Fausto Amaro. “Todo o suicídio é uma morte evitável”
Fausto Amaro é presidente da Sociedade Portuguesa de Suicidologia (SPS). Em entrevista, à margem do Simpósio da SPS, que decorre entre 13 e 15 de abril, no Porto, alerta para a importância do trabalho conjunto entre diferentes setores numa causa de morte prevenível.
Qual é o panorama do suicídio em Portugal?
O suicídio em termos gerais representa dez vezes mais o número de homicídios no nosso país, de acordo com os dados mais recentes. É muito preocupante! Não podemos esquecer que todos os suicídios, que tem múltiplas causas e não apenas uma, são mortes evitáveis. É preciso agir em conjunto, trabalhar todos com o mesmo objetivo. Todos é comunidade médica, científica, forças de segurança, autarquias, escolas, etc. E tendo em conta sempre a realidade local e de cada grupo. E também com a comunicação social, porque a forma como os media reportam as notícias podem contribuir para o aumento de casos.
No simpósio vai falar-se sobre o Plano Nacional de Prevenção Nacional do Suicídio. Que avaliação faz?
A SPS foi uma das entidades que colaborou no Plano que, na minha opinião, está atualizado nos seus objetivos e princípios. Contudo, é preciso que as coisas aconteçam no terreno e que sejam analisadas ao longo do tempo para se ir aperfeiçoando. Estando atento à realidade local surgem inclusive projetos que até podem não constar previamente do Plano, mas que devem ser acionados. Veja-se, por exemplo, a parceria que a SPS estabeleceu com a Infraestruturas de Portugal para se prevenir o número de suicídios nas linhas de caminhos de ferro. Cerca de 10%, acontecem precisamente nestes locais!.
“Dos 15 aos 24 anos, atualmente, a taxa de suicídio é de 3,9%, ou seja abaixo da média nacional; mas aumenta na população acima dos 85 anos que tem uma taxa de 25,9%”
Nos últimos tempos tem-se falado muito da saúde mental dos mais novos, nomeadamente dos adolescentes. Preocupa-o esta faixa etária, sobretudo num período pós-pandemia e quando se vê as urgências de Psiquiatria da Infância e Adolescência sem resposta à noite?
A média nacional de suicídios é de 9,1%/1000 habitantes, mas ao analisarmos as diferentes faixas etárias notamos um crescimento mais acentuado nos mais idosos. Dos 15 aos 24 anos, atualmente, a taxa de suicídio é de 3,9%, ou seja abaixo da média nacional; mas aumenta na população acima dos 85 anos que tem uma taxa de 25,9%! Mas, obviamente, estamos preocupados com os mais novos e a pandemia e o fecho das urgências, não abonam a favor deste grupo. Os jovens precisam de apoio e tudo o que se possa fazer nesse âmbito tem de ser feito, sobretudo na família e nas escolas. O suicídio não tem está associado a uma única causa, mas a muitas.
Todos sabemos que nesta fase da vida somos mais aventureiros, mas as redes sociais têm proporcionado situações que se tornam virais e que são preocupantes, como aconteceu com a baleia azul há uns anos. Neste caso específico, a comunicação social tem um papel fundamental para se evitar ondas de suicídios. Nos anos 80, quando o vocalista dos Nirvana se suicidou, houve mais jovens a imitá-lo nos países em que os media trataram este assunto de forma sensacionalista. Os jornalistas não devem indicar o método utilizado e, além dessa notícia em si, deve-se contar com a colaboração da comunidade médica, mostrando que existe uma resposta para quem está em sofrimento. O suicídio nunca é a resposta a um problema. Transmitir esta mensagem é essencial.
E no caso dos idosos… São o grupo onde se registam mais casos.
E não se fala habitualmente desta realidade… As pessoas idosas também precisam de ajuda. No nosso país, e de um modo geral em todo o mundo ocidental, vê-se o envelhecimento de uma forma muito negativa, nada condizente com o que nos diz a ciência e o que é melhor para o desenvolvimento de uma sociedade. Os idosos não se sentem úteis, são descartáveis e isso tem fortes implicações na saúde mental, aumentando a probabilidade de depressão. Devemos tomar várias ações conjuntas para combater o problema do suicídio, mas simultaneamente, é preciso apostar numa filosofia de se ver o idoso e o envelhecimento de forma mais positiva. Todos somos úteis à sociedade!
“Devemos tomar várias ações conjuntas para combater o problema do suicídio, mas simultaneamente, é preciso apostar numa filosofia de se ver o idoso e o envelhecimento de forma mais positiva”
A prevenção também deve ser segmentada, tendo em conta diferentes públicos-alvo?
Sem dúvida! Por exemplo, os homens suicidam-se quatro vezes mais que as mulheres e há mais registos de suicídio no sul que no norte. Todas estas informações devem ser tidas em conta e envolver diferentes setores: comunidade científica, autarquias, escolas, etc. No caso das Forças de Segurança, por exemplo, têm um programa de prevenção próprio, de acordo com as suas necessidades. O facto de se ser GNR ou PSP não implica, por si, de forma isolada, um aumento do risco mas são profissionais que têm de ter, inevitavelmente, acesso.
LUSA
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