Doença Aterosclerótica na Mulher
Cardiologista na Unidade de Cuidados Intensivos Cardíacos do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra

Doença Aterosclerótica na Mulher

A doença cardiovascular (DCV) constitui a principal causa de morte na mulher, estimando-se que 1 em cada 3 mulheres morre desta doença. A incidência de doença aterosclerótica aumenta de forma dramática na mulher de meia-idade, particularmente no período de transição para a menopausa, considerado como um tempo de risco CV acelerado. Este momento deve ser encarado como uma janela crítica para a implementação de estratégias de intervenção precoce para reduzir o risco CV.

Infelizmente, o risco de DCV na mulher não tem sido adequadamente identificado e valorizado, de acordo com as especificidades relacionadas com o sexo, género e patologias específicas da mulher. Os scores clássicos de risco CV não estão adaptados à mulher. Apesar das estimativas de risco serem menores na mulher do que no homem, na realidade, o risco na mulher é apenas adiado em 10 anos.

Assim, para além dos principais fatores de risco CV clássicos, devem ser pesquisadas todas as condições clínicas exclusivas da mulher, associadas a um aumento e, por vezes, ao início precoce de DCV. Devem ser considerados fatores hormonais como a menopausa prematura (<40 anos), terapêutica hormonal, síndrome do ovário poliquístico, obesidade, risco cardiometabólico e condições associadas à gravidez (distúrbios hipertensivos, diabetes gestacional, parto pré-termo e restrição do crescimento intrauterino). As doenças autoimunes, as terapêuticas associadas ao cancro da mama (radiação da parede torácica e cardiotoxicidade relacionada com a quimioterapia) e os fatores psicossociais contribuem também de forma determinante para o risco de DCV.

Com frequência, os sintomas de doença coronária na mulher tendem a ser atípicos, o que dificulta o diagnóstico e atrasa a instituição do tratamento, mesmo no contexto de Enfarte Agudo do Miocárdio. Desta forma, perante a suspeita de doença coronária aterosclerótica, as mulheres devem ser cuidadosamente investigadas, com recurso a técnicas de imagem funcional não-invasiva para determinação de isquemia ou avaliação anatómica com AngioTAC coronária, uma vez que a prova de esforço apresenta uma performance inferior na confirmação ou exclusão de doença.

Perante este status quo, o que fazer?

  • Mudar perceções e comportamentos: a identificação precoce dos fatores de risco específicos da mulher é fundamental para uma correta valorização do risco CV total, modificação agressiva e precoce de estilos de vida, controlo de fatores de risco CV e, se necessário, início de terapêutica farmacológica.
  • Construir um novo paradigma: a melhoria na qualidade da saúde cardiovascular da mulher exige um novo olhar que vá para além da abordagem clássica, novas mentalidades capazes de integrar todas as especificidades relacionadas com o sexo e o género e novas fontes de inspiração para tornar a proteção cardiovascular da mulher uma prioridade de Saúde Pública, rumo a um mundo mais inclusivo, onde cada mulher, em todas as fases da sua vida, possa beneficiar dos melhores cuidados de saúde preventiva e curativa.
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