USFs de Modelo B: 4 meses depois
Médico de Família

USFs de Modelo B: 4 meses depois

A 2018 05 14  o Saudeonline publicou uma reportagem ( https://saudeonline.pt/2018/05/14/membro-da-concelhia-de-lisboa-do-psd-denuncia-pagamentos-ilegais-a-medicos/ ) referente a uma sessão da Concelhia do PSD de Lisboa, sobre a “Saúde em Lisboa” onde se referiu que acessibilidade dos utentes ao seu médico de família poderia e deveria ser de cinco dias e que isso seria possível se a lei das Unidades de Saúde Familiar fosse cumprida. Que era um escândalo que os médicos em USFs de Modelo B estivessem em muitos locais a receber por 44 horas, para além de uma série de incentivos , mas a fazer apenas 35 h totais,  quando no regime geral, os colegas, com o listas iguais, com o mesmo número de utentes, ganhavam metade e tinham que cumprir horários de 40 h,  sendo paradigmático o caso de Lisboa em que a quase totalidade dos médicos destas unidades estão com horários aprovados de 35 h totais. Horas pagas que não sendo feitas fazem falta para uma melhor acessibilidade de cada utente ao seu médico e melhor funcionamento das Unidades de Saúde Familiares.

Na sequência deste artigo do Saúde Oneline a ARSLVT abriu uma auditoria à aprovação dos horários, cujos resultados provisórios levaram ao alargamento da mesma a todos as Administração Regionais de Saúde. Contudo, passados 4 meses, ainda não se conhecem os resultados (e bastaria uma semana para se fazer uma auditoria destas em que basta pedir aos Diretores Executivos dos Agrupamentos dos Centros de Saúde (ACES) as atas ou despachos da validação dos horários).

Também só passados 4 meses, em que tudo continuou exatamente na mesma, e sob um silêncio total de todos os responsáveis, é que a Coordenação da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, entidade que superintende esta área e faz o interface entre a Política e a Administração,  se pronunciou com um documento, enviado por mail a todos o Coordenadores das USFs e Diretores Executivos. Documento que reconhece a razão da denúncia feita e no qual se explica bem explicado que uma UC- unidade contratual, representa o pagamento do valor de uma hora de trabalho. Contudo este documento não é uma exigência e nem chega sequer a ser uma orientação; é apresentado como sendo apenas uma (muito ambígua) proposta/sugestão para as USFs e Diretores Executivos, e que como tal poderá ser atendida ou não, podendo assim tudo ir continuando na mesma.

Ora é extremamente difícil de perceber como quem representa o Estado, ou seja o dinheiro e os interesses na Saúde dos cidadãos, é capaz de ser tão detalhado na definição de indicadores e metas (alguns deles claramente para além da carteira básica de serviços definida na lei) e não seja capaz de ser claro nem na definição das obrigações mínimas exigíveis nem sobre de quem é a responsabilidade da decisão sobre as cargas horárias.

Assim aqui ficam algumas questões que precisam de clarificação:

1- Os Conselhos Gerais das USFs são absolutamente autónomos na definição das cargas horárias das USFs sendo a validação pelo Diretor Executivo do ACES apenas formal, ou pelo contrário a validação de que fala a lei depende da avaliação feita pelo DE do ACES?

2- Se depende da avaliação e decisão do DE este é absolutamente independente, autónomo e totalmente responsável pela decisão ou deve esperar e atender a orientações superiores (ARS,  ACSS, CNRCSP, MS)?

3- Se autónomo no processo de decisão, esta tem que respeitar a Lei e o seus princípios ou a decisão pode ser tomada em função daquilo que livremente achar por mais conveniente?

4- na lei está o seguinte:

Artigo 22º

Prestação de trabalho

1 – A forma de prestação de trabalho dos elementos da equipa multiprofissional consta do regulamento interno da USF e é estabelecida para toda a equipa, tendo em conta o plano de ação, o período de funcionamento, a cobertura assistencial e as modalidades de regime de trabalho previstas na lei.

Atendendo ao que diz a Lei levantam-se as seguintes questões que devem ser esclarecidas:

a) Porque não integrar a questão das cargas horárias e horários no Plano e Ação e na sua contratualização?

b) Sendo atualmente as 40 h o único regime de trabalho em vigor na Carreira de Medicina Geral Familiar é possível ter-se cargas horárias inferiores a 40 h para quem tem 9 UCs de aumento de lista?

c) Em que circunstâncias são possíveis haver dias com apenas um período de consulta? (nota: há em muito lado quem tenha três tardes livres, o que não se encaixa em nenhum regime de trabalho e sobretudo deixa os utentes desprotegidos)

d) Aproposta da CNRCSP parece admitir valores de incrementos diferentes por estratos profissionais, e até por profissional. É assim?

 

5- Porque nas USFs de Modelo B o Tempo Máximo de Resposta Garantido é semelhante ao das UCSPs quando em todos os outros indicadores se esperam resultados muito superiores? Porque é que na contratualização valores de 35 % de utentes que não conseguem ser atendidos no prazo de 3 semanas são considerados como um bom resultado e tem pontuação máxima.?

6- No nr. 2 b) do artigo 19   refere-se como motivo de extinção de uma USF  o Não cumprimento, em dois anos consecutivos, dos tempos máximos de resposta legalmente definidos.

Pergunta: para este efeito o que se considera como incumprimento dos tempos máximos de resposta legalmente definidos?

O cumprimento do suposto do DL das USFs pelas USFs do Modelo B, permitirá que a acessibilidade de cada um ao seu Médico seja de apenas de 5 dias úteis. Quando isto for realidade será politicamente impossível ao governo a recusa da passagem para modelo B de todas as USFs de modelo A que demonstrem cumprir. E assim será possível generalizar um novo paradigma de acessibilidade nos Cuidados de Saúde Primários com forte impacto na Saúde dos portugueses.

Todas estas questões têm respostas muito fáceis de dar, independentemente de se poder concordar ou discordar do sentido das respostas. A não resposta e o permanecer na ambiguidade será uma decisão política. E como tal deverá ser tratada.

 

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