasto pelo Estado, que é despendido em diálise com acessos vasculares. No último ano, ficou nos 377,54 euros semanais.

Sobre o aumento da prevalência da doença renal crónica, a equipa concluiu que a mesma se deve a uma maior longevidade da população em geral, mas também ao incremento de fatores de risco como a diabetes ou a hipertensão.

“O aumento de anos de vida em doentes com patologias cardiovasculares e neoplásicas conduziu ao crescimento do número de pacientes com doença renal crónica, tornando Portugal o segundo país com a incidência mais elevada na Europa e uma das maiores no mundo.”, lê-se em comunicado.

Em relação à subida da despesa, os investigadores consideram que se está perante uma “realidade polarizada”.  “Por um lado, tem-se vindo a registar ao longo dos anos um crescimento dos custos associados a salários, introdução de inovação terapêutica, instalações, entre outros fatores; em contraparte, o orçamento estipulado pelo SNS para o preço compreensivo é cada vez menor, dificultando a acomodação de custos cada vez mais significativos.”

Especialista alerta para possível “retrocesso brutal”

Um dos autores, o nefrologista Aníbal Ferreira, em entrevista ao SaúdeOnline, lembra que Portugal foi o primeiro país europeu a optar pelo pagamento compreensivo na diálise, englobando tratamentos mas também outros pontos, como pagamento de salários, ao contrário de outros países.

“Foi completamente inovador”, enfatiza. Contudo, face aos resultados do estudo, o especialista lembra que os prestadores de diálise, em Portugal, ocupam 90% do mercado. “Caso se mantenha este pagamento [por parte do Estado] claramente insuficiente, caminhamos a passos largos para estas empresas deixarem de operar no país, deixando a gestão de clínicas e optando pela venda de produto como noutros países.” “Se isso vier a acontecer, será um retrocesso brutal em termos de segurança e de qualidade da diálise”.

O médico salienta que, a entrada destas empresas em Portugal, permitiu “aumentar a qualidade de diálise prestada”, nomeadamente ao não reutilizarem os dialisadores, “uma prática totalmente desaconselhada face ao risco aumentado de infeções”.  “O mesmo filtro chegava a ser utilizado  20 vezes no mesmo doente”, lembra. A certificação internacional foi outra mais-valia da entrada destas empresas, ao obrigar à uniformização das boas práticas nesta área.

Aníbal Ferreira esclarece, contudo, que não defende “necessariamente mais euros, mas que “se deve gastar melhor o dinheiro”. Como explica: “Alguns doentes não necessitam de terapêutica tão intensiva, outro sim, como doentes mais jovens, candidatos a transplantes, jovens diabéticos candidatos a transplante rim-pâncreas, em doença cardíaca e renal.”

Não havendo uma aposta no pagamento real deste tratamento, o nefrologista alerta que “deixa de poder haver um investimento nas terapêuticas mais inovadoras, que são mais dispendiosas”. “A única solução é rever urgentemente os custos, preços e condições deste preço compreensivo que não é revisto desde 2008, estabelecendo também classes de doentes em função das comorbilidades, mas de uma forma descomplexada, sem desconfianças e sem posições irredutíveis”, conclui.

MJG

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