20 Jan, 2023

Entrevista. “O papel do ginecologista é desmistificar falsos conceitos acerca das terapêuticas hormonais”

“Hormonas e Saúde da Mulher” foi a temática da 199.ª Reunião da Sociedade Portuguesa de Ginecologia, que decorreu nos dias 13 e 14 de janeiro, em Vila Nova de Gaia. Margarida Martinho, secretária-geral da Sociedade, falou ao SaúdeOnline sobre os benefícios das hormonas e como é importante combater a hormonofobia.

Quais os principais benefícios das hormonas?

As hormonas são em geral imprescindíveis para o bom funcionamento dos diferentes sistemas do nosso organismo. No caso particular da mulher são fundamentais para o correto funcionamento do seu sistema reprodutivo e determinantes para o desenvolvimento dos órgãos sexuais, bem como para a função sexual e reprodutiva. A função menstrual, desde o seu início com a menarca até à sua cessação na menopausa, depende e é determinada em grande medida pelas hormonas femininas assim como os fenómenos relacionados com a fertilidade e gravidez e, finalmente, com a vivência plena da sexualidade feminina. Para além da saúde reprodutiva, outros aspetos da saúde humana e da mulher dependem da ação das hormonas em geral, mas também das hormonas femininas, nomeadamente a função cardiovascular, o metabolismo ósseo, a função cognitiva e qualidade do sono e ainda a diferenciação do sexo fetal e mesmo a identidade de género.

Em que quadros clínicos as hormonas são mais recomendadas?

A terapêutica hormonal assume particular importância no âmbito da contraceção feminina e da terapêutica hormonal na menopausa, mas também no tratamento das disfunções da ovulação das situações de insuficiência ovárica prematura e menopausa precoce. Também de doenças com influência hormonal, das quais a endometriose assume uma importância maior. Os miomas uterinos são também uma patologia em que tratamentos médicos podem ser eficazes através da modelação do funcionamento do eixo hipotálamo-hipófise-ovário.

“As razões que levam muitas mulheres a evitar usar tratamentos hormonais têm várias motivações”

 

Atualmente, fala-se de uma certa hormonofobia por parte das mulheres. O que pode contribuir para esse medo?

As razões que levam muitas mulheres a evitar usar tratamentos hormonais têm várias motivações. Para umas são as preocupações ecológicas e a noção do impacto negativo das hormonas, especialmente para contraceção, ao serem eliminadas para a natureza. Para outras mulheres a vontade de melhor conhecer o seu corpo, a sua anatomia, as suas hormonas, o ciclo menstrual fisiológico e acharem que desta forma têm mais liberdade de decidir, sentindo-se mais empoderadas em relação à sua saúde reprodutiva. Há também as que associam a ingestão de hormonas exógenas e artificiais e a manipulação hormonal do seu ciclo menstrual a efeitos nocivos na sua saúde, como que uma sobrecarga tóxica do seu corpo. Preocupações com o efeito deste uso de hormonas na sua fertilidade e no seu peso são também razões adicionais para este receio das terapêuticas hormonais. O papel do médico e do ginecologista, em particular, no respeito pela vontade da mulher, é contribuir de forma decisiva para a sua literacia neste contexto e desmistificar alguns falsos conceitos acerca das terapêuticas hormonais, sobretudo as da menopausa, assim como informar acerca dos benefícios adicionais dos contracetivos orais.

“Mais do que mitos creio que há receios em relação aos riscos da terapêutica hormonal, sobretudo em relação ao risco aumentado de cancro da mama”

 

No caso da terapêutica hormonal da menopausa, ainda há muitos mitos por causa do estudo da WHI?

Mais do que mitos creio que há receios em relação aos riscos da terapêutica hormonal, sobretudo em relação ao risco aumentado de cancro da mama e que muitas vezes se sobrepõem à perceção dos potenciais benefícios da mesma terapêutica hormonal como a diminuição dos sintomas vasomotores, vulgarmente conhecidos como “calores”, benefícios cardiovasculares, sono, bem-estar emocional e saúde em geral.

 

Nesta área, o que podemos esperar dos próximos tempos? Terapêuticas cada vez mais personalizadas?

Acredito que sim. A investigação no âmbito da terapêutica hormonal e da contraceção é intensa e tem como objetivo a procura de fármacos mais seguros, com menos impacto ambiental e, sobretudo, disponibilizar cada vez mais moléculas de hormonas naturais e formulações que permitam assegurar a sua administração em doses e associações que se aproximem mais das necessidades de cada doente em função das suas expectativas sem comprometer o princípio fundamental da segurança.

SO

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