Canábis Medicinal na Neurologia é importante “também como neuromodulador”

A canábis medicinal está a ter cada vez mais impacto na saúde, havendo evidência científica que sustenta o seu uso em determinadas patologias neurológicas, como explica Diogo Reis Carneiro, neurologista na ULS Coimbra e membro do Conselho Consultivo Científico do Observatório Português de Canábis Medicinal.

Canábis Medicinal na Neurologia é importante “também como neuromodulador”

“A canábis medicinal tem um papel importante na Neurologia, inclusive como neuromodulador”, afirma Diogo Reis Carneiro. Nunca sendo um tratamento de primeira linha, a aprovação de produtos à base de canábis medicinal, por parte do Infarmed, nos últimos tempos,  tem permitido dar resposta a casos graves de determinadas patologias neurológicas, entre outras.

Em Neurologia, o tratamento à base de canábis medicinal foi aprovado para crises epiléticas refratárias das síndromes de Dravet e Lennox-Gastaut, espasticidade associada a esclerose múltipla e a lesões medulares, dor neuropática e sintomas da síndrome de Gilles de la Tourette.

“A neuromodulação do sistema químico pode ser aplicada a todo o mapa do sistema nervoso central e os canabinoides têm um papel neuromodulador, como explica o neurologista. Tal se justifica pela existência de um sistema endocabinoide no ser humano, com moléculas e receptores endocabinoides, o que tem importância em vários processos do sistema nervoso como no desenvolvimento neuronal, na plasticidade das sinapses ou na resposta a interações endógenas e exógenas”, indica.

O sistema endocanabinoide humano é, assim, constituído por recetores específicos – CB1 (que predomina no sistema nervoso central, SNC) e CB2 (que predomina no sistema imunitário), ligandos endógenos (endocanabinoides) e enzimas metabólicas. “A ativação dos recetores CB1 (recetores acoplados à proteína G) dá-se por regulação retrógrada, através dos endocanabinoides, com consequente modulação da libertação de neurotransmissores. Este mecanismo inclui a transmissão glutamatérgica, dopaminérgica e GABAérgica, interferindo em processos fisiológicos como a sinalização e controlo da dor, memória de trabalho e sua consolidação, ciclos sono-vigília e regulação do apetite.”

“São processos inerentes a diferentes patologias, inclusive nas neurodegenerativas, na fase de progressão, de inflamação. Há ainda a modulação dos centros de vómito e das náuseas, que são muito sensíveis a quimiorrecetores.”

Continuando: “As pessoas não têm todas o mesmo tipo e densidade de recetores e isto é mais uma prova da importância do sistema endocabinoide, ou seja, verificam-se polimorfismos genéticos, que mesmo sendo, no geral, silenciosos, podem estar associados, por exemplo, a algumas doenças neuropsiquiátricas e metabólicas, assim como à resposta a alguns fármacos.”

Questionado sobre a aceitação de canabinoides, atualmente, Diogo Reis Carneiro diz que ainda há “muita confusão” entre canábis medicinal e substâncias ilícitas. Contudo, já existe evidência científica, o que vai contribuir para uma maior aceitação, quer junto da população quer dos profissionais de saúde.

Recorde-se que os médicos já podem usar este tipo de medicação em espasticidade associada à esclerose múltipla ou lesões da espinal medula; náuseas e vómitos (resultantes de quimioterapia, radioterapia e terapia combinada de HIV e hepatite C); estimulação do apetite nos cuidados paliativos de doentes oncológicos ou com SIDA; dor crónica (associada a doenças oncológicas ou sistema nervoso); síndrome de Gilles de la Tourette; epilepsia e tratamento de transtornos convulsivos graves na infância, tais como as síndromes de Gravet e Lennox-Gastaut; e glaucoma resistente à terapêutica.

“Este tratamento com canabinoides tem sido muito útil para controlar sintomas em determinados casos mais difíceis e a sua aceitação será cada vez maior na prática clínica”, conclui.

MJG

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