9 Jul, 2021

“É tão bonito mostrar que as associações de doentes têm um papel importante nas tomadas de decisão”

A RD-Portugal, União de Associações de Doenças Raras de Portugal, foi criada com objetivo de haver uma unificação da informação decidida pelas duas estruturas existentes até então: a Aliança Portuguesa de Associações das Doenças Raras e Fedra – Federação das Doenças Raras de Portugal.

Opinião de Paulo Gonçalves, Presidente da União das Associações de Doenças Raras

 

História da criação da RD-Portugal

Ambas as organizações coexistiram até 2018 de costas voltadas, ano em que se procurou debater a necessidade da criação de apenas uma única estrutura que agregasse todas as associações que visam a integração das pessoas com necessidades especiais associadas à sua condição. A Aliança extinguiu-se no momento exatamente seguinte à Escritura da RD-Portugal. A FEDRA seguirá esse caminho logo que sinta satisfeitas as ambições das poucas Associadas que requerem provas demonstradas no terreno.

Em novembro de 2018 deu-se uma reunião no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), liderada pela Dr.ª Maria de Belém Roseira e pelo presidente do INSA, Dr. Fernando Almeida, constituindo uma Comissão Instaladora com objetivo de perceber como poderíamos passar a ter apenas uma organização em Portugal, para a qual se tentasse aprender o mais possível com as duas que existiam até ao momento. Essa comissão foi constituída por sete elementos, tendo estes ficado incumbidos – por unanimidade – de criar esta organização geral agregadora de conhecimentos e vontades. Um dos principais pontos que ficaram esclarecidos logo desde início foi a necessidade de clareza e transparência sobre todo o trabalho que iria ser desenvolvido a partir daí.

Todo o nosso esforço culminou no dia 29 de maio, com a escritura da RD Portugal. Não foi possível ser no dia 29 de abril, como estava inicialmente planeado tendo em conta que a DGS nos questionou a 28 de março, dando-nos apenas 48 horas para responder ao pedido, com as razões que apresentávamos para defender que as pessoas portadoras de doenças raras deveriam constar num dos grupos prioritários da fase II da vacinação anticovid-19. Este aspeto foi muito gratificante, pois o trabalho desenvolvido durante os 28 meses permitiu-nos trabalhar e, em apenas dois dias, através de uma carta com meia página coadjuvada por um documento da European Reference Networks de fevereiro de 2021, justificarmos esta questão. E isso foi das coisas mais bonitas que aconteceram nesta pandemia, que foi demonstrar que as associações de doentes tinham um papel importante na tomada de decisões.

Por este motivo, apenas no final de maio conseguimos proceder à Escritura, em que estiveram reunidas 22 associações fundadoras – neste momento já são 24 associações – tendo ficado escrito nos estatutos que as associações que já existam ou que venham a ser criadas e que venham a aderir à RD Portugal até 31 de dezembro serão consideradas associações fundadoras.

 

Objetivos da RD-Portugal

Todo o planeamento estratégico da União das Associações de Doenças Raras passa pelo simples mote de “colocar o doente no centro”, essencialmente no centro de decisões e no centro de todas as nossas motivações, pois infelizmente continuamos a aperceber-nos que se pensa muito pouco nos doentes, sendo ainda mais raras as vezes em que estes são realmente ouvidos nas tomadas de decisão.

Desta forma, o primeiro objetivo passa pela criação de um registo nacional de pessoas portadoras de doenças raras. Temos na Lei, há vários anos, a criação prevista deste registo, mas tal nunca aconteceu na prática. Assim, pretendemos que seja criada esta mesma rede de registos, de modo a contabilizar e quantificar as doenças raras existentes em território nacional para, posteriormente, ser feito um acompanhamento mais adequado de cada doente. Tendo em conta que certas doenças são tão raras que apenas existem meia dúzia de doentes a nível nacional, faz todo o sentido que estes se conheçam até pelo ponto de vista de partilha de experiências. E nisso teremos um papel preponderante.

O segundo ponto estratégico da nossa ação passa por criar um plano de comunicação e compromisso, quer a nível interno quer a nível externo. De modo interno, exatamente para poder coexistir uma comunicação mais direta e clara entre todas as Associadas e pessoas afetadas. Externamente, para poder existir uma transferência de todo esse debate de ideias para entidades exteriores.

Já numa terceira linha de atuação pretendemos criar um modelo de cooperação e colaboração com as entidades decisoras. E por estas entende-se as organizações políticas e decisoras, como é o caso do Governo, do Serviço Nacional de Saúde (SNS), de entidades privadas, da comunidade científica e até mesmo de uma maior interação com a indústria farmacêutica.

Por último, mas não menos importante, pretendemos criar um modelo de financiamento transparente, sustentado e real, onde iremos questionar, mas contribuir sobre as razões objetivas para a falta de investimento nesta área da saúde. Iremos questionar, por exemplo, porque uma parte dos custos da saúde serve para manter sistemas informáticos obsoletos, ou a dificuldade na prescrição de medicação – não ser renovada automaticamente até à consulta seguinte, bem como ter a medicação (quando aplicável) dispensada apenas em farmácias hospitalares. Há algo com que todos podem contar: uma colaboração intensa, proativa por parte dos especialistas na primeira pessoa.

Daniela Tomé

 

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