5 Nov, 2021

A consulta de planeamento familiar nos cuidados de saúde primários

Artigo de opinião de Bárbara C. Barbosa (médica interna de Medicina Geral e Familiar, USF VitaSaurium, ACeS Baixo Mondego) e Ana Sofia C. Marafona (médica interna de Medicina Geral e Familiar, USF Douro Vita, ACeS Douro Sul). São ambas membros do Membros do Grupo de Estudos da Saúde da Mulher da APMGF (Membros do Grupo de Estudos da Saúde da Mulher da APMGF)

Os cuidados de saúde primários são a “porta” de acesso dos utentes no Serviço Nacional de Saúde garantindo, assim, uma avaliação, aconselhamento e a orientação médica adaptada ao indivíduo e ao seu contexto.

Entre as ferramentas dos cuidados de proximidade surge a consulta de planeamento familiar com o objetivo de apoiar a pessoa – mulheres na idade fértil (até aos 54 anos) e homens, sem limite de idade – na vivência saudável e segura da sua sexualidade ao longo das diferentes etapas da sua vida, com o conhecimento do funcionamento do seu corpo, de sinais e sintomas que devem motivar a procura de cuidados e dos riscos associados a relações sexuais sem proteção.

Neste âmbito, o(a) médico(a) especialista em Medicina Geral e Familiar, juntamente com o(a) enfermeiro(a) de família, trabalha aspetos como a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, aconselhamento sobre contraceção – e o fornecimento gratuito do método – passando pelo rastreio oncológico e/ou pelos cuidados no pós-parto. Importa salientar que a escolha do método contracetivo é sempre uma decisão personalizada e partilhada entre a utente e o médico, por forma a garantir a adesão e o uso correto do método pretendido. Sendo que, na prática clínica, observamos que esta consulta é mais utilizada pelas mulheres o que em si constitui um desafio, pois uma grande parte da população-alvo desta consulta não recorre a este serviço.

Na vertente do planeamento familiar, propriamente dito, o trabalho desenvolvido passa pelo aconselhamento pré-concecional das pessoas que desejam iniciar o seu “projeto familiar” em aspetos diversos como o ciclo fértil, a suplementação alimentar, a avaliação do efeito da gravidez na saúde da mulher – principalmente as que têm alguma patologia de base –, o impacto da doença crónica e dos hábitos no feto ou mesmo a abordagem de alguma dificuldade do casal na conceção.

Apesar de haver uma melhoria no número de gravidezes vigiadas observa-se ainda falhas na preconceção, deixando ao acaso muitas situações adversas à gestação e perdendo-se um momento crucial para a intervenção atempada na saúde materna e fetal. Por exemplo, o início atempado da suplementação com ácido fólico na prevenção de defeitos do tubo neural, aconselhamento face a doenças familiares e defeitos congénitos com devida referenciação hospitalar se necessário, a intervenção no consumo de álcool, tabaco, drogas ou determinados medicamentos por efeitos prejudiciais no desenvolvimento do feto.

O acompanhamento da mulher e do casal desde que há manifesta vontade de engravidar é também importante na infertilidade – incapacidade de engravidar após 12 meses de relações sexuais regulares e desprotegidas se tiver menos de 35 anos, ou seis meses após os 35 anos. É, também, junto do médico de família que se inicia o estudo da mesma e se identifica e, caso se justifique, se referencia atempadamente para consulta hospitalar.

Também no caso da gravidez indesejada, o médico de família tem um papel importante não só no fornecimento de contraceção de emergência, mas também, no encaminhamento célere para a consulta de interrupção voluntária da gravidez tentando evitar as idas ao serviço de urgência e oferecendo orientação durante todo o processo.

Em suma, a consulta de planeamento familiar pretende alcançar os utentes nas suas diferentes faixas etárias, promovendo um ambiente de segurança e não discriminativo para todos os modos de vivência da sexualidade privilegiando a saúde da comunidade e do utente, com a consciencialização e educação para a saúde.

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