INQUIETUDE | Linhas vermelhas continuam necessárias em fase de alívio
Médico de família

INQUIETUDE | Linhas vermelhas continuam necessárias em fase de alívio

As “linhas vermelhas” são ultrapassadas sem ninguém ver?! A pandemia covid-19 mudou tudo nas vidas de toda a gente: como desconfinar no verão e em férias? É possível adotar um modo de vida em sociedade com medidas mais seguras, compreensíveis e adequadas? Sim, de forma cautelosa e criteriosa. A vacinação está a resultar muito bem, mas ainda não terminamos essa enorme tarefa!

As “linhas vermelhas” foram definidas em março último. A ideia era dar informações criteriosas e semanais sobre a evolução da pandemia em Portugal e assim adotar medidas de desconfinamento seguras. Esta monitorização com definição de “linhas vermelhas” ajudaria a justificar a evolução das medidas de desconfinamento. Mas os mesmos indicadores deveriam servir para inverter o trajeto de desconfinamento de março, abril e maio e voltar a confinar em junho e julho e desconfinar de seguida.

Se tivéssemos uma comunicação efetiva e rápida de medidas seguras, compreensíveis, lógicas e adequadas, então seria mais fácil admitir novas atitudes e aceitar orientações ajustadas. A monitorização dos principais indicadores de evolução da pandemia seria útil se servisse para alguma coisa.

A matriz de risco tão divulgada é apenas uma parte da monitorização. Mas “os quadrados do Costa” ficaram tão conhecidos e popularizados que se admitiram como a única monitorização! Para acompanhar a evolução da pandemia foram definidas em março as “linhas vermelhas” com utilização de três indicadores principais e quatro indicadores secundários. Como indicadores principais foram muito bem definidos: a incidência cumulativa a 14 dias por 100 mil habitantes; o número de reprodução efetivo da infeção em tempo real (Rt); e número de camas ocupadas em cuidados intensivos por doentes covid-19. Os quatro indicadores secundários, mas igualmente muito importantes são: a percentagem de positivos entre as amostras testadas (positividade de testes); a percentagem de casos e contactos isolados e rastreados nas primeiras 24 horas após a notificação; a percentagem de casos confirmados notificados com atraso; e o aparecimento e propagação de variantes de propagação. De facto, não foi considerada a vacinação, mas este é um indicador positivo que tem repercussão nos outros indicadores e, portanto, de leitura indireta, mas imprescindível. O efeito da vacinação é por demais evidente!

Poder-se-á dizer que não olhamos para a evolução da vacinação de milhões de pessoas para ajudar a consolidar o desconfinamento. Mas não foi por falta de indicadores que surgiu e evoluiu a quarta vaga. A matriz de risco com a utilização dos sete indicadores parece continuar a fazer sentido e a atualização dos limiares de risco é compreensível uma vez que temos agora mais casos ligeiros por efeito da vacinação. Definir níveis em função do estado de evolução da vacinação também faz sentido. Mas o que falta em cada momento é implementar com rapidez as medidas de saúde pública efetivas, realistas e compreensíveis, de modo a controlar a evolução da pandemia quando as linhas vermelhas são atingidas e ultrapassadas.

Com a taxa de incidência a 14 dias sempre superior a 120 casos por 100 mil habituantes desde 19 de junho e desde o inico de junho a Região de Lisboa a ultrapassar esta linha vermelha!

Com o Rt superior a 1 desde 10 de maio, claramente a ultrapassar a linha vermelha!

Com semanas seguidas desde maio com o rastreio de contactos de risco duas ou três vezes superior aos 10% definidos como linha vermelha!

Com semanas seguidas desde meados de maio onde o contacto com as pessoas que testaram positivo a ocorrer em menos de 24 horas sempre a ultrapassar a linha vermelha!

Com a positividade de testes desde o inico de julho acima dos 4%, a linha vermelha!

Os sete indicadores selecionados em março e monitorizados semanalmente parecem ser suficientes e exequíveis para orientar as medidas de saúde pública mais adequadas em cada momento para controlar a evolução da pandemia. No entanto, parece ser necessário encurtar tempos de leitura dos indicadores e implementar as medidas com vigor e rapidez. Quase metade dos portugueses manifesta não compreender as medidas de confinamento em cada momento. Não é de estranhar esta reação uma vez que as medidas de confinamento e desconfinamento são adotadas com muitos dias de diferença da realidade sentida em cada momento e em cada localidade.

Os relatórios de monitoração das linhas vermelhas publicados à sexta-feira reportam-se ao domingo anterior, isto é, já com cinco dias de atraso em relação à realidade. Será que ao fim de quatro meses de “linhas vermelhas” ainda não foi afinada a máquina de informação de modo a permitir relatórios mais próximos da realidade?

As medidas de confinamento e de desconfinamento não têm sido bem compreendidas. As medidas adotadas são decisões políticas com dias de atraso em cima do atraso do relatório que as justifica. Não seria possível a leitura de indicadores ser diária e a decisão com medidas compreensíveis ser semanal?

As medidas de confinamento vão continuar a ser necessárias mesmo com os períodos de desconfinamento que se intercalam. No entanto, carecem de comunicação adequada e atempada.

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