Da recordação à assombração
Especialista em Medicina Geral e Familiar

Da recordação à assombração

O final das Administrações Regionais de Saúde (ARS) em Portugal, formalizado pelo Decreto-Lei n.º 54/2024, foi anunciado como o arranque da optimização da gestão do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

A extinção das ARS tão desejada por alguns teóricos da Saúde e a transferência das suas  competências para outras entidades, como a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), a Direção Executiva do SNS entretanto parida e a Direção-Geral da Saúde, prometia a simplificação da estrutura e a melhoria da eficiência do sistema de saúde.

Esse novo Decreto-Lei n.º 54/2024, de 6 de setembro, formalizou a extinção de há muito anunciada e gerida então pelos governos de António Costa.

Era também assegurada uma gestão de maior proximidade e de integração de cuidados com o desenho do país retalhado em Unidades Locais de Saúde (ULS).

Foi anunciada ainda uma comissão, mais uma comissão nomeada pelo Despacho n.º 12785/2024, de 21 de Outubro de 2024, esta liquidatária para coordenar e dirigir este processo e lia-se no Diário da República que, a extinção das ARS implicaria a “introdução de alterações pontuais na orgânica da Direção-geral da Saúde, do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge e da Direção-Executiva do SNS”, de forma a “refletir a transferência de atribuições e competências das ARS” e, por outro lado, “reforçar as capacidades e competências de todo o sistema”.

O seu mandato previa exercício de funções até 31 de janeiro de 2025 e deve ter sido mais complexo do que imaginário e justificou uma prorrogação até 31 de Março por novo Despacho n.º 2141/2025 assinado pelos Ministros das Finanças e da Saúde…

Por outro lado no plano da integração de cuidados o que conhecemos e assistimos mostra que, a fórmula gestionária das ULS não parece ainda ter resolvido o problema  que, de alguma forma, legitimou a sua aprovação política e generalização prática.

E curiosa e dramaticamente, até se discute agora o plano da articulação entre hospitais com uma intensidade já mediatizada após sucessivos casos embaraçosos para o sistema de saúde e lamentáveis para os cidadãos atingidos.

Os Cuidados Primários mantêm as queixas e as dificuldades identificadas e não se afigura claro qualquer salto qualitativo, seja no âmbito da contratação de médicos, na atribuição de médicos de família, na referenciação de doentes ou na prevenção da doença. Ao mesmo tempo há tarefas ou competências transmitidas para este nível de Cuidados que não foram, pelo menos, adequadamente preparadas.

Enfim, em outro plano, as ARS ainda parecem vivas e entram-nos nas caixas de correio electrónico trimestralmente.

Refiro-me como todos os médicos saberão ao “Relatório trimestral do perfil individual da prescrição de medicamentos comparticipados pelo SNS”, enviado religiosamente pelos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde a partir do endereço “sim-sns@spms.min-saude.pt”

Dirigido ao Exmo(a). Senhor(a) Dr(a). Rui Cernadas, em 14/08/2025, 15:41 horas, lemos:

“O despacho n.º 13901/2012 do Senhor Secretário de Estado da Saúde publicado a 25 de outubro de 2012 no Diário da República 2.ª série, n.º 207, cria o sistema de retorno de informação aos médicos, que no âmbito da sua atividade privada, prescrevem medicamentos sujeitos a comparticipação do Serviço Nacional de Saúde. Com a criação deste sistema de retorno visa-se incentivar, através da divulgação ao Médico do seu perfil de prescrição, o uso racional e adequado da medicação que beneficia do apoio estatal, privilegiando a prescrição por denominação comum internacional e por via eletrónica.

É neste contexto que lhe enviamos o relatório em anexo com o cálculo de um conjunto de indicadores relativos às suas prescrições, bem como o documento explicativo dos mesmos indicadores. Este relatório é enviado trimestralmente a todos os profissionais que prescreveram no âmbito da sua atividade médica privada pelo menos 30 receitas no mês.

Para qualquer esclarecimento poderá contatar a Administração Regional de Saúde através do endereço eletrónico disponível na respetiva página da internet com a designação “MPPrivados“.

A algo que ocorre na memória como resultado de experiências vivenciadas, geralmente por razões afetivas, chamo recordação.

Pensei em “assombração” que, em português, refere-se a um fenómeno sobrenatural, como um fantasma ou aparição, que causa medo ou um sensação muito estranha…

Tentei afastar o frio da espinha e dei um salto à página da ARS do Norte – lê-se a indicação disponibilizada –  “Será desativada brevemente”…

*O autor escreve de acordo com o A.A.O

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