“Será uma reunião diversificada, multidisciplinar e inovadora dentro da área da diabetes”
Pedro Caiano Gil é o responsável pela 18.ª Reunião do Núcleo de Estudos da Diabetes Mellitus da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna. Em entrevista aborda os principais temas do evento, que terá “algumas temáticas fora da caixa”.

O que se pode esperar da 18.ª Reunião do Núcleo de Estudos de Diabetes Mellitus (NEDM)?
Na construção da 18.ª Reunião Anual do NEDM foi nossa preocupação, enquanto comissão organizadora, ter um programa abrangente, atual e interessante, mas que ao mesmo tempo não se ficasse pelo que tem sido mais habitual e se estendesse para algumas temáticas fora da caixa. Será, assim, uma reunião diversificada, multidisciplinar e inovadora dentro da área da diabetes, tendo como grande objetivo proporcionar um encontro proveitoso e de elevada qualidade científica para quem gere e trata a pessoa com diabetes.
Falaremos não só do tratamento, das complicações e das comorbilidades associadas à doença, mas também da prevenção e das adaptações de estilo de vida que permitem melhorar a qualidade de vida dos utentes. Para além de mesas-redondas sobre diabetes tipo 1, diabetes e órgão vitais e longevidade, e dos três simpósios, haverá uma conferência inaugural com o Prof. Doutor António Sarmento sobre “Infeção e Diabetes”, uma tertúlia relacionada com a Oncologia e uma conferência sobre as particularidades das diferentes dietas na pessoa com Diabetes.
Uma das mesas redondas é dedicada à diabetes tipo 1. Em reuniões anteriores tem havido um maior enfoque na diabetes tipo 2, acompanhada, essencialmente, por internistas. Qual o objetivo desta mesa?
A Medicina Interna, como especialidade integradora e capaz de uma abordagem clínica global, está presente ao longo da evolução de inúmeras doenças, desde a sua prevenção, ao respetivo diagnóstico e implementação posterior da terapêutica médica.
Para além disso, o campo de ação desta especialidade abrange não apenas o internamento (hospitalar – na enfermaria ou em cuidados intermédios – ou mais recentemente domiciliário), mas também o ambulatório (nomeadamente em alguns hospitais portugueses, onde é a única especialidade que acompanha e orienta utentes com diabetes tipo 1) e os serviços de urgência/emergência (onde, por vezes, se fazem diagnósticos inaugurais de diabetes tipo 1 e surgem frequentemente os episódios de complicações agudas da doença – sejam eles quadros de hipoglicemia ou cetoacidose diabética).
Faz, por isso, todo o sentido ter na reunião do NEDM da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna uma mesa dedicada à diabetes tipo 1. O principal objetivo da mesa é fazer uma ponte entre o presente e o futuro do tratamento desta patologia, tendo como ponto de partida as atuais opções terapêuticas que dispomos e perspetivando algumas das possíveis alternativas tecnológicas que teremos daqui em diante.
“Inúmeros estudos científicos sugerem que pessoas com diabetes, em especial diabetes tipo 2, têm risco aumentado de desenvolver determinados tipos de neoplasias”
A doença oncológica é outro dos temas a abordar. Quais os principais desafios que os internistas enfrentam neste campo?
Estima-se que nas próximas duas décadas o número de novos casos de cancro na Europa e a nível mundial irá aumentar significativamente, tal como a mortalidade que lhe está associada. Para além de múltiplos fatores de risco, o aumento da esperança média de vida e o envelhecimento da população irá contribuir para estes números.
Os avanços na medicina e na tecnologia permitem diagnósticos mais precisos e mais precoces, no entanto a rápida evolução na área da Oncologia e a cada vez maior complexidade de opções terapêuticas, cada uma com os seus próprios efeitos laterais (inclusivamente o potencial desenvolvimento de diabetes de novo) e interações medicamentosas, implicam uma necessidade de atualização constante por parte dos médicos e uma colaboração e comunicação multidisciplinar cada vez maior próxima.
O internista, através da sua visão holística e da coordenação dos cuidados centrados no doente, desempenha um papel fundamental na gestão das comorbilidades associadas à doença oncológica e ao seu seguimento clínico, bem como na monitorização e acompanhamento de potenciais recidivas e complicações dos tratamentos.
E existe uma relação entre diabetes e cancro?
Sim, existe. Inúmeros estudos científicos sugerem que pessoas com diabetes, em especial diabetes tipo 2, têm risco aumentado de desenvolver determinados tipos de neoplasias. Fatores como a própria hiperglicemia, a insulinorresistência e os níveis elevados de insulina, a obesidade, a inflamação crónica e alterações hormonais podem ser particularmente importantes. Além disso, o estilo de vida (nomeadamente a dieta e o nível de atividade física) também pode influenciar, não só a diabetes como também o risco de desenvolvimento de diversas neoplasias. Finalmente, os indivíduos com diabetes têm habitualmente taxas de mortalidade e de recorrência neoplásica mais elevadas, pelo que é importante a manutenção de um acompanhamento médico regular e um estilo de vida saudável para mitigar esses riscos.
“Portugal é um dos países europeus com uma das mais elevadas taxas de prevalência da diabetes, estimando-se que quase metade dos casos está por diagnosticar”
Em relação à questão da longevidade, a diabetes é uma das patologias que mais preocupam os internistas?
Com certeza. Portugal é um dos países europeus com uma das mais elevadas taxas de prevalência da diabetes, estimando-se que quase metade dos casos está por diagnosticar. Além disso, verifica-se um forte aumento da prevalência da diabetes com a idade, sabendo-se hoje que mais de um quarto das pessoas entre os 60-79 anos de idade tem diabetes.
Em grande parte dos países desenvolvidos, a diabetes é a principal causa de cegueira, insuficiência renal e amputação de membros inferiores e constitui uma das principais causas de morte, estando associada a um risco significativamente aumentado de doença coronária e cerebrovascular. Estes factos impactam não só individualmente a qualidade de vida da pessoa com diabetes, como também a nível populacional e da própria sociedade, com inevitáveis consequências socioeconómicas para todos.
É necessário, portanto, uma promoção de estilos de vida saudáveis e um controlo adequado da diabetes, para tentar prevenir a doença e as complicações que lhe são inerentes, que podem impactar negativamente a longevidade. Uma alimentação saudável, associada a atividade física adequada e plano vacinal individualizado são cruciais para um envelhecimento saudável.
Gostaria de destacar mais algum momento do evento?
Destacaria o curso pré-congresso sobre “Insulinoterapia e novas tecnologias na Diabetes”, que se realiza na tarde de quinta-feira, dia 24 de outubro, e a conferência final da reunião no encerramento da manhã de sábado com o Prof. Doutor João Nabais, vice-presidente da International Diabetes Federation e ele próprio uma pessoa com diabetes tipo 1, que nos irá falar sobre a sua experiência e percurso enquanto utente com diabetes e profissional ligado a esta área, e a respetiva dicotomia que lhe está associada.
MJG