13 Mar, 2024

“Que sejam reconhecidos às UCC os mesmos direitos que aos profissionais das USF”

Reforçar o papel das unidades de cuidados na comunidade (UCC) é o tema central do V Congresso Nacional das UCC, que vai decorrer nos dias 21 e 23 de março, em Évora. José Lima, presidente da Associação de UCC, espera que os profissionais destas unidades sejam valorizados.

Porquê o tema “Reforçar as UCC” no V Congresso?

Porque reforçar as UCC é reforçar e melhorar o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Temos de ter um serviço adaptado às necessidades da população e, para tal, temos de ter foco na promoção da saúde e na prevenção da doença, mas também na gestão e controlo da mesma. Necessitamos de transformar o SNS, através de um melhor planeamento. Articular é fácil de entender, mas difícil de colocar em prática! É necessária uma articulação entre as pessoas e as unidades funcionais, procurando uma verdadeira interligação de cuidados para que as pessoas em particular, e as comunidades em geral, possam ter acesso atempado aos melhores cuidados de saúde possíveis. Pretendemos que as UCC sejam o epicentro do valor da integração de cuidados.

 

As UCC não têm remuneração com base no desempenho. De que forma esta situação está a afetar os profissionais?

Na reunião que a AUCC fez com a DE-SNS foram alinhados aspetos prioritários, que ainda não tiveram solução, concretamente: a revisão do Despacho 10143/2009 e transição para Decreto-Lei, para consolidar o modelo organizativo e substantivo legal das UCC; a revisão da Portaria 212/2017, que consagra a atual atribuição de incentivos institucionais apenas para USF e UCSP; a construção de um modelo remuneratório transversal a todas as unidades funcionais, alavancado numa perspetiva de contratualização moderna, baseada no percurso clínico do utente e na obtenção de ganhos em saúde.

Somos a favor de uma pluralidade de análise e discussão que observe os CSP como produto de diversos atores, cujo interesse máximo é a prestação de cuidados de saúde integrados e de qualidade voltados para a inequívoca resolução das necessidades da comunidade.

Solicitamos assim que sejam reconhecidos às UCC, os mesmos direitos e oportunidades que foram reconhecidos aos profissionais das USF. Persistir nos erros do passado irá contribuir para uma maior insatisfação e saída dos profissionais maioritariamente especializados, colocando em risco a prestação de cuidados que durante anos sempre foi assegurada à população mais vulnerável: desde as grávidas, as puérperas, as crianças e jovens com necessidades de saúde especiais, comunidade escolar, as pessoas beneficiárias de rendimento social de inserção, cuidadores e pessoas com dependência física e mental, clientes com doença crónica, entre outros;

“O Serviço Público é muito importante e os profissionais nas UCC têm-no feito e merecem reconhecimento. Precisamos de acreditar que vale a pena trabalhar no SNS”

Apesar das dificuldades, que mensagem gostaria de deixar a quem trabalha em UCC e também a quem pensa vir a integrar estas unidades?

Penso que se fala em muitas dificuldades no SNS, porque este tema está na ordem do dia devido ao momento eleitoral e porque a saúde, como direito intransmissível proposta na constituição, é algo muito marcante para as pessoas. Prefiro não falar em dificuldades, que sempre existiram, mas em mudança do SNS. Já existiam UCC nas primeiras ULS! É por esta razão que há que apostar numa visão moderna de integração de cuidados, que estime o percurso clínico dos utentes e a sua necessária interligação com os serviços de saúde e também com as entidades comunitárias. As ULS no país querem fazer isto!

É neste espaço que as UCC, enquanto equipas multidisciplinares totalmente implementadas na comunidade que servem, são fundamentais na prestação de cuidados de saúde e apoio psicológico e social, de âmbito domiciliário e comunitário, especialmente às pessoas, famílias e grupos mais vulneráveis, em situação de maior risco, dependência física e funcional ou doença que requeira acompanhamento em proximidade.

O melhoramento dos CSP foi considerado a grande reconfiguração em Portugal, sendo reconhecida internacionalmente. O Serviço Público é muito importante e os profissionais nas UCC têm-no feito e merecem reconhecimento. Precisamos de acreditar que vale a pena trabalhar no SNS. Necessitamos de melhorar a articulação e combater os problemas de saúde das comunidades, com medidas que permitam colmatar desigualdades quer sociais, quer económicas e geográficas.

“…reduzir a imagem dos CSP à realidade das USF não corresponde à verdade, nem às necessidades encontradas no terreno”

No trabalho diário, além dessa questão da remuneração, quais os maiores desafios que enfrentam os profissionais das UCC?

A carteira de serviços das UCC é ampla e inclusiva. Acompanhamos utentes ao longo de todo o ciclo de vida e em todos os níveis de prevenção. Somos peritos no trabalho na comunidade, mas também no trabalho comunitário. Temos exemplos fabulosos de ganhos em saúde em projetos integrados. Na área da gestão da doença: a ECCI com integração de cuidados com as equipas hospitalares, as equipas dos cuidados continuados integrados e as equipas de saúde familiar; os projetos de prevenção de sobrecarga e acompanhamento do cuidador, com integração de cuidados com a segurança social; os projetos de reabilitação respiratória também com integração de cuidados de diferentes contextos; e ainda os programas de gestão de doença crónica, como é exemplo a diabetes em movimento. Na área da gestão da saúde: o acompanhamento das grávidas ao longo da gravidez, da recuperação para o parto e da massagem infantil, mais uma vez de forma integrada. Na área da intervenção comunitária, área de integração por excelência, quer com entidades de saúde, quer com entidades comunitárias, a intervenção em saúde escolar, quer na capacitação de turmas, quer no acompanhamento de crianças e jovens com NSE e todo o trabalho ao nível da rede social. Com mais recursos poderíamos apostar ainda mais na promoção!

 

Que impacto têm as ULS nas UCC?

Depois de mais de uma dezena de anos da reconfiguração dos CSP será altura de fortalecer os mesmos com a multidisciplinaridade necessária para a resolução das necessidades da população. Assim, reduzir a imagem dos CSP à realidade das USF não corresponde à verdade, nem às necessidades encontradas no terreno. Atualmente existem 279 UCC constituídas por 3291 profissionais. O índice desempenho global médio das UCC no final de 2022 foi de 75,25, superior ao das USF-A. Temos várias unidades em processo de certificação ACSA, pelo que a quantidade e qualidade dos cuidados prestados é incontestável. Garantimos diariamente, na casa dos utentes, 5776 vagas da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados. Todo este trabalho é integrado, por isso falamos em continuidade desta integração de cuidados nas ULS. As UCC estão na vanguarda dos CSP porque a intervenção especializada na comunidade é cada vez mais a grande prioridade.

MJG

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