Senado da Argentina rejeita despenalização do aborto
Tal como tinha acontecido na Câmara dos Deputados, votação foi decidida por poucos votos. Violência estalou nas ruas de Buenos Aires entre apoiantes e opositores do projeto-lei.
Depois de um longo debate, que se prolongou por mais de 15 horas, o Senado argentino rejeitou esta quinta-feira o projeto-lei que permitia legalizar a interrupção voluntária da gravidez até às 14 semanas de gestação. A votação final resultou em 31 votos a favor e 38 contra.
O tema é polémico no seio da sociedade civil argentina. Nos dias que antecederam a votação final do Senado surgiram várias sondagens, algumas indicando uma vantagem do “sim” à despenalização e outras dando vantagem ao “não”. A divisão praticamente simétrica da opinião pública já tinha ficado bem expressa aquando da votação na Câmara dos Deputados, a meio de junho, quando 129 parlamentares votaram a favor do projeto-lei e 125 contra.
Esta quarta-feira, enquanto decorria a votação, centenas de manifestantes a favor e contra a legalização do aborto no país concentraram-se junto ao edifício do Senado, em Buenos Aires. Depois de ser conhecido o resultado da votação dos senadores (o último obstáculo até à aprovação da lei, uma vez que o presidente Maurico Macri já se tinha comprometido a não vetar a despenalização do aborto), estalou a violência nas ruas. Há registo de manifestantes que queimaram madeira e lixo e arremessaram pedras e garrafas contra a polícia como forma de protesto. A polícia de intervenção foi chamada ao local e terá usado gás lacrimogéneo e canhões de água para dispersar os manifestantes.
O movimento feminista pró-aborto, que adotou a cor verde como símbolo, e o lema “Ni una Menos” – em alusão à violência contra as mulheres – já responsabilizou a igreja católica pelo chumbo do projeto-lei. “A igreja pôs pressão nos senadores para votarem contra o projeto-lei”, acusa Ana Correa, membro fundador do movimento. Num país profundamente católico, o lobby da igreja ainda tem grande influência junto dos decisores políticos.
“Seria a primeira vez que a Argentina democrática permite a eliminação de um ser humano por outro”, afirmou Oscar Ojea, presidente do Sínodo dos Bispos da Argentina, sucessor neste cargo do atual papa Francisco, que também se mostrou contra o lei. O papa terá mesmo, segundo o jornal argentino Clarín, pedido aos senadores contra o aborto para fazerem pressão sobre os restantes colegas para que a lei fosse rejeitada.
Segundo estimativas do Ministério da Saúde, entre 350 mil e 450 mil grávidas abortam por ano de forma ilegal, uma a cada minuto e meio. Na América Central e do Sul, o aborto só é legal em cinco países: Cuba, Uruguai, Guiana, Guiana Francesa e México. A luta pela despenalização na Argentina é visto como um sinal de esperança para o vizinho Brasil, onde o aborto é proibido na maioria das situações.
Com esta decisão, mantém-se em vigor a lei aprovada em 1921, que só autoriza a interrupção voluntária da gravidez em caso de violação ou risco de vida da mãe.
Saúde Online