Imunoalergologista Membro do Grupo de Interesse Asma da SPAIC
Podemos e devemos continuar a controlar a asma
O Dia Mundial da Asma assinala-se anualmente na primeira terça-feira do mês de maio. Hoje, as notícias são dominadas pelo coronavírus e também por isso a asma não deve ficar esquecida.
Os tratamentos preventivos para o controlo da asma podem e devem ser mantidos ou otimizados. Sabemos que os corticosteróides inalados são o tratamento de 1ª linha para o controlo preventivo diário da asma, em todas as faixas etárias. Mas dúvidas surgem quando algumas fontes sugerem que os corticosteróides (sistémicos) devem ser evitados durante a epidemia Covid-19, exceto se houver uma indicação clara para o seu uso.
É importante esclarecer as pessoas com asma que devem manter os seus tratamentos preventivos, incluindo os corticosteróides. A maioria dos doentes estão tratados com corticosteróides inalados e a suspensão deste tratamento conduz frequentemente a consequências graves, com aumento da inflamação nas vias aéreas e perda do controlo da asma. Também é essencial que os corticosteriódes orais usados de forma preventiva (um tratamento que é de exceção, em doentes com asma grave) não sejam parados de forma brusca, devendo os doentes manter o acompanhamento regular pelo especialista em asma grave.
Hoje (e sempre!) é importante ter a asma bem controlada
Mais de um milhão de pessoas em Portugal têm asma, mas são cerca de 700 mil os que têm asma ativa, tendo queixas no último ano ou fazendo tratamento preventivo. Existe ainda um elevado número de pessoas com asma não controlada (quase metade dos doentes com asma em Portugal) e esta falta de controlo é um problema transversal, tanto nas pessoas com asma ligeira até às asmas moderadas ou graves.
Se os doentes suspenderem os tratamentos, estas percentagens vão aumentar perigosamente, com maior risco para todos de deslocação aos Serviços de Urgência, internamentos hospitalares e até desfechos fatais.
Infelizmente, nos últimos anos, estes indicadores não têm melhorado. A taxa de mortalidade por asma, em Portugal, é semelhante à dos países com os melhores indicadores de saúde, mas nos últimos anos registou-se um aumento, ligeiro, mas preocupante. A maioria das mortes é prevenível, podendo denotar uma falência em termos do reconhecimento da gravidade da situação e da possibilidade do seu controlo. Qualquer morte por asma é inaceitável… Abraçamos, por isso, o tema definido pelo grupo internacional GINA (Global INitiative for Asthma) para 2020: “Chega de mortes por Asma”.
As infeções respiratórias, em conjunto com os alergénios ou irritantes, podem conduzir a desfechos mais graves. Sabemos que, quer as infeções respiratórias (sobretudo víricas), quer as substâncias irritantes para as vias aéreas ou os alergénios, são importantes fatores de agudização de asma. Se estiverem presentes em simultâneo, o risco será muito maior. A melhor forma é sempre apostar na prevenção.
Por isso, são importantes outras medidas, para além do tratamento preventivo diário que controla a inflamação e reduz a probabilidade de agravamento em caso de agressão externa ao aparelho respiratório. O isolamento social apropriado, máscaras e regras de higiene, sobretudo das mãos, são essenciais para diminuir a probabilidade de contrair infeção respiratória. A vacinação, quando disponível, para vírus ou bactérias causadores de doença, é uma excelente forma de prevenção. Por isso são importantes a vacina da gripe, anualmente no Outono, e a vacinação anti-pneumocócica, que não deve ser esquecida.
Nesta fase, em que as pessoas passam mais tempo em casa e em que muitas famílias estão a usar mais desinfetantes, também é necessário lembrar a importância de arejar a casa, evitando que substâncias irritantes permaneçam no ar. E não esquecer o tabaco, que continua a ser um inimigo nº1 dos asmáticos. Por isso, evitar quer o tabagismo ativo, quer o passivo.
As medidas de evicção de alergénios de ácaros, pólenes, fungos e animais de estimação, também são relevantes e devem ser adaptadas caso a caso.
E não podemos esquecer o nariz! Cerca de 80% dos asmáticos têm também rinite, que contribui para o pior controlo da asma. O tratamento da rinite permite diminuir as agudizações de asma. É sempre importante tratar o doente como um todo e controlar em simultâneo a asma e a rinite e outras patologias que surgem frequentemente associadas na mesma pessoa, como a sinusite, a conjuntivite alérgica e a dermatite atópica.
O que é preciso fazer mais ?
É preciso reconhecer mais a asma, ter um diagnóstico precoce. Queixas de tosse, pieira, dispneia, cansaço que se repetem no tempo… pensar que pode ser asma, em todas as idades, do latente ao adulto idoso.
É preciso iniciar o tratamento preventivo desde o início das queixas. Ter asma é ter inflamação nas vias aéreas. Não podemos aceitar que nenhum asmático seja tratado só com broncodilatadores, de crise em crise… Estes fármacos dão alívio das queixas mas não resolvem a inflamação, que continua a crescer, descontrolada.
O uso repetido de broncodilatadores isolados aumenta significativamente o risco de morte por asma. É por isso que devemos associar medicamentos preventivos anti-inflamatórios e os corticosteróides inalados são o tratamento de 1ª linha em todas as idades, nas doses recomendadas (na maioria dos casos serão doses baixas), junto com as medidas preventivas não farmacológicas de controlo de exposição ambiental.
É preciso ensinar e verificar periodicamente o uso do tratamento e a técnica inalatória. Temos muito bons dispositivos para tratamentos inalados mas todos precisam de ensino da técnica e da sua verificação regular. Um bom tratamento, bem realizado, traz satisfação ao doente e aumenta a adesão a esse mesmo tratamento.
É preciso avaliar regularmente o controlo da asma e das outras doenças associadas. Ter asma totalmente controlada é não ter queixas durante o dia, durante a noite, é não ter limitações por esta doença, é não precisar de medicamentos de “SOS”. Este é o alvo ideal a atingir, sempre que possível. Usar o questionário CARAT (www.caratnetwork.org) é uma forma simples de avaliar o controlo da asma e da rinite e a necessidade de ajustar e otimizar o tratamento.
É preciso ter um bom plano de SOS. Todos os doentes com asma devem ter um plano em caso de agudização de sintomas de asma e das outras patologias associadas. Devem saber que medicamentos podem usar e de que forma, e ainda que “canais” usar para contactar a Equipa de Saúde em cada circunstância.
E tudo isto sempre trabalhando em Equipa, desde os Cuidados de Saúde Primários aos Cuidados Hospitalares e unidades diferenciadas, esclarecendo dúvidas, desmistificando a asma, minimizando riscos e ganhando confiança com o controlo da situação, centrados na pessoa com asma e no seu bem-estar.