11 Mar, 2021

Doença renal afeta 10% da população. Conheça as complicações associadas à patologia

De modo a perceber quais as principais dificuldades que quem sofre com a doença renal, o SaúdeNotícias entrevistou Marta Campos, a coordenadora da Associação Portuguesa de Insuficientes Renais (APIR).

Neste momento são duas as associações em Portugal que apoiam quem sofre de doença renal, a Associação Portuguesa de Insuficientes Renais (APIR) e a Associação de Doentes Renais de Portugal (ADRP). Marta Campos esclarece qual é a fatia da população que está mais suscetível ao aparecimento desta doença, bem como as complicações que surgiram na vida destas pessoas, resultantes do surgimento da pandemia de covid-19.

 

Qual a importância de assinalar o Dia Mundial do Rim?

O Dia Mundial do Rim consiste numa campanha global, que tem como objetivo sensibilizar para a importância da saúde renal. Realiza-se sempre na segunda quinta-feira de março e materializa-se através de um conjunto de iniciativas a nível mundial, que alertam para a importância da prevenção, sensibilizam para a gestão dos principais de fatores de risco e também promovem uma gestão saudável da doença renal crónica.

O Dia Mundial do Rim é uma iniciativa conjunta da International Society of Nephrology e da International Federation of Kidney Foundations, a que a APIR se associa todos os anos.

 

Qual o número de pessoas que sofrem de doença renal?

A nível mundial estima-se que 1 em cada 3 pessoas tenha risco aumentado de desenvolver doença renal crónica devido a fatores de risco como a diabetes, a hipertensão, obesidade, etc. Se a doença renal é detetada precocemente, a medicação e as mudanças na alimentação e no estilo de vida podem prolongar a “vida” dos rins e, permitir que o indivíduo continue a sentir-se bem por mais tempo.

A doença renal crónica evolui ao longo de 5 estádios, calculando-se que 1 em cada 10 pessoas tem algum grau de doença renal crónica. O estádio mais severo ocorre quando se atinge uma função renal inferior a 10-15% do normal e, quando se torna necessário recorrer a uma técnica de substituição da função renal, como diálise (hemodiálise ou diálise peritoneal) ou transplante. Segundo dados da Sociedade Portuguesa de Nefrologia, em Portugal existem cerca de 20.000 pessoas neste estádio, das quais 12.500 em hemodiálise, cerca de 800 em diálise peritoneal e as restantes transplantadas.

De salientar que Portugal é um dos países da Europa com maior incidência de doença renal crónica. A incidência de doentes a iniciar uma terapêutica de substituição da função renal é muito elevada, com cerca de 260 novos doentes por milhão de habitantes em 2019.

 

Que outras complicações clínicas é que os problemas renais (doença crónica ou outros) podem despoletar?

A doença renal crónica pode afetar vários aspetos da saúde e do bem-estar geral da pessoa, com consequências como anemia, cansaço, doenças ósseas, cãibras, alterações do sono, náuseas, vómitos, falta de apetite, entre outras.

 

Quais os tipos de tratamentos disponíveis? Considera que estes são suficientes para as necessidades a população?

Quando os rins deixam de funcionar, é necessário recorrer a uma técnica de substituição da função renal, como a diálise ou o transplante renal. A diálise elimina os resíduos tóxicos e o excesso de líquido do sangue. Existem duas modalidades de diálise: a diálise peritoneal e a hemodiálise. A diálise pode ser feita em casa ou em uma clínica ou hospital. A diálise peritoneal é um dos tipos de tratamento que se pode efetuar em casa. A hemodiálise pode ser realizada em casa ou numa clínica ou hospital. O transplante renal envolve a colocação de um novo rim no organismo, proveniente de um dador vivo ou falecido. Para se poder ser transplantado, terá que ter uma condição de saúde relativamente estável.

 

Quais continuam a ser, já neste período de pós-pandemia, as principais queixas dos doentes renais?

A pandemia de covid-19 trouxe diversos desafios aos doentes renais e às equipas de saúde que os acompanham. Inicialmente, a nossa preocupação foi com a informação. A comunicação tornou-se ruidosa, éramos bombardeados com notícias e contrainformação. Assim, criámos um folheto explicativo com os principais conselhos para os doentes renais crónicos, que foi difundido pelas clínicas e nas redes sociais. De seguida, a preocupação foi com os doentes em hemodiálise. Numa fase em que se pedia para todos ficarmos em casa, as pessoas em hemodiálise continuavam forçadas a sair de casa três vezes por semana para os seus tratamentos, apesar de estarem identificados como grupo de risco. Assim, o nosso trabalho consistiu em trabalhar em parceria com as entidades responsáveis, no sentido da definição de estratégias de redução do risco para estas pessoas em particular, quer ao nível dos transportes para o tratamento, quer ao nível dos procedimentos associados à diálise.

Hoje em dia, com praticamente todas as pessoas em hemodiálise já vacinadas, a nossa preocupação prende-se com a vacinação dos restantes doentes renais crónicos, nomeadamente os transplantados, que continuam a ser grupo de risco, devido à toma de medicamentos imunossupressores, mas que ainda não têm fase prevista para a vacinação. Preocupa-nos ainda a quebra acentuada que se verificou ao nível do número de transplantes realizados em 2020 e o tempo que levará a recuperar este atraso, bem como toda a assistência não covid, que poderá levar a um atraso de diagnóstico, quer de doença renal crónica, quer do acompanhamento eficaz deste grupo de pacientes, nomeadamente cirurgias não urgentes, construção de acessos vasculares, entre outros.

 

Que caminho ainda há por traçar em matérias de saúde renal, em Portugal?

Portugal pode orgulhar-se de oferecer um tratamento da melhor qualidade aos doentes renais, em Portugal, independentemente da sua localização. Em algumas regiões o tratamento poderia ser de maior proximidade, devido à necessidade de deslocação.

Num momento que tanto falamos da saúde mental, o acompanhamento psicológico do doente renal crónico é um aspeto que ainda falta na abordagem multidisciplinar.

Para o futuro esperamos novas alternativas de tratamento, um tratamento cada vez mais personalizado e à medida do doente, para que seja o tratamento a adaptar-se à vida do doente e não o oposto.

Daniela Tomé
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