“A Medicina de Precisão é cada vez mais uma realidade generalizada no tratamento do cancro”
O tratamento do cancro da mama tem evoluído de forma significativa, com destaque para terapias mais personalizadas e menos invasivas. Em 2024, os avanços incluem novas abordagens na estratificação do risco, a afirmação da Medicina de Precisão e o papel crescente da Inteligência Artificial no diagnóstico. Ana Magalhães Ferreira, coordenadora de Oncologia da Clínica de Mama, fala do Breast Cancer Weekend - O Melhor do Tratamento do Cancro da Mama de 2024, assim como das principais conquistas e desafios e do futuro no combate ao cancro da mama.

Quais foram os maiores avanços no tratamento do cancro da mama em 2024?
Em 2024, destacam-se avanços no tratamento do cancro da mama metastático, com reforço dos dados de eficácia com os ADCs, este ano sobretudo com dados de TDXd (trastuzumab-deruxetano) em doentes HER2-low ou HER2-ultralow, HR-positivo, com os resultados atualizados do estudo DESTINY-Breast06, a reforçar os dados de eficácia já conhecidos desta classe. Houve ainda uma novidade com os já reconhecidos inibidores das ciclinas, com o estudo PATINA, a relançar o palbociclib em combinação com a terapêutica endócrina e anti-HER2 na doença HR-positivo e HER2-positivo. Referir ainda os dados cada vez mais consistentes para uma adequação de tratamento individualizado e de acordo com uma classificação cada vez mais consistente de risco. Tratamentos mais agressivos na doença precoce de alto risco, com o uso de abemaciclib e ribociclib e imunoterapia na doença RH+ e triplo negativo respetivamente e em tratamentos adjuvantes menos agressivos na doença de baixo risco, com a omissão de radioterapia e de cirurgias menos agressivas, nomeadamente na abordagem da axila.
Os avanços são significativos a cada ano?
Embora os avanços ocorram regularmente, nem sempre são tão marcantes ano para ano. No entanto, em 2024, houve factos importantes, especialmente no que diz respeito ao tratamento personalizado, como o uso de tratamentos cada vez mais individualizados, com a estratificação de risco e com o uso de biomarcadores definidores de resposta terapêutica.
Qual o papel das tecnologias emergentes, como a Inteligência Artificial ou Medicina de Precisão no diagnóstico e no tratamento do cancro da mama?
A inteligência artificial (IA) tem um papel crescente sobretudo no diagnóstico, nomeadamente imagiologia e anatomia-patológica. A Medicina Precisão permite tratamentos mais eficazes, adaptados ao perfil genético de cada tumor e em diferentes fases de tratamento.
Qual a sua opinião sobre as terapêuticas personalizadas para o cancro da mama? Já são uma realidade generalizada?
A Medicina de Precisão é cada vez mais uma realidade generalizada no tratamento do cancro, até mesmo na definição de linhas de orientação de tratamento. Na prática diária ainda se encontra restrita a centros especializados, mas de acesso a estes por outros centros para discussão dos seus doentes, assim que diria que sim.
No geral, o diagnóstico é feito de forma precoce ou ainda aparecem muitas pessoas em fase avançada da doença?
O diagnóstico precoce melhorou com o aumento da adesão aos programas de rastreio, mas ainda existe uma percentagem de doentes diagnosticadas em estadios avançados, principalmente em áreas com acesso limitado a cuidados médicos e rastreio – sobretudo migrantes e em doentes com doença de biologia mais agressiva.
O que se pode fazer para melhorar esta situação?
É importante ampliar a cobertura dos programas de rastreio, especialmente em mulheres mais jovens ou com história familiar de cancro de mama e sensibilizar a população e profissionais de saúde para esta temática, nomeadamente para o crescimento deste a doentes cada vez mais jovens. Além disso seria importante disponibilizar de uma forma mais fácil o acesso a tecnologias mais avançadas, nomeadamente a mamografia digital e a ressonância magnética.
Que novos desafios podem surgir no que respeita aos programas de rastreio de cancro da mama, tendo também em conta que vão ser alargados a mulheres a partir dos 45 anos?
O alargamento do rastreio pode trazer desafios como o aumento de falsos positivos, que podem gerar ansiedade, procedimentos invasivos desnecessários e sobrecarga do sistema de saúde com exames adicionais. Além disso, a diversidade genética e a densidade mamária das mulheres podem tornar a mamografia menos eficaz em algumas faixas etárias, o que exigirá um rastreio personalizado.
Quais as suas expectativas para o evento deste ano?
As minhas expectativas para este evento é que seja possível revisitar todos os grandes temas em cancro da mama em 2024. Enfâse para a abordagem individualizada, com recurso a biomarcadores que permitam opções terapêuticas mais adequadas com foco em eficácia e segurança. Esperamos ainda uma discussão ampla sobre os desafios do rastreio ampliado, bem como ainda sobre os novos modelos de gestão em saúde e equidade de acesso a cuidados de saúde – tema emergente na sociedade portuguesa.
Quais os próximos passos a dar para a melhoria do tratamento e da qualidade de vida das doentes com cancro da mama?
Os próximos passos devem incluir a expansão do uso de terapias personalizadas – com a pesquisa de biomarcadores adequados para uma decisão cada vez mais segura em tratamentos mais eficazes e mais seguros, a integração de novas tecnologias no diagnóstico e promoção da educação, rastreio e diagnóstico precoce.
Sílvia Malheiro
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