NOVA Medical School estuda doenças da visão com mini-retinas
Sandra Tenreiro é investigadora principal do grupo “Degeneração e Envelhecimento", da NOVA Medical School, e fala sobre a investigação que a instituição tem desenvolvido na área das doenças da retina e visão.
Que trabalho tem sido desenvolvido no grupo “Degeneração e Envelhecimento” na área da visão?
Este grupo é recente, mas o trabalho desenvolvido tem por base uma linha de investigação de cerca de 5 anos. Estamos, atualmente, a estudar doenças da retina associadas ao envelhecimento e a alterações metabólicas, como é o caso da degenerescência macular da idade (DMI) e a retinopatia diabética, respetivamente. Na Nova Medical School existem sete grupos a trabalhar na área da visão. A diferença do nosso grupo [Degeneração e Envelhecimento] é que recorremos a um modelo diferente, com células humanas, os organoides de retina, que são mini-retinas desenvolvidas na placa de Petri, a partir de células humanas estaminais pluripotentes induzidas.
Qual a vantagem dessas mini-retinas?
Evita-se ou reduz-se a utilização de animais e são mais semelhantes ao órgão humano. Num dos projetos, o mais avançado, através das mini-retinas conseguimos otimizar condições para se reproduzir as características da fase inicial da retinopatia diabética, ou seja, a fase da neurodegeneração de células particulares da retina, assim como o processo de neuroinflamação (característica da fase inicial desta patologia). A retinopatia diabética é uma doença crónica, que se vai desenvolvendo ao longo dos anos, mas é possível detetar alterações na retina muito cedo.
A retinopatia diabética é a principal causa de cegueira na população adulta ainda ativa e um em cada 3 diabéticos com doença há mais de 5 anos, começa a apresentar alterações na retina. Mas, atualmente, apenas existem tratamentos para fases mais avançadas. O nosso objetivo é focar-nos nas fases iniciais da patologia para se tentar perceber se é possível intervir com um anti-inflamatório ou neuroprotector.
“Os resultados em laboratório levaram-nos a identificar mecanismos moleculares que podem ser alvo destas terapias, mais concretamente o NRF-2 – já há medicamentos que atuam no NRF2, mais concretamente na modulação da esclerose múltipla”
E no caso da DMI?
Em colaboração com o grupo do Prof. Miguel Seabra (“Mecanismos moleculares de doença”), temos estudado a DMI, que é uma doença altamente prevalente , que afeta 3 em cada 10 pessoas com mais de 80 anos. A DMI é três vezes mais prevalente do que todas as demências juntas (incluindo a doença de Alzheimer) , mas, infelizmente, não é muito falada ou conhecida. Tal como na retinopatia diabética, carateriza-se por ter uma progressão ao longo de anos. Não existe ainda medicação que permita evitar essa progressão. A equipa procura, com esta investigação, alternativas terapêuticas, nomeadamente recorrendo a medicamentos já disponíveis para outras doenças.
Os resultados em laboratório levaram-nos a identificar mecanismos moleculares que podem ser alvo destas terapias, mais concretamente o NRF-2 – já há medicamentos que atuam no NRF2, mais concretamente na modulação da esclerose múltipla. Estamos a acompanhar 180 doentes com DMI na fase intermédia da doença e observámos que 30% dos doentes evoluíram para a fase avança da doença em 2 anos. Agora vamos fazer um estudo num grupo equivalente de doentes e ver se conseguimos desacelerar a evolução da doença com um medicamento que não é usado para DMI, mas ainda aguardamos os pareceres éticos.
“Os doentes são parte ativa do trabalho de investigação e é importante transmitir-lhes isso, para que colaborem e percebam que o nosso objetivo é ajudá-los na sua doença”
Qual a importância do Biobanco da NOVA Medical School, o CHAIN-Biobank para estes projetos?
É muito importante. Este trabalho de investigação é como um triângulo de três vértices, já que tem de incluir investigadores biomédicos, clínicos e ortópticos e doentes. Os doentes devem ser envolvidos e alertados para o papel importante que podem ter na investigação clínica e biomédica e que permitirá descobrir novos tratamentos. Geralmente, os estudos incidem nas fases avançadas da doença, mas é importante olharmos para as fases mais precoces. E, para tal, os doentes têm um papel fundamental, nomeadamente na recolha de material orgânico.
As pessoas quando são sujeitas a intervenções cirúrgicas, quando informadas, podem dar autorização para se poder recolher tecidos que são removidos durante a cirurgia e que normalmente são descartados – faz parte do procedimento – e que não põe em causa a sua saúde. Um exemplo é o que acontece na cirurgia das cataratas ou nos transplantes de córnea. Há tecidos que são removidos. Para que integrem o biobanco, apenas precisamos da autorização. Os doentes são parte ativa do trabalho de investigação e é importante transmitir-lhes isso, para que colaborem e percebam que o nosso objetivo é ajudá-los na sua doença.
Paralelamente, a opinião dos doentes é muito importante para guiar a investigação. Por exemplo, nos estudos clínicos, para determinar se um determinado tratamento tem impacto no dia a dia do doente, mesmo que clinicamente não o tenha. Outro exemplo é na orientação dos investigadores quanto à pertinência dos estudos a realizar no laboratório.
MJG
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