15 Dez, 2022

Fausto Pinto. “Quero colocar uma OM mais ágil e mais moderna ao serviço dos médicos”

Em entrevista, o cardiologista Fausto Pinto, candidato a bastonário da Ordem dos Médicos nas eleições de janeiro, defende uma OM mais desburocratizada e propõe criar a figura de um diretor executivo, para melhorar a gestão.

Quais serão as suas principais prioridades, caso seja eleito bastonário da OM?

Tenho condições para avançar para esta candidatura dada a minha experiência, currículo, liderança de várias instituições de nível nacional e internacional. O bastonário deve ser uma personalidade com um currículo e carreira reconhecidos. Estamos numa altura em que é maior a necessidade de termos uma OM forte, com prestígio, de modo a termos uma saúde forte, num momento de grande convulsão nas estruturas e na administração da saúde.

Quantos aos pontos da candidatura, é importante dizer que a OM não é um partido político, não deve ter como objetivo servir outros objetivos senão os de contribuir para uma saúde forte em Portugal. A OM deve contribuir para encontrar soluções que permitam a implementação de um sistema de saúde que seja o mais eficaz possível.

O bastonário não é um sindicalista nem o ministro da saúde. Deve ser uma pessoa independente. Ora, eu não pertenço a nenhum partido, pelo que penso ter algum valor acrescentado nesse sentido.

As suas palavras podem ser interpretadas como uma crítica à atual liderança? Foi demasiado sindicalista?

Há algumas atitudes que podem confundir-se um pouco. Uma personalidade mais independente pode acrescentar valor. Mas não gostaria de me comparar com o que se tem passado. Não estou a correr contra ninguém.

A OM tem de ser o garante da boa prática médica em Portugal e não mais que isso. Deve contribuir para um sistema de saúde inclusivo: deve incluir o componente público, o privado e o social.

“O bastonário não é um sindicalista nem o ministro da saúde”

Deve ser procurado um equilíbrio na complementaridade entre os vários sistemas?

Quem define os sistemas de saúde são os governos. Mas a OM pode influenciar e ser um parceiro. O sistema de saúde deve ser visto como um todo e não apenas só numa parte (o SNS). Neste momento, 30 a 40% das pessoas já têm seguros privados de saúde e recorrem a instituições privadas e sociais. A OM tem de ser o garante de que as boas práticas médicas se praticam em todos os sistemas. Neste aspeto, os colégios da especialidade da OM devem ser mais proativos. Vou implementar uma maior proatividade nos colégios, que têm a responsabilidade de definir e auditar as boas práticas médicas. Isso tem falhado.

Outro ponto importante é a desburocratização e a modernização do funcionamento da OM. Por exemplo, no sistema eleitoral, são exigidas um conjunto de assinaturas manuais entregues em mão. Com a digitalização que existe hoje, esta exigência significa complicar o sistema. E eu tenho experiência em descomplicar. Quero colocar uma OM mais ágil e mais moderna ao serviço dos médicos.

É também importante uma maior interação da OM com as universidades e academias. Desde o ensino pré ao pós-graduado, quero reforçar o papel da OM na procura de sistemas de formação médica continuada. Devem ser sistemas modernos, adequados às exigências atuais. Fui responsável, quando fui diretor da Faculdade de Medicina da UL e quando estava também à frente do conselho das escolas médicas, pela criação de uma plataforma com a OM e com a ANEM. Quero reforçar essa plataforma, virada para a formação médica.

O que deve ser melhorado é o apoio das estruturas hospitalares aos médicos na área da formação. Esse apoio é reduzido. Mesmo nos hospitais privados, não há grande apoio.

Quanto à formação dos internatos, tem de haver uma maior capacidade de intervenção da OM na modulação do tipo de formação médica feita em Portugal e que tem de ser uma formação atualizada e de acordo com os padrões internacionais de formação.

“Os colégios da especialidade da OM devem ser mais proativos”

No seu manifesto de candidatura, refere-se aos anseios dos médicos internos e recém-especialistas. Que resposta é necessário dar a estes médicos?

São o futuro. Por um lado, temos de garantir a formação, ou seja, capacidade formativa dos serviços. A OM tem um papel de fazer a monitorização da formação.

Outro aspeto importante é o de dar uma perspetiva de futuro, em colaboração com os decisores políticos, encontrando soluções para os jovens especialistas, através da fixação dos médicos nas instituições. Hoje em dia há algum desânimo e alguma expectativa por parte das camadas mais jovens. A profissão médica é uma profissão de grande desgaste. Tem de haver uma retribuição por parte da sociedade adequada ao esforço exigido desde jovem. A OM deve procurar responder aos anseios normais de um jovem especialista ou interno.

Outro aspeto importante é garantir a continuidade das carreiras médicas, num processo evolutivo que permita uma expectativa em termos de crescimento na profissão.

Um outro objetivo é criar um gabinete para os jovens médicos, diretamente ligado ao bastonário, para que possamos ser a voz desta comunidade mais jovem.

Defende também que é importante aumentar a presença de médicos nos lugares de decisão na saúde?

A liderança da saúde deve ser médica. É evidente que há outros profissionais e é muito importante a multidisciplinariedade e o envolvimento de outras áreas. No entanto, a liderança tem de ser médica. É impensável que o comandante de um avião não seja um piloto. A impressão que se tem é que a área da saúde foi tomada de assalto por outras profissões. Quando o primeiro-ministro disse que os hospitais do Norte são melhor geridos que os do Sul, eu dei-lhe razão. A maior parte dos hospitais do Norte são, neste momento, liderados por médicos, enquanto no Sul não. Para se liderar um hospital, tem de se ter sensibilidade médica.

“A liderança da saúde deve ser médica”

Outras das vertentes da sua candidatura é o apoio aos médicos aposentados. Que propostas tem a este nível?

Há muitos médicos aposentados com dificuldades. Têm sido feitas algumas coisas: foi criada a casa do médico, que precisa de uma revisão.

Quero criar um gabinete junto de mim de modo a encontrarmos as soluções mais adequadas para responder às necessidades dos médicos aposentados. A OM deve criar um conjunto de mecanismos, como fundos de apoio, de modo a apoiar os médicos no final de uma vida de dedicação à comunidade.

A OM tem capacidade orçamental para dar essas respostas?

Temos de criar essa capacidade. Uma instituição como a OM, que tem um orçamento considerável, tem de ter uma gestão profissional. Pretendo criar a figura de um diretor executivo. Uma coisa é um médico ter formação em gestão (e tenho gerido várias estruturas). Contudo, é importante ter a seu lado um gestor que possa complementar a gestão.

Outro ponto é o da modernização, com o aumento do recurso ao digital, tornando mais funcional o acesso dos médicos à OM.

Muito importante também é o reforço da comissão disciplinar. Sei que há algumas carências, em termos de apoio. É preciso garantir que a justiça interna é feita de forma célere e adequada e para isso têm de ser garantidos os apoios: os pagamentos [aos médicos] são importantes mas têm de ser também criados outros mecanismos de compensação.

SO

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