“A integração da IA na Coloproctologia apresenta tanto oportunidades revolucionárias quanto desafios significativos”
Inovação é a temática central deste congresso. Manuel Limbert, presidente da iniciativa, fala um pouco da mesma, do programa científico e objetivos, dando o seu parecer sobre inteligência artificial, robótica e outras novas tecnologias e abordagens que estão, atualmente, a transformar a Coloproctologia, mas que também apresentam desafios.
O tema condutor deste congresso é a inovação, com um foco especial na integração da inteligência artificial em Coloproctologia. Que desafios antevê para a adoção desta tecnologia na prática clínica e como pode ela transformar o diagnóstico e o tratamento das doenças do cólon, reto e ânus?
A integração da inteligência artificial (IA) na Coloproctologia apresenta tanto oportunidades revolucionárias quanto desafios significativos. Para lhe responder adequadamente a esta pergunta pedi ajuda à IA que conhece muito melhor os desafios que lhe são presentes:
Temos em primeiro lugar o problema da introdução de dados e sua validação: A eficácia da IA depende da qualidade e quantidade dos dados que são introduzidos. É crucial assegurar que os dados usados sejam amplos, diversos e representativos
Outro dos desafios é a interoperabilidade de sistemas, pois a integração de soluções de IA com os sistemas de saúde existentes pode ser complexa. Garantir que os sistemas se comuniquem adequadamente e de maneira segura é essencial.
Os problemas relacionados com a regulamentação e ética. As diretrizes regulatórias e éticas para o uso da IA na saúde ainda estão em desenvolvimento. Assegurar conformidade com regulamentos de privacidade (como a LGPD em Portugal) e ética, é uma tarefa difícil, mas essencial.
A resistência à mudança é comum em qualquer transformação tecnológica, por isso a aceitação dos profissionais de saúde das mais-valias da IA, é outro dos desafios.
A implementação dos sistemas de IA exige robustez técnica de uma infraestrutura que nem sempre está disponível nas nossas instituições de saúde, sendo por isso também um desafio.
Quanto aos potenciais de transformações no diagnóstico e tratamento, são brutais. Irei dar apenas 3 exemplos já reais em algumas práticas clínicas:
- Deteção precoce e diagnóstico: IA tem o potencial de analisar grandes volumes de dados de imagens, como colonoscopias, com alta precisão, ajudando a detetar pólipos e outros sinais de doenças colorretais precocemente.
- Planeamento de tratamento personalizado: Utilizando algoritmos de aprendizagem, a IA pode ajudar a desenvolver planos de tratamento altamente personalizados, baseados no histórico do doente e numa vasta base de dados clínicos e genómicos.
- Gestão de dados clínicos: Automatizar a entrada e análise de dados dos doentes pode melhorar a eficiência e acuidade dos registos médicos e suporte à decisão clínica.
A implementação bem-sucedida da IA na Coloproctologia pode não apenas melhorar os resultados clínicos, mas também aumentar a eficiência da prática médica. No entanto, é fundamental abordar os desafios de que já falamos para garantir que a tecnologia seja usada de maneira eficaz e ética.
Além da inteligência artificial, que outras inovações tecnológicas ou tendências emergentes estão a marcar o campo da Coloproctologia e como vão ser abordadas neste Congresso?
No Congresso iremos não só ter sessões plenárias com mesas-redondas e conferências, como os chamados cursos pré-congresso, de uma manhã, restritos a um número limitado de participantes, para desenvolvimentos mais profundo de alguns dos temas da nossa área. Assim serão debatidos temas relacionados com a robótica em cirurgias colorretais. Os robots permitem manipulações mais delicadas, visibilidade melhorada e acesso a áreas difíceis, resultando em cirurgias com menos complicações e tempos de recuperação menores. Terapias biológicas e imunomoduladoras: Novas drogas biológicas e imunomoduladores estão a ser desenvolvidos para tratar doenças inflamatórias intestinais (como a doença de Crohn e colite ulcerativa) de forma mais eficaz, com abordagens personalizadas que minimizam reações adversas. O microbioma é outro dos temas relevantes. Compreender a composição do microbioma intestinal continua a ser um campo de estudos intenso. Terapias que ajustam o microbioma, como transplantes fecais ou probióticos personalizados, estão a ser investigadas para tratar distúrbios intestinais funcionais e inflamatórios.
Na parte da tecnologia, a imagem avançada e endoscopia de alta definição, exames de realidade aumentada e tecnologias de deteção de fluorescência melhoram extraordinariamente a capacidade de detetar lesões precoces e realizar mapeamentos mais detalhados da mucosa intestinal. Também a tecnologia de ingestão de sensores: – Câmeras e sensores ingeríveis oferecem inovações não-invasivas para a visualização e monitorização do trato gastrointestinal. Estas cápsulas podem fornecer dados em tempo real sobre o ambiente interno.
Durante o congresso, além da apresentação dessas inovações, haverá discussões sobre estudos de caso recentes, ensaios clínicos, padrões emergentes para implementação, e condutas éticas na adoção destas novas tecnologias.
Qual a importância do convívio e da troca de experiências entre cirurgiões, gastrenterologistas e outros especialistas que este congresso proporciona?
A Coloproctologia e as disciplinas relacionadas, como Gastroenterologia e Cirurgia, frequentemente estão sobrepostas. O convívio entre especialistas destas diferentes áreas promove um entendimento mais integrado, possibilitando abordagens de tratamento mais eficazes e multidimensionais, bem como troca de conhecimentos e melhores práticas. Igualmente o chamado networking, permite colaborações futuras em pesquisas ou projetos de melhoria de qualidade. Estes contactos acontecem muitas vezes nestes eventos, ampliando as redes profissionais e abrindo possibilidades de novas parcerias interinstitucionais e internacionais, já que temos também participação internacional.
Há também um espaço dedicado ao papel da Enfermagem em Coloproctologia. De que forma os enfermeiros têm um papel fundamental no sucesso dos tratamentos e no acompanhamento dos doentes?
Os enfermeiros desempenham um papel fundamental no sucesso dos tratamentos e no acompanhamento dos doentes na área de Coloproctologia devido a sua contribuição no cuidado direto ao doente, educação em saúde e colaboração interdisciplinar. Neste Congresso criámos a possibilidade de assistirem a todas as sessões médicas, como de terem um espaço seu com a criação um curso pré-congresso por eles organizado. Trabalhando lado a lado com cirurgiões e gastrenterologistas, os enfermeiros ajudam a integrar diversos aspetos do cuidado ao doente, garantindo que todas as necessidades são atendidas.
Os Congressos são ótimas plataformas para os enfermeiros se atualizarem sobre novas práticas, protocolos de tratamento e avanços científicos. A participação nesses eventos é, portanto, uma componente essencial para a evolução profissional dos enfermeiros, enquanto fortalece o seu papel indispensável na equipa de saúde em prol de um atendimento de alta qualidade.
Estamos a viver uma era de rápida evolução tecnológica. Como vê o futuro da Coloproctologia nos próximos 5 a 10 anos?
O futuro da Coloproctologia nos próximos 5 a 10 anos provavelmente será moldado por vários avanços e tendências que já estão a surgir atualmente, alguns dos quais já referi e alguns são já uma realidade no presente:
- Tecnologia de imagem avançada: – O uso de tecnologias como a inteligência artificial no diagnóstico por imagem pode melhorar significativamente a precisão e a velocidade dos diagnósticos. Por exemplo, o uso de algoritmos para interpretar endoscopias e colonoscopias pode ajudar a identificar precocemente pólipos e outras anomalias.
- Cirurgia minimamente invasiva e robótica: – A cirurgia robótica e as técnicas minimamente invasivas continuarão a melhorar, oferecendo aos pacientes menos dor pós-operatória, tempos de recuperação mais rápidos e menores riscos de complicações.
- Biomecânica e prototipagem 3D: – As impressões 3D são um recurso valioso para planear cirurgias complexas e criar próteses personalizadas que melhor se ajustam às necessidades anatómicas dos doentes.
- Terapias biológicas e novos medicamentos: – Desenvolvimentos de terapias biológicas, como probióticos e prebióticos, bem como novos medicamentos biológicos para doenças como a colite ulcerosa ou a doença de Crohn, prometem melhorar o controle sintomático e a qualidade de vida dos pacientes.
- Programas melhorados de triagem e prevenção: – Maior capacidade de triagem precoce para cancro colorretal e campanhas de prevenção ajudarão na deteção e no tratamento mais precoces, o que pode melhorar significativamente os resultados para os doentes.
- Integração multidisciplinar: – O papel da equipa multidisciplinar será ainda mais reforçado, com cirurgiões, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas e psicólogos colaborando mais.
Que mensagem gostaria de deixar aos profissionais de saúde que vão participar no Congresso, especialmente aos mais jovens que estão a começar as suas carreiras em Coloproctologia?
Aos profissionais de saúde que participarão no congresso, especialmente aos mais jovens que estão a começar suas carreiras na Coloproctologia, gostaria de deixar uma mensagem de encorajamento e conselho: Mantenham a curiosidade e a sede de aprender: – A medicina está em constante evolução, e é essencial que se mantenham atualizados com os mais recentes avanços tecnológicos e descobertas científicas. Participar de congressos e formações contínuas é vital para o desenvolvimento profissional.
Abracem a inovação: – Estejam abertos às novas tecnologias e abordagens que estão a transformar a Coloproctologia, seja a integração de inteligência artificial ou os avanços em cirurgia minimamente invasiva. Têm a oportunidade de ser pioneiros em adotar e adaptar essas inovações na prática clínica.
Trabalhem em equipa com outros profissionais de saúde, tal como esta sociedade nos tem ensinado. A capacidade de colaborar eficazmente com outros especialistas melhora o cuidado ao doente e proporciona uma abordagem mais completa e integrada.
Espero que este congresso seja uma oportunidade enriquecedora para aprender, crescer e cultivar contactos com colegas que partilham a mesma paixão pela Coloproctologia. O vosso entusiasmo e dedicação são fundamentais para o futuro brilhante desta área da medicina.
Sílvia Malheiro
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