“Esta proposta é muito má para os enfermeiros”
Lúcia Leite, presidente da Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros – ASPE, falou ao SaúdeOnline, após uma reunião, ontem, com o Governo, onde se discutiram as tabelas remuneratórias. Na sua opinião, a proposta ministerial trará mais riscos do que benefícios aos profissionais, sobretudo aos enfermeiros especialistas.

Que avaliação faz da reunião de ontem com a secretária de Estado da Gestão da Saúde, Cristina Vaz Tomé?
Esta foi a primeira reunião verdadeiramente negocial, já que nas anteriores ainda não havia contrapropostas. O acordo conseguido, recentemente, com a Plataforma dos cincos sindicatos, foi considerado histórico, mas, pelo que se percebeu ontem, é muito má para os enfermeiros. Daí que tenha ficado agendada nova reunião para dia 7 de novembro. O Governo comprometeu-se em analisar os nossos pontos de vista.
E por que é má?
Porque desvaloriza a carreira de Enfermagem! Atualmente, a diferença de remuneração entre um enfermeiro em início de carreira e um com especialidade – que exige mestrado – é de 200 euros. Com esta proposta do Governo, passava-se para uma diferença de apenas 52 euros! O enfermeiro especialista tem um mestrado, um maior grau de complexidade e de responsabilidade no seu trabalho. Este Governo afirma todos os dias que quer valorizar a Enfermagem, mas com estes valores, está a ser incoerente. É um contrassenso. Aqui só temos duas hipóteses: 1) o Governo acha que os enfermeiros especialistas não têm capacidade para exercer as suas funções; 2) ou existe má-fé.
“Estamos perante um erro grave de conceção [da proposta] ou então existe uma clara intensão de se prejudicar os enfermeiros”
O acordo da plataforma dos cinco sindicatos foi considerado histórico, mas neste momento enfrentam estas questões. Sente-se frustrada?
Sim, porque se fez crer que haveria aumentos salariais e, afinal, com base nesta proposta governamental, a tabela remuneratória é empurrada para a base da carreira, desvalorizando-se a estratificação das três categorias. Estamos perante um erro grave de conceção [da proposta] ou então existe uma clara intenção de se prejudicar os enfermeiros. Existia, de facto, alguma esperança em se corrigir algumas injustiças e em se valorizar uma tabela remuneratória que está abaixo das tabelas da Função Pública e das outras profissões da saúde. Tendo em conta que os aumentos são faseados, até 2027, mantendo-se a ideia defendida atualmente pelo Governo, assistimos, e vamos assistir, a um degradar da profissão, de forma faseada.
Existe também o risco de mais enfermeiros abandonarem o Serviço Nacional de Saúde (SNS)?
Se esta proposta vier a ser aprovada, os mais prejudicados vão ser os enfermeiros especialistas. É preciso retê-los, porque a saída do SNS acontece, sobretudo, para outros países. Portugal forma, anualmente, cerca de três mil enfermeiros, mas perde mais de metade. E porquê? Porque oferecem-se melhores condições salariais. A concorrência é muito grande.
Tem esperança que a situação melhore na próxima reunião?
Ainda tenho alguma expectativa de que a equipa ministerial reconsidere a sua posição.
MJG