Professora Auxiliar da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL) e Membro do Board of Directors da European Stroke Organization
Agir para combater o Acidente Vascular Cerebral
O acidente vascular cerebral (AVC) é uma doença de impacto considerável em vários domínios. É a primeira causa de morte e dependência em indivíduos com mais de 65 anos. Representa 3 a 4% dos orçamentos anuais para a saúde em alguns países. Com o crescente envelhecimento da população mundial e o aumento da incidência de fatores de risco vasculares, espera-se que a prevalência da carga relacionada com o AVC se agrave. Havendo ainda muito a melhorar para controlar a morbilidade e a mortalidade associada ao AVC, elaborou-se, em 2018, um documento a nível europeu de “Plano de Ação para o AVC na Europa 2018-2030”, em que se estabeleceram metas para o combate a essa doença. Se em 2030, em Portugal, atingirmos as metas estipuladas, teremos então dado um passo de gigante para ganhar o combate contra o AVC.
O acidente vascular cerebral (AVC) é, atualmente, a terceira causa de morte nos países desenvolvidos, a principal causa de incapacidade a longo prazo e, a segunda causa de demência. A diminuição de força muscular, a incapacidade de movimentar de forma autónoma, de comunicar ou perceber o que é dito ou ainda de coordenar os movimentos são algumas das consequências desta doença. Daí, que seja facilmente compreensível que esteja associada a custos diretos e indiretos significativos. É, efetivamente, uma doença com um grande impacto económico, constituindo os custos relacionados com esta patologia 3 a 4% dos orçamentos anuais para a saúde, em alguns países.
Em Portugal, tem uma incidência estimada em 187 por 100.000 habitantes e é a primeira causa de morte e dependência em indivíduos com mais de 65 anos. Com o crescente envelhecimento da população mundial e o aumento da incidência de fatores de risco vasculares, como hipertensão arterial, diabetes mellitus e dislipidemia, espera-se que a prevalência da carga relacionada com o AVC aumente ainda mais.
Nas últimas décadas, ocorreram em Portugal algumas vitórias no combate a esta doença nas quais se inclui: a legislação da redução do teor de sal (sódio) no pão para diminuir a pressão arterial que é um dos fatores de risco para AVC; o desenvolvimento de unidades de AVC que são espaços dedicados dentro dos hospitais para receber estes doentes, constituídos por equipas multidisciplinares com conhecimento e treino para tratar os doentes com AVC que se comprovaram ser eficazes na redução da morbilidade e mortalidade; o estabelecimento de vias verdes do AVC que permitem que os doentes com AVC sejam diretamente levados pelos serviços de emergência pré-hospitalar (112) a hospitais com capacidade de tratar estes doentes, para que sejam tratados atempadamente, uma vez que cada minuto conta se quisermos aumentar a probabilidade do doente recuperar sem sequelas, uma vez que “tempo é cérebro”.
Contudo, embora tenha havido um esforço desenvolvido, essencialmente, pelos profissionais de saúde com o apoio de administrações hospitalares para aumentar o número de tratamentos durante o AVC isquémico agudo, como trombólise, trombectomia e implementação de cuidados em unidades de AVC, estes estão disponíveis, apenas, a uma pequena parcela da população, sendo necessário diminuir as desigualdades geográficas.
Cientes de que existe ainda muito a melhorar para controlar a morbilidade e a mortalidade associada ao AVC em toda a União Europeia, a “European Stroke Organization” e a “Stroke Alliance for Europe” elaboraram em 2018 um documento, “Plano de Ação para o AVC na Europa 2018-2030”, em que estabeleceram metas em sete domínios que devem ser atingidos até 2030 em todos os países europeus, para assegurar a qualidade da prestação de cuidados aos doentes com AVC. Estas metas devem ser atingidas nos domínios de: 1) prevenção primária, 2) organização de serviços, 3) tratamento do AVC agudo, 4) prevenção secundária, 5) reabilitação, 6) avaliação de qualidade e desfechos, 7) vida após-AVC.
Em Portugal, a Diretora-Geral da Saúde assinou, em agosto de 2021, este documento e assumiu assim um compromisso para com este projeto. É necessário, agora, que medidas sejam efetivamente adotadas e que sejam desenvolvidos esforços para cumprir o compromisso que foi estabelecido.
Entre as metas a atingir até 2030 encontram-se: a redução do número absoluto de AVC na Europa em 10%, o tratamento de pelo menos 90% dos doentes em unidades de AVC, o desenvolvimento de planos nacionais para o AVC com monitorização da qualidade dos cuidados prestados e que tenham em conta o acompanhamento de toda a cadeia de cuidados, desde a prevenção primária até à vida pós-AVC, e a implementação de estratégias nacionais de intervenções de saúde pública que visem promover e facilitar estilos de vida saudáveis para reduzir fatores ambientes, socioeconómicos e educacionais que estejam associados a aumento do risco de AVC.
Temos 5 anos para contribuir para o cumprimento das metas que foram assinadas. Se em 2030, em Portugal, atingirmos as metas do plano de ação do AVC, teremos impulsionado uma mudança nas políticas de saúde, aumentando a prioridade da investigação sobre o AVC, melhorando a abordagem ao doente com AVC e os cuidados focados no doente. Teremos, então, dado um passo de gigante para ganhar o combate contra o AVC.