20 Set, 2023

Reforma do SNS. “Mais que eventuais riscos para prestadores, é o que pode comportar para beneficiários do SNS”

António Neves, Secretário-Geral da Federação Nacional dos Prestadores de Cuidados de Saúde (FNS), critica o facto de não se ter ouvido a FNS sobre a reforma da Saúde e de não saberem como vai ficar a sua atividade após extinção das ARS, com quem fazem contratos.

Por que razão os prestadores privados se sentem “indignados” com a reforma anunciada para o SNS?

A FNS está muito preocupada porque, até ao dia de hoje, ainda não fomos chamados a pronunciar-nos sobre o assunto. A FNS é representante da rede de prestadores privados convencionados com o SNS, que assegura mais de 90% dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica- MCDT, garantindo o acesso, a proximidade e a igualdade de tratamento nas áreas das Análises Clínicas, Radiologia e Medicina Nuclear, MFR-Fisioterapia, Diálise, Cardiologia, Gastrenterologia, etc., uma atividade fundamental para o SNS responder às necessidades das populações mais desfavorecidas, que não têm ADSE ou seguros de saúde.

 

Na vossa opinião, por que não ouviram os prestadores privados?

Só o Ministério da Saúde, a DE-SNS, e, eventualmente a ACSS, poderão responder a essa questão. O que sabemos é que a FNS vem, há meses, solicitando reuniões com estas entidades, sem qualquer resposta e ainda esta semana voltámos a insistir.

 

Face às mudanças anunciadas, nomeadamente a criação de mais ULS e a extinção de ARS, o que mais poderá afetar a vossa atividade?

As entidades convencionadas até aqui celebraram e celebram os seus contratos de convenção com as ARS, assumindo estas a responsabilidade pelo respetivo pagamento dos atos e serviços prestados, contratos esses cuja estabilidade financeira é garantida desde 1997 pelo Sistema de Pagamento a Convencionados – SPC, (Despacho n.° 6323/97, atualizado pelo Desp. n.16883-A/2011), que estabelece a forma de relacionamento financeiro do Ministério da Saúde com as entidades convencionadas que asseguram prestações de saúde aos beneficiários do SNS. Este SPC agrega três pilares: os convencionados, as ARS e as entidades financeiras, não prevendo ULS, tem sido um instrumento fundamental para a estabilidade financeira de todo o sistema convencionado e, consequentemente, da sua capacidade de assegurar a resposta às necessidades dos beneficiários do SNS.

Portanto, é fundamental que em caso de extinção das ARS e da sua substituição por outros organismos – ULS, seja prevista, e que todas estas novas entidades passem, não só a ser, obrigatoriamente, tal qual são as ARS a que sucedem, parte integrante do SPC, mas também que respeitem todos os contratos e condições em vigor, o que, até esta data, não sabemos se e como será salvaguardado.

“Todas as experiências conhecidas, cujos modelos de SNS, por dogmas ideológicos ou experimentalismos, procuraram responder, através de recursos e serviços exclusivamente públicos (…), falharam redondamente”

Na área dos MCDT tem-se assistido à internalização de vários procedimentos, nomeadamente por causa da aposta nos CRI. Como se poderá conciliar a vossa atividade, enquanto prestadores de cuidados, com esta tendência?

Reconhecendo a importância de um SNS forte, mas sustentável, como um dos grandes ganhos civilizacionais que nos trouxe a democracia, a atividade privada, aqui como em todos os setores de atividade económica, é sempre indispensável em qualquer sociedade moderna, evoluída e democrática, quer como alternativa quer como complemento, quer em apoio da atividade pública e, neste caso, do SNS.

O SNS, o setor Social e o setor Privado devem em conjunto e, articuladamente, concorrer para um Sistema de Saúde Português cada vez sólido, robusto e eficiente. A Constituição da República Portuguesa estabelece que o Estado tem que: “assegurar o acesso de todos os cidadãos à proteção na saúde.”

Por isso, compete ao Estado, aproveitando os recursos existentes, garantir a igualdade no acesso, no diagnóstico, no tratamento, com proximidade e liberdade de escolha, a todos os cidadãos, nas melhores condições e com o mais baixo custo, independentemente dos cuidados serem prestados pelo setor Público, Social ou Privado. Todas as experiências conhecidas, cujos modelos de serviços nacionais de saúde, por dogmas ideológicos ou experimentalismos, procuraram responder, através de recursos e serviços exclusivamente públicos a todas as necessidades de saúde e bem-estar das populações, falharam redondamente, em toda a linha.

 

Face a todas estas mudanças, há prestadores que estão em risco?

Sem conhecermos formalmente os exatos termos do documento em que se baseia esta propalada “Reforma do SNS”, mais que eventuais riscos para os prestadores, o que mais nos preocupa e deve preocupar todos, é o risco que isso pode comportar para os beneficiários do SNS, para quem a garantia da manutenção desta rede de proximidade e livre acesso é, verdadeiramente, indispensável.

MJG

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