Congresso de Oftalmologia. “Estou muito satisfeita com o resultado”
Rita Flores, presidente da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia (SPO), faz um balanço do 66º Congresso Português de Oftalmologia.
Que balanço faz deste Congresso?
Estou muito satisfeita com o resultado. Acho que o programa científico despertou muito interesse, com destaque para os temas particularmente dedicados a este evento, nomeadamente a Oftalmologia Pediátrica, a retina e a Oculoplástica. As pessoas revelaram um feedback muito interessante, com discussões vivas e, portanto, nesse aspeto acho que foi pleno. Os outros temas, ditos mais transversais e abrangentes, nomeadamente a investigação, a sustentabilidade e gestão, também foram importantes, ainda que não sejam ciência oftalmológica pura. Estão na ordem do dia.
No que diz respeito à investigação, conduzimos dois cursos, um com um módulo mais básico e outro com um módulo mais avançado, e tivemos a apresentação de projetos que se candidataram a bolsas de investigação. Além disso, aproveitámos o Congresso para dar a conhecer medidas e atividades que estamos a implementar, nomeadamente a apresentação de bases de dados que temos especialmente dedicadas para endoftalmite.
Apresentámos também um manual, dedicado às manifestações fundoscópicas de doenças sistémicas, que irá ser distribuído em termos físicos e que foi fruto de uma parceria entre a SPO e o Grupo de Estudos da Retina (GER-Portugal). Este manual terá uma versão digital e outra física, que irá ser distribuída em 2024. É um livro que tem aceitação e interesse para todos os Oftalmologistas, particularmente aqueles que se dedicam à retina. Também demos a conhecer um curso avançado que vamos lançar, particularmente dedicado aos internos para fazer o exame de saída ou a especialistas, mas que queiram fazer um refresh da sua área em particular. Intitula-se Curso Avançado de Oftalmologia e vai estar também disponível online com muitíssima abrangência.
Com todas as áreas dedicadas à Oftalmologia envolvemos um vasto número de aulas, com coordenadores, com apresentadores, e portanto também apresentámos este projeto que vai ter um módulo online e algumas atividades mais práticas, com perguntas e um e-book para complementar a formação dos internos finalistas que se vão apresentar para a titulação do exame de saída da especialidade. Organizámos também um concurso que lançámos às empresas para impulsionar um setor mais sustentável. Implementámos várias medidas no curso do congresso com o intuito de chamar a atenção para toda esta temática da sustentabilidade, porque produzimos muito lixo.
“Do ponto de vista da Oftalmologia esta é uma especialidade que envolve muitos atos médicos, consultas e cirurgias. É necessária muita capacidade de organização de modo a gerir de forma inteligente os recursos”
Relativamente à temática da sustentabilidade, quais foram as principais mensagens transmitidas?
Está nas nossas mãos fazer pequenas alterações ao nosso comportamento que, no somatório final, poderão efetivamente fazer a diferença. A título de exemplo, estes pequenos gestos passam por proteger a cadeira com a nossa própria bata; em cirurgias não complicadas, evitar o uso do protetor de plástico em doentes, pelo menos nos que compreendem a nossa mensagem; alguns materiais, desde que a legislação o permita, poderão ser, de forma segura, reciclados; também a própria ventilação das salas do bloco operatório, colocando a questão de até que ponto é necessário manter os sistemas de ventilação ligados 24 horas todos os dias da semana, por exemplo.
Relativamente à gestão, é de facto hoje em dia uma temática muito importante. Do ponto de vista da Oftalmologia esta é uma especialidade que envolve muitos atos médicos, consultas e cirurgias. É necessária muita capacidade de organização de modo a gerir de forma inteligente os recursos e depois, efetivamente, refletir sobre múltiplos assuntos de gestão. Nós, médicos, não podemos ser meros executores de atos médicos, também podemos refletir sobre a melhor forma de nos organizarmos e intervir na medida das nossas capacidades.
Ainda no que diz respeito à gestão, também a questão do registo nacional e eletrónico das endoftalmites é muito importante. Em Portugal, o registo epidemiológico é fraco e iniciámos a escolha de duas patologias das quais vamos fazer o registo nacional, nomeadamente as endoftalmites e o ceratocone.
Para 2024 temos planeada a inclusão de outras patologias. Vamos crescendo pouco a pouco e vamos certamente conseguir reunir massa crítica a nível nacional de grandes e pequenos centros que possam registar este tipo de patologias. Ainda assim, é um primeiro passo para nos conhecermos melhor e organizarmo-nos de forma mais eficaz. Melhorando os procedimentos e estabelecendo protocolos e critérios de referenciação, existe um sem número de ações que podem surgir na sequência de um melhor conhecimento.
A endoftalmite, felizmente, não é frequente. É de facto uma complicação muito grave, é uma infecção intraocular com o envolvimento de todas as estruturas, surgindo muitas vezes no contexto de traumatismos ou de cirurgias e de doenças graves (endoftalmites endógenas).
Depois em relação a ceratocone, é uma doença da córnea que não é rara. Muitas vezes está subdiagnosticada e tem a sua progressão normalmente na adolescência, portanto temos uma faixa etária de adultos jovens ou adolescentes e é aí que ela pode progredir e que pode ter um handicap visual muito marcado. Apesar disso, hoje em dia existem já múltiplos tratamentos com eficácia. É importanteque que esta doença seja diagnosticada e tratada. Os tratamentos podem passar por gestos simples até procedimentos cirúrgicos mais complexos e, portanto, é importante percebermos os estímulos da doença para depois sabermos os locais para referenciar os doentes que tenham formas mais graves da doença.
Quanto ao manual da retina. Porquê o surgimento deste manual?
A cada dois anos a SPO publica uma monografia. Nos anos em que não publicamos monografia, fazemos este manual em conjunto com o GER, ou seja, é também uma outra publicação que é feita envolvendo temas que digam respeito à retina, porque o GER é um grupo de Oftalmologistas dedicados à área da retina.
Há dois anos já tivemos um manual, também no âmbito desta colaboração, que foi muito aplaudido, tendo resultado até em divulgação no estrangeiro. É escrito em inglês, o que permite uma exposição muito maior. Foi muito bem aceite, não só a nível nacional como em vários países europeus. Quanto ao manual deste ano, estamos à espera para ver qual é o feedback que vamos receber, mas estamos muito empolgados, porque efetivamente é uma obra que envolve uma série de temas muito importantes, não só em termos académicos como até de informação de prática clínica do dia-a-dia.
CG