15 Fev, 2023

Cancro pediátrico. “Os progressos no diagnóstico e tratamentos permitiram-nos atingir cerca de 80% de sobreviventes”

Hoje assinala-se o Dia Internacional da Criança com Cancro. Ao SaúdeOnline, Ana Maia Ferreira, diretora do Serviço de Pediatria do IPO Porto, fala-nos dos cancros pediátricos mais comuns e dos sobreviventes.

Quais são os principais cancros que afetam os mais novos?

São as leucemias, os linfomas e os tumores do Sistema Nervoso Central.

O número de sobreviventes é cada vez maior?

Sim, sem dúvida, sobretudo se se tiver em conta o que temos evoluído nos últimos 30 anos. O cancro é a primeira causa de morte não acidental nesta população,  mas os progressos ao nível do diagnóstico e dos tratamentos permitiram-nos atingir, atualmente, cerca de 80% de sobreviventes.

Como se faz a gestão de tudo o que está associado ao diagnóstico e tratamento na idade pediátrica?

Nos casos em que vai ser necessária uma abordagem mais longa contamos sempre com o apoio de uma equipa multidisciplinar: médicos, enfermeiros, psicóloga, nutricionista, assistente social e equipa educativa – quando o diagnóstico surge em idade escolar. Obviamente, cada caso é diferente e vamos estando atentos a possíveis ajustes na nossa intervenção. A família é parte integrante, inevitavelmente, e também tem a nossa ajuda. Por exemplo, pode ser necessário encaminhar os pais para uma consulta de Psiquiatria de Adultos por dificuldades em dormir ou porque precisam de apoio farmacológico.

“É preciso respeitar a sua vontade, não se pode transmitir mais do que aquilo que eles querem e conseguem ouvir”

E como é que se consegue comunicar um diagnóstico destes a uma criança ou a um jovem?

É sempre um momento difícil… A informação tem que ser muito concreta, porque inicialmente é essencial correr contra o tempo, realizando vários exames complementares de diagnóstico para se caraterizar a doença, para se saber qual o estadio… Explicamos sempre aos pais, às crianças (quando já entendem, obviamente) e aos jovens o que vamos fazer. Aos mais pequenos, que ainda não têm bem noção das coisas, cingimo-nos mais a explicar cada procedimento. No caso específico do adolescente, dão-se indicações concretas sobre o que vai acontecer numa primeira fase, deixando-o escolher se quer saber mais ou não. É preciso respeitar a sua vontade, não se pode transmitir mais do que aquilo que eles querem e conseguem ouvir. Cada um tem o seu tempo próprio. Não se pode esquecer que nos primeiros dias, por causa do choque, muitas informações vão-se perder e nesse caso ter-se-á que repetir.

“Pode haver sequelas visíveis, como amputações, mas também têm maior probabilidade de uma nova neoplasia, por causa da quimioterapia, e de problemas cardíacos”

Relativamente aos sobreviventes, quais são as sequelas e complicações mais comuns?

Vai depender do tratamento. Obviamente, psicologicamente existe sempre o impacto de que se teve uma doença oncológica. Mesmo quando são bebés, vão acabar por saber. Pode haver sequelas visíveis, como amputações, mas também têm maior probabilidade de uma nova neoplasia, por causa da quimioterapia, e de problemas cardíacos. É preciso haver vigilância. A Oncologia Pediátrica faz o acompanhamento até 10 anos após terminar o tratamento. A partir daí, a referenciação terá por base as sequelas. Não havendo nada em particular ao fim desses 10 anos, damos todas as indicações necessárias para que o médico de família saiba quais os rastreios a realizar.

O que pensa do surgimento de grupos de sobreviventes de cancro pediátrico?

São pessoas que tiveram a doença e que vão ajudar as crianças e os jovens que estão em tratamento. Todo o apoio da sociedade civil é muito importante para os doentes e até mesmo para a Oncologia Pediátrica.

No futuro, o que espera da Oncologia Pediátrica?

Manter o trabalho que fazemos, com qualidade, e melhorar sempre que possível. Obviamente, é preciso estar também atento aos avanços que vão surgindo na Medicina Personalizada. Terapêuticas dirigidas são essenciais na sobrevivência.

SO

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