Entrevista. “Mais de 90% das pessoas com diabetes têm excesso de peso ou obesidade”

As 12.as Jornadas Práticas de Diabetologia e Obesidade em MGF da Zona Sul vão decorrer entre 2 e 4 de março de 202, no Hotel MH Altântico, em Peniche. Jácome de Castro, o presidente do evento, em entrevista ao SaúdeOnline, fala sobre diabetes e obesidade e alerta para necessidade de se ter tempo para o doente.

Estas Jornadas são uma aposta na aproximação entre a Endocrinologia e a MGF?

Sem dúvida! Estas Jornadas são hoje o grande momento de ligação das duas especialidades no que se refere à diabetes e obesidade, na zona Sul. Este evento tem um cariz de utilidade clínica, assente num modelo de interatividade. Os casos clínicos serão apresentados quer por especialistas como por internos e os temas mais quentes da Diabetologia serão obviamente abordados em várias sessões, algumas inclusive com televoter. Em suma, queremos aproximar a academia, o conhecimento e a ciência da atividade clínica real. Destaco o enfoque nas novas guidelines da diabetes e nos novos fármacos para a diabetes e obesidade, entre outros temas sempre pertinentes, como modelo de consultas de diabetologia e monitorização da doença. Contamos com a presença de internos e especialistas de Endocrinologia, Medicina Geral e Familiar e Medicina Interna, além de enfermeiros e nutricionistas.

“Não nos podemos esquecer do impacto desta patologia, nomeadamente no aparelho cardiovascular com duas a quatro vezes maior risco de EAM e AVC”

Como avalia o problema da diabetes em Portugal?

Em Portugal estima-se que 10 a 15% da população adulta tenha diabetes e que acima dos 65 anos mais de um quarto da população seja diabética. Para além disso, 25% dos portugueses têm pré-diabetes. São números impressionantes! Não nos podemos esquecer do impacto desta patologia, nomeadamente no aparelho cardiovascular com duas a quatro vezes maior risco de enfarte agudo do miocárdio e de se sofrer um acidente vascular cerebral e maior propensão para sofrer de insuficiência cardíaca. Afeta igualmente outros órgãos como o rim, sendo mesmo a primeira causa de insuficiência renal terminal no nosso país. É também a primeira causa de cegueira e de amputação não traumática. Simultaneamente, cerca de um terço das pessoas com diabetes não está diagnosticada, por conseguinte não estão sob controlo. É preciso, por isso, apostar na formação contínua, pós-graduada.

 

E a prevenção? O que falta fazer?

Há muito a fazer na área da prevenção, mas fala-se pouco da importância da vacinação. A pandemia acabou por alertar para a necessidade de se vacinar estes doentes para se evitar doença grave: covid-19, gripe, pneumonia, herpes zooster. Este tema está cada vez mais a ser falado nos eventos, porque é preciso apostar mais neste ponto. Na diabetes, e também na obesidade, não podemos focar-nos em tudo o que é negativo. Há muito a ser feito, muitos desafios! É preciso investir na individualização de cuidados, porque tratar de um idoso  com 80 anos, com comorbilidades, e a viver sozinho é diferente de um doente mais jovem, sem comorbilidades e que não está isolado. Os objetivos têm de ser obrigatoriamente individualizados, para que também possamos ser rigorosos no seu cumprimento.

“Atualmente, sabemos que se diagnosticarmos a doença numa fase precoce num obeso, e se conseguirmos perder peso, a diabetes poderá entrar em remissão”

Associada à diabetes costuma estar outro grave problema de saúde: obesidade…

Mais de 90% das pessoas com diabetes têm excesso de peso ou obesidade. A obesidade é um fator de agravamento do prognóstico das pessoas com diabetes e um dos que está na génese da diabetes. É fundamental reduzir o peso, para que se consiga controlar melhor os níveis de glicemia. Atualmente, sabemos que se diagnosticarmos a doença numa fase precoce num obeso, e se conseguirmos perder peso, a diabetes poderá entrar em remissão.

 

Relativamente às novas guidelines e terapêuticas, o que gostaria de destacar?

Há 30 anos, controlar a diabetes era sinónimo de controlo da glicemia; há 15 anos passou a falar-se da importância de se tratarem também os fatores de risco cardiovascular associados (HTA, dislipidemia, obesidade). Desde há sete anos surgiram, entretanto, fármacos que não se limitam a controlar a diabetes e os fatores de risco associados. São medicamentos que, só por si, são modificadores do prognóstico. As sociedades científicas, face a esta evolução, obviamente começaram a atualizar as suas recomendações terapêuticas. No final do ano passado, as sociedades americana  e europeia juntaram-se para rever as orientações e, já este ano, foram apresentadas as novas guidelines luso-brasileiras para tratamento de adultos com diabetes tipo 2 a fim de se promoverem novos comportamentos.

“Temos que ter mais tempo para  ver os doentes e equipas multidisciplinares”

Os fármacos são importantes, assim como a mudança de comportamentos de risco. Mas, olhando para a prática clínica, o que deve ainda melhorar para que haja a tal individualização de cuidados?

Temos que ter mais tempo para  ver os doentes e equipas multidisciplinares. Além de diferentes especialidades médicas, é essencial contar com o contributo de outros profissionais, tais como enfermeiros e nutricionistas. E, obviamente, acesso às terapêuticas mais inovadoras.

SO

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