A Aliança da Medicina Pública e Privada
Especialista em Medicina Interna na ULSSA-Porto

A Aliança da Medicina Pública e Privada

Escrevo, com a campanha eleitoral das legislativas de 10 de Março ainda ao rubro. A saúde é um tema central porque toca a todos. A educação ou a habitação competem com ela no discurso político inflamado dos comícios, mas a saúde ganha na atenção que desperta nas pessoas. Nada é tão transversal como a noção da nossa fragilidade e a possibilidade da doença nos tirar o chão ao virar da esquina.

Os partidos que aspiram a virem a governar o país disputam entre si o lugar melhor credenciado na defesa do SNS ou daquele que mais aposta na medicina privada, como se tratassem de coisas antagónicas. Por exemplo, fazer parcerias público-privadas (PPP’s), seria igual a enterrar o SNS, ou convertê-lo a uma espécie de “caixa dos pobres”.

A Aliança Democrática e o Partido Socialista juram querer reabilitar o SNS, que ambos consideram ser uma enorme conquista do 25 de Abril, mas que está em sério risco de uma desagregação sem retorno. O Partido Socialista reitera a sua legitimidade e garantia de o conseguir, por ter sido o pai do SNS. Como governou nos últimos 8 anos, nos quais se tornou evidente este estado de carência generalizado, parece aquele progenitor que abandonou o lar e voltou agora, num rebate de consciência.

Para além do debate político e dos seus folclores habituais o que nos deve interessar é que, seja quem for que alcance o poder, tenha presente que a aliança da medicina pública e privada é hoje uma realidade e uma necessidade. A maior parte dos exames de imagem e de anatomia patológica dos grandes hospitais públicos portugueses são realizados por empresas privadas. Isto não é necessariamente mau, podendo até corresponder a uma gestão mais eficiente, embora me confunda saber que há hospitais públicos com aparelhos de tomografia e de ressonância parados, por falta de pessoal médico e técnico!

Seria muito importante definir os grandes objetivos na saúde para os Hospitais Públicos e Privados. Não faz sentido que façam tudo igual. Algumas coisas serão mais baratas no privado, que não é obrigado a manter uma estrutura tão pesada como a dos hospitais. Temos há muito o exemplo da hemodiálise, mas também os exames imagiológicos, as endoscopias e outras técnicas terapêuticas ou de diagnóstico.

Mas o SNS tem de continuar a responder aos portugueses que padecem de doença complexa, às vezes ainda sem diagnóstico, que nunca encontrarão solução num Hospital Privado, a não ser que pertençam a uma elite económica, capaz de ter um seguro milionário ou até de não precisar dele.

Por sua vez, na contratação de novos Hospitais em PPP, tem que ser acautelado o tratamento integral de toda a população da sua área de influência. Não poderão preterir os utentes que padecem de doenças com tratamento mais dispendioso. O risco tem de fazer parte do negócio, para ambos os lados!

Vale a pena ter em mente esta verdade: a aliança da saúde pública e privada, é uma realidade necessária, com missões imprescindíveis nos dois setores, que urge diferenciar, mas que não deve pôr em causa a manutenção de um SNS forte e seguro.

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