Drepanocitose. Uma doença rara que não afeta apenas o sangue
A drepanocitose é uma doença rara, autossómica recessiva, que pode causar lesões em diversos órgãos. Em Portugal, estima-se que haja 850 casos.

Também chamada de anemia de células falciformes, a drepanocitose é uma doença genética, rara, que afeta os glóbulos vermelhos. Em condições normais, essas células são arredondadas e têm como função o transporte do oxigénio dos pulmões para os tecidos e o dióxido de carbono destes para os pulmões.
No doente drepanocítico, “os glóbulos vermelhos apresentam uma forma de lua em quarto minguante ou de foice e, por isso, não conseguem transportar adequadamente o oxigénio; são menos deformáveis e por isso são destruídos (o que leva a anemia) e tendem a obstruir os vasos sanguíneos”, que causam crises dolorosas intensas, explica Teresa Faria, responsável pelo Núcleo Pediátrico Doença Falciforme do Hospital Fernando Fonseca – ULS Amadora-Sintra (ULSASI).
Mais comum na raça negra, também pode afetar caucasianos. “Quando apenas um dos pais a transmite, não ocorrem sintomas, embora esse gene possa ser passado para a próxima geração”, indica a especialista.
O problema, segundo a pediatra, é que a doença não se cinge ao foro hematológico. “ Esta deformação dos glóbulos vermelhos causa oclusão capilar, o que pode afetar diversos órgãos, acabando por ter repercussões a nível sistémico.”
No HFF-ULSASI têm, assim, apostado na educação das crianças e pais para saberem como lidar com esta patologia rara e crónica. “É importante conhecerem a doença para saberem quando procurar ajuda antecipada. Por exemplo, ensinamos os pais a detetar o aumento do baço, uma das consequências grave, para que se dirijam o quanto antes à urgência.”
Também são aconselhados a vacinar os filhos, porque são doentes imunodeprimidos, além de terem de fazer profilaxia com antibioterapia entre os 2 meses e os 5 anos. À parte do risco infecioso, existe também maior probabilidade de se sofrer acidentes vasculares cerebrais (AVC), hipertensão pulmonar, cegueira, úlceras da pele e formação de cálculos na vesícula biliar.
O único tratamento curativo é o transplante de medula óssea no entanto esta é uma opção que sem sempre se encontra disponível. Teresa Faria diz que, para já, a hidroxiureia , é um medicamento que reduz a frequência das crises dolorosas e pode diminuir a necessidade de transfusões sanguíneas, de internamentos e de complicações.”
Apesar do impacto da doença, a médica realça que têm sido dados alguns passos importantes nos últimos anos, começando, desde logo, com o Teste do Pezinho, que já permite um diagnóstico precoce. Acrescem ainda outras medidas, mais preventivas, tais como vacinação e vigilância constante, para se detetar precoce e atempadamente as complicações. Um exemplo dessa vigilância e rastreio ,é a realização de um exame , o eco-doppler transcraniano, a partir dos 2 anos, para se quantificar o risco de AVC. “Face aos resultados deste exame, faz-se uma transfusão permuta, de modo a baixar os valores da hemoglobina S, sempre que o risco de AVC é elevado e assim diminui o risco de AVC” .Teresa Faria reforça a importância de doação de sangue visto ser um tratamento essencial para estes doentes.
Atualmente, os doentes já têm uma esperança média de vida de 60 anos, muito mais do que há 20 anos, e com qualidade de vida. Para tal, acrescenta, conta bastante a adoção de hábitos saudáveis e o saber lidar com esta condicionante. “Devem viver o momento presente e os pais não devem impedir que as crianças sonhem e se divirtam. Tem de haver um equilíbrio em tudo, para que a drepanocitose não os impeça de serem felizes”, conclui.
MJG
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