Movimento Humanizar Saúde. “A relação entre profissional de saúde e doente exige compaixão”

João Pedroso de Lima começou por se dedicar à humanização de cuidados quando ainda era médico na Medicina Nuclear do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra (CHUC). Apesar de estar aposentado, não desistiu de lutar por cuidados de saúde mais focados numa relação humana, de confiança, entre profissional de saúde, doente e cuidadores. Amanhã, 27 de abril vai lançar o Movimento Humanizar Saúde.

Como surgiu a ideia deste movimento cívico?

Em 2018, ainda trabalhava no CHUC, no Serviço de Medicina Nuclear, e propus ao Conselho de Administração um projeto de humanização do hospital: Projeto H2- Humanizar o Hospital. O objetivo era sensibilizar para a necessidade de se prestar mais atenção às pessoas doentes e aos seus cuidadores. Tratava-se de um projeto baseado na valorização do respeito, da cortesia, da empatia e da compaixão. Uma das linhas de atuação consistiu na promoção da cultura de humanização no CHUC, operacionalizada através de várias ações e múltiplas reuniões com as chefias intermédias do hospital. Uma outra foi a da formação em comunicação interpessoal e criação de empatia, tendo-se realizado dezenas de ações de formação, não só para médicos, mas também para enfermeiros, técnicos, auxiliares, secretariado clínico, assistentes sociais… Mais de 500 profissionais do CHUC frequentaram estas formações, ao longo de 2019. Em 2020 tínhamos planeado aumentar o número dessas ações de formação, mas a pandemia não o permitiu. Entretanto, em 2021, aposentei-me, mas nunca deixei de estar ligado à humanização de cuidados e à Ética. Desse projeto também sensibilizou para a importância  de se diminuir o ruído em ambiente hospitalar. Entretanto, já este ano, através da iniciativa Geração Coletiva, apresentei a ideia de humanizar os cuidados em Coimbra e foi aceite.

 

Foi no âmbito dessa iniciativa que realizou um inquérito que mostrou números preocupantes no que se refere à humanização de cuidados…

Sim. Conclui-se que 98% das 497 respostas obtidas indicaram a necessidade de mais humanização nos cuidados de saúde prestados em Coimbra. Além disso, 74% dos inquiridos referiram ter tido já experiências negativas quanto à humanização dos cuidados prestados em instituições de saúde da cidade (320 dessas experiências foram mesmo especificadas) e 96% apoiariam a criação de um “movimento” de intervenção cívica que promovesse uma cultura de humanização dos cuidados de saúde. A humanização dos cuidados de saúde tem sido uma preocupação desde sempre, mas a sua necessidade é agora sentida como ainda mais urgente.

“A evolução tecnológica é sem dúvida muito útil no diagnóstico e tratamento das patologias mas não se pode relegar para um segundo plano a humanização”

O que pode explicar esses resultados?

A tecnologia e as dificuldades financeiras dificultam a comunicação com os doentes e cuidadores. A relação de confiança entre o profissional de saúde e o doente exige respeito, empatia e compaixão, mas tudo isso é mais difícil com a tecnologia. A evolução tecnológica é sem dúvida muito útil no diagnóstico e tratamento das patologias mas não se pode relegar para um segundo plano a humanização. Acresce o facto de a sociedade ser cada vez mais individualista, e menos sensível à empatia e à compaixão.

 

O problema não estará sobretudo nessa nova forma mais individualista de estar na vida?

Não diria isso. Há múltiplos fatores que contribuem para os défices de humanização nos cuidados de saúde. De facto, a sociedade está cada vez mais individualista, hedonista, pensa muito no prazer imediato. Mas também consegue ser solidária e isso foi visível durante a pandemia. O que não deve acontecer é que essas atitudes se cinjam a momentos de crise.

“Com este movimento pretende-se também ser provedor do doente, estando disponíveis para receber e analisar situações de pessoas que achem que não foram bem atendidas”

Deste movimento fazem parte também representantes da Associação Portuguesa de APPACDM – Coimbra. É também uma forma de chamar a atenção para quem tem necessidades especiais?

Sim, está-se a preparar uma ação para alertar para a importância de se tratar estas pessoas de forma mais personalizada. Com este movimento pretende-se também ser provedor do doente, estando disponíveis para receber e analisar situações de pessoas que achem que não foram bem atendidas, em que sentiram algum défice de humanização nos cuidados – independentemente de se ter necessidades especiais. Devo, contudo, realçar que a nossa intervenção é apenas construtiva, de chamar a atenção.

Quais serão as principais linhas de ação deste movimento cívico?

A promoção de uma cultura de humanização através de seminários e palestras, quer para estudantes de Medicina quer de enfermagem e de técnicas de saúde. Também termos outras para alunos do ensino secundário e para a população em geral. E a tal provedoria do doente, analisando-se situações concretas para que, de forma positiva e construtiva, se possa intervir sempre que seja necessário.

SO

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