10 Jan, 2022

40% da população portuguesa não tem acesso a médico de família

Muitos profissionais continuam alocados ao acompanhamento de infetados e a outras atividades relacionadas com a pandemia, o que prejudica os utentes com doenças crónicas ou as grávidas, alertam os médicos.

É um problema que se arrasta há quase dois anos e que se agrava de cada vez que a pandemia se agiganta. A atividade regular dos centros de saúde continua a ser afetada, uma vez que os médicos de família mantêm o acompanhamento aos doentes positivos ou suspeitos de infeção por SARS-CoV-2, para além de atenderem nas áreas dedicadas a doentes respiratórios, os chamados ARD, e de marcarem também presença nos centros de vacinação.

O resultado é que parte da população fica sem acesso aos cuidados de saúde primários, o que afeta, nomeadamente, o acompanhamento de patologias crónicas (como a diabetes ou a insuficiência cardíaca) e de grávidas e recém-nascidos. Segundo contas do secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), em declarações ao Expresso, “no total isto significa que há quase quatro milhões de portugueses por dia que não têm acesso a médico de família”.

Segundo Jorge Roque da Cunha, são “4300 médicos por dia só para os telefonemas”, a que se juntam mais mil para as ADR e outros 400 para os centros de vacinação.

Aos utentes que veem os seus médicos especialistas em Medicina Geral e Familiar dedicados ao combate à pandemia, somam-se os portugueses que são acompanhados nos centros de saúde por profissionais de baixa médica e aqueles que não têm médico de família atribuído (grupo que tem vindo a crescer e que já ascende a mais de um milhão e 100 mil pessoas).

“Na realidade, os CSP [Cuidados de Saúde Primários] nunca conseguiram recuperar totalmente, nem lá perto, do que foi o impacto da covid-19 na sua atividade”, admite, ao SaúdeOnline, o presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF). Nuno Jacinto alerta que “quantos mais casos suspeitos há e mais doentes são necessários observar presencialmente, mais tempo os médicos de família passam nos ADR e mais profissionais necessitamos de ter em simultâneo” nesses espaços.

“Estamos a olhar para as paredes nos centros de vacinação covid, a telefonar a pessoas com uma gripe normal ou nem isso, apenas com nariz entupido e tosse ligeira, ou a confirmar autotestes nas Áreas Dedicadas para Doentes Respiratórios (ADR)”, critica Nuno Jacinto.

Perante este cenário, o presidente da APMGF admite que, no pós-pandemia, será necessário “correr atrás do prejuízo”. “Ver o que é que aconteceu aos nossos doentes crónicos que foram descompensando ao longo deste tempo. Avaliar a situação dos rastreios, porque obviamente que se há menos rastreios, teremos menos diagnóstico precoce de vários cancros e isso pode acarretar consequências futuras muito complicadas”.

SO

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