Por ano, surgem 10 mil novos casos de Doença Inflamatória Intestinal

Em entrevista ao Saúde Online, a Prof. Doutora Marília Cravo, Diretora do Serviço de Gastrenterologia do Hospital Beatriz Ângelo (em Loures), refere que a incidência desta doença tem vindo a aumentar.

A que sinais as pessoas devem estar atentas?

Há duas doenças inflamatórias principais: a Doença de Crohn e a Colite Ulcerosa. Esta última envolve só o intestino grosso, sobretudo o reto. As principais queixas são diarreia, perda de sangue e ‘falsas vontades’, ou seja, as situações em que o doente tem muita urgência em ir à casa de banho mas depois surge apenas sangue. Este sangue surge também misturado com as fezes, não é só ‘por fora’ como acontece na doença hemorroidária.

Já a Doença de Crohn pode atingir todo o tubo digestivo, desde a boca até ao cólon. Os sintomas são diarreias, dores intestinais, perda de peso, falta de apetite. As perdas não são tão frequentes como na Colite Ulcerosa. Estas queixas não duram um nem dois dias, duram várias semanas. Não passam espontaneamente. Em adultos jovens, estas queixas devem requerer uma especial atenção. Muitas vezes nem as pessoas nem os médicos valorizam as queixas.

Quais são os grupos mais afetados?

Afeta principalmente os adultos jovens, entre os 20 e os 40 anos, com uma predominância do sexo masculino. Também afeta crianças e existe um pico nas pessoas depois dos 70 anos.

Estas doenças têm cura?

Não, têm tratamento. Não doenças crónicas. Infelizmente ainda não foi descoberto nenhum fármaco que impeça recidivas. No entanto, podemos evitar as formas mais graves da doença, aquelas que chegam à cirurgia. Desde o início que o século que existem os fármacos biológicos, que, com alguma probabilidade, podem mudar a história natural da doença, embora não a curem.

Portanto, o tratamento é, na maior parte dos casos, feito à base de medicação?

Sim, a cirurgia só está indicada em último recurso, para as formas mais graves da doença. Hoje, com a prescrição atempada de fármacos (tanto os imunossupressores como os biológicos) tendemos a reduzir as formas complicadas de doença.

A cirurgia traz uma perda de qualidade de vida para o doente?

Na maior parte das vezes não. Na década de 80 ou 90, os doentes de Crohn tinham de passar por múltiplas cirurgias. Claro que, ao fim de duas ou três cirurgias, a pessoa ficava com menos intestino e tinha quadros de emagrecimento que podiam resultar numa perda da qualidade de vida. Hoje, temos muito mais terapêutica médica disponível.

No entanto, a cirurgia é, muitas vezes, uma forma lícita de tratar a doença, complementando, de seguida, o tratamento, com medicação. Por exemplo, quando falamos de adultos jovens com Colite Ulcerosa grave, que vão muitas vezes à casa de banho (com perdas de sangue e anemia), podemos falar em perda de qualidade de vida. Nestes casos, a operação pode ser a melhor solução.

Conhecem-se as causas da Doença Inflamatória Intestinal?

Não mas pensa-se que surjam em indivíduos com uma suscetibilidade genética. Muitas vezes têm uma história familiar de Doença de Crohn ou Colite Ulcerosa e, por isso, há genes que podem predispor o aparecimento da doença. Quando esses genes estão alterados, vão fazer com que o sistema imunitário dessa pessoa reconheça agentes do ambiente – sobretudo a microbiota (bactérias que estão dentro do intestino e que são importantes) – como sendo um vírus. Ao reconhecer essa flora saudável, que todos temos, como um provável agente causador de diarreira, isso desencadeia uma resposta inflamatória crónica.

Há forma de prevenir o aparecimento destas doenças?

A incidência tem estado a aumentar, porque há essa componente genética que não se pode evitar. Se quisermos perceber quais são os fatores epidemiológicos que podem ser corrigidos para controlarmos a incidência, os estudos mais recentes apontam a alimentação com excesso de produtos processados como sendo o fator que pode estar associado ao aparecimento destas doenças.

Quantos casos novos surgem anualmente em Portugal?

Não existem estudos epidemiológicos em Portugal mas estima-se que sejam cerca de 10 mil casos. Deste modo, a incidência portuguesa aproxima-se da incidência da Europa do Norte.

Como é feito o diagnóstico?

Na maior parte das vezes, são necessários exames endoscópicos. Sendo uma doença que envolve, sobretudo, o cólon, o método principal é a colonoscopia com biópsia.

Tiago Caeiro

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