24 Fev, 2017

Restrições à imigração impostas por Trump atingem milhares de profissionais de saúde

No mundo de língua portuguesa, o Brasil é, até agora, o país mais afetado pelas medidas da nova administração. O número de vistos de turistas negados a brasileiros subiu para pouco mais de 15%, um aumento de três vezes em relação a 2015 (5,36%), e cinco vezes mais em relação a 2014 (3,2%)

A ordem executiva de 27 de janeiro do presidente norte-americano Donald Trump, que baniu a entrada de cidadãos de sete países – Irão, Iraque, Síria, Iémen, Somália, Líbia e Sudão – foi apenas o início de uma série de mudanças na política de concessão de vistos de entrada naquele país, e que podem ter impacto, também, nas deslocações de médicos e estudantes de Medicina que pretendam viajar para os EUA. Isto porque os projetos de restrição de vistos em estudo na Casa Branca também propõem alterações à concessão de vistos tipo B1 e B2, muito utilizados por médicos que se deslocam aos EUA para participarem em a congressos e conferências, na concessão de vistos F-1 para estudantes e, principalmente nos H-1B, para trabalhadores não-imigrantes em funções especializadas.

No mundo de língua portuguesa, o Brasil é, até agora, o país mais afetado pelas medidas da nova administração. De acordo com informação divulgada pela Medline, as empresas que trabalham na intermediação para obtenção de vistos começaram a sentir problemas ainda durante a administração de Barack Obama, com um aumento considerável na rejeição aos pedidos de visto, tanto para turistas quanto para estudantes de intercâmbio.

Dados do governo americano mostram que o número de vistos de turistas negados a brasileiros no ano fiscal de 2016 subiu para pouco mais de 15%, um aumento de três vezes em relação a 2015 (5,36%), e cinco vezes mais em relação a 2014 (3,2%).

Mas a situação pode ser até pior. O índice de vistos negados parece ter saltado para algo em torno dos 35% a 40% no final do ano passado, segundo estima Daniel Magalhães, diretor da Globalvisa, empresa especializada em consultoria de processos migratórios.

No caso brasileiro, o motivo da recusa de emissão de vistos é basicamente económico. Até 2016, os brasileiros eram bem-vindos aos Estados Unidos uma vez que as deslocações eram maioritariamente para fins turístico, compras e frequência de cursos de inglês. Mas, com o agravamento da crise económica, o número de brasileiros que entraram nos Estados Unidos com vistos de turista e de estudante e lá permanecem ilegalmente disparou, fazendo soar alerta no Departamento de Estado dos EUA, que tem instruído os consulados no sentido de serem mais restritivos na atribuição de vistos.

Paula Cordeiro, da Admedic Tours, empresa portuguesa especializada na organização de eventos científicos, disse ao SaúdeOnline que até ao momento as limitações da nova administração americana ainda não se fizeram sentir. “O que não quer dizer que não venhamos a ter os mesmos problemas num futuro próximo”, ressalvou. De acordo com a empresária, a ausência de repercussões em Portugal poderá dever-se, também, ao facto de não nos encontrarmos ainda na “época” mais movimentada do calendário de reuniões científicas nos EUA. “Quando chegarmos lá, logo veremos”, conclui.

A ordem executiva de Trump, por enquanto suspensa por decisão judicial, não só afetou a vida de milhares de pessoas portadoras de vistos e green cards (residentes permanentes), como abalou a comunidade da área de saúde dos Estados Unidos. Segundo a The Medicus Firm, empresa especializada em recrutamento de médicos, 15.000 médicos que atuam hoje nos EUA são naturais daqueles sete países, entre os quais 9.000 iranianos, 3.500 sírios e 1.500 iraquianos. Os serviços médicos americanos têm enorme dependência de mão-de-obra estrangeira, notadamente para médicos de família, medicina interna, pediatras, e cirurgiões gerais, áreas com remuneração mais baixa, e que por isso que não atraem os médicos nascidos nos Estados Unidos. São também estes médicos os poucos que aceitam trabalhar em áreas rurais e cidades de pequeno e médio porte, com populações entre 25 mil e 500 mil pessoas.
De acordo com Andrea Clement, porta-voz da Medicus, é nesses locais que atuam 76% dos médicos estrangeiros em atividade nos Estados Unidos. Boa parte também trabalha em hospitais que atendem pacientes do Medicare e Medicaid (os planos de saúde pagos pelo governo americano a idosos e pessoas abaixo da linha da pobreza), além de hospitais de veteranos de guerra.

De acordo com reportagem publicada pelo jornal The New York Times, a oferta de vagas para internato médico nos EUA é 22% superior às necessidades geradas pelas universidades americanas, e são preenchidas principalmente por profissionais graduados na Índia, no Paquistão, na China, nas Filipinas, no Irão e em Israel. Esses profissionais entram nos EUA com o visto J-1, o mesmo exigido de mestrandos e doutorandos que recebem salário ou bolsas de estudo de instituições americanas, trabalham em instituições de primeira-linha e devem regressar a seus países de origem no prazo de três anos. Na prática, os médicos conseguem prolongar sua permanência por anos, trabalhando em regiões que o Departamento de Saúde classifica como carenciadas em termos de médicos, ou seja, onde há menos de um médico para cada três mil habitantes. Depois de cinco anos, esses profissionais podem solicitar o green card e exercer em qualquer parte do país. Na mesma situação que os médicos, estão outros profissionais da saúde, como fisioterapeutas, dentistas e farmacêuticos.

SO/MM/Medline

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