17 Mar, 2023

Entrevista. “Todas as perturbações do sono são preocupantes e devem ser alvo de investigação”

Susana Sousa é uma das autoras de “Sono para a Medicina Geral e Familiar”. Pneumologista no Serviço de Pneumologia do Hospital CUF Tejo e do Hospital CUF Descobertas, alerta para as doenças do sono e fala sobre o novo livro que foi escrito a pensar nos médicos de família.

“Sono para a Medicina Geral e Familiar”. O que pode encontrar o médico de família neste livro?

Nas últimas duas décadas têm-se aprofundado o estudo dos distúrbios do sono, os métodos complementares de diagnóstico têm evoluído cada vez mais e trazido nova informação sobre os mecanismos de doença e a abordagem terapêutica tem sofrido constantes alterações. Apesar disso, a formação pré-graduada continua aquém do desejado. O livro “Sono para a Medicina Geral e Familiar”  reúne a melhor evidência científica sobre as diferentes patologias do sono, do diagnóstico ao tratamento, organizado de uma forma prática para facilitar a leitura e escrito pelos principais peritos em Medicina do sono com reconhecido mérito nacional e internacional.

 

Ao longo da vida, como evolui o sono? A necessidade de dormir vai diminuindo?

O fator fisiológico que mais influencia as fases do sono é a idade e existe uma tendência para que o número de horas de sono recomendado reduza gradualmente à medida que envelhecemos (entre as 14-17 horas no primeiro mês de vida para as 7-8 horas a partir dos 60 anos). A própria estrutura do sono, para além do número de horas, sofre uma modificação ao longo da vida, com diminuição da eficiência do sono e aumento da probabilidade de determinadas doenças.

“Um dos principais fatores de risco é a obesidade, pelo que se compreende que exista um aumento desta patologia do sono”

As perturbações do sono estão a aumentar. O que está a contribuir para essa má qualidade do sono?

Na idade adulta, a insónia e os distúrbios respiratórios são as principais doenças do sono. A Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono é uma doença que se caracteriza por interrupções na respiração durante o sono e alguns estudos mostram que pode atingir até 50% dos homens e 25% das mulheres. Um dos principais fatores de risco é a obesidade, pelo que se compreende que exista um aumento desta patologia do sono, a par da crescente epidemia de obesidade e sedentarismo. Por outro lado, o aumento dos índices de depressão e ansiedade, os maus hábitos de higiene do sono, a pressão social e familiar que pode levar a horas inferiores de sono às recomendadas podem ser um fator desencadeante para outras perturbações do sono.

 

Quais são as patologias mais preocupantes?

De uma forma geral, as patologias do sono têm impacto na qualidade de vida e podem ter impacto na sobrevida. Quando existe um sono não reparador, independentemente da perturbação do sono, pode instalar-se sonolência diurna, fadiga e cansaço, dificuldade de atenção e concentração que podem ter impacto na saúde pública por se associarem ao aumento dos acidentes de viação e acidentes de trabalho. Por outro lado, doenças como a Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono associa-se a um aumento de doenças cardiovasculares como HTA de difícil controlo, angina de peito, arritmia, enfarte, AVC ou a diabetes de difícil controlo. Algumas perturbações do movimento e do comportamento durante o sono podem também associar-se ao aumento da demência e de doenças como Síndrome de Parkinson. Todas as doenças do sono podem ter impacto na saúde, por isso, todas as perturbações do sono são preocupantes e devem ser alvo de investigação.

“… existem sintomas como dor de cabeça, despertares noturnos, alterações da memória ou concentração, ranger de dentes e desgaste dentário que as pessoas associam a outras causas”

Relativamente aos sintomas, alguns podem não ser facilmente associados, numa primeira fase, a perturbações do sono?

As perturbações do sono podem justificar o aparecimento de sintomas subjetivos, difíceis de quantificar e em que frequentemente os doentes não se apercebem da sua instalação progressiva. Por outro lado, existem doenças, nomeadamente cardiovasculares, que podem levar ao aparecimento de sintomas confundidores como a fadiga ou o cansaço. A própria sonolência é definida de forma diferente porque a perceção é diferente de doente para doente. Enquanto alguns doentes definem a sonolência como facilidade em adormecer, outros descrevem falta de energia, cansaço mental ou fadiga, por exemplo. Por outro lado, existem sintomas como dor de cabeça, despertares noturnos, alterações da memória ou concentração, ranger de dentes e desgaste dentário que as pessoas associam a outras causas, como stress ou cansaço, o que dificulta o diagnóstico.

Dever-se-ia apostar mais em campanhas de sensibilização para a necessidade de se ter um sono de qualidade nas diferentes idades?

É fundamental aumentar a informação da população sobre o sono e suas funções, essenciais a um bom funcionamento do organismo. O sono, tal como uma alimentação equilibrada e a prática de exercício físico regular é um pilar fundamental para uma vida saudável.

SO

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