O Faz de Conta das Negociações dos Médicos

Medicina Interna CHUdSA – Porto

Os Médicos detestam fazer greve. Dói-lhes o prejuízo que causam aos doentes, que pode ser muito mais do que o simples transtorno causado por um comboio cancelado. A doença pode agravar-se ou o rastreio ser protelado, com consequências imprevisíveis, pela espera da observação médica. Por outro lado, ao contrário doutros trabalhadores em greve, os Médicos têm de remarcar os doentes adiados de consultas ou procedimentos, tornando as suas agendas quase ingeríveis.

Há dias, o Economista Eugénio Rosa divulgou o resultado dum seu estudo acerca da desvalorização real da remuneração anual dos Especialistas Médicos no espaço de 12 anos. Em 2010, era de 57.021 Euros, reduzindo-se 25,64% (42.401 Euros) em 2022. Para além destes resultados, que conseguem ultrapassar as perceções mais negativas, os Especialistas Médicos Portugueses são dos mais mal pagos da Europa, menos 44% dos Colegas Espanhóis e menos 71% dos Alemães.

Decorrem há cerca de 15 meses negociações entre os Sindicatos Médicos e o Ministério da Saúde. Segundo o que nos foi sendo dito, o objetivo primordial era o da recuperação da pujança do SNS, considerado com razão como a maior conquista do 25 de Abril. Como repetidamente ouvimos do Senhor Ministro da Saúde e do Diretor da Comissão Executiva do SNS, é urgente travar a saída dos Médicos mais qualificados para os Hospitais Privados. Isso far-se-ia com a valorização das Carreiras Médicas e dos salários, associado a um investimento significativo na inovação tecnológica, que é outro fator essencial para a fixação dos Médicos.

Foram precisos 14 meses para que o Ministério da Saúde entregasse uma proposta concreta aos Sindicatos. A subida salarial geral proposta era de 1,6%, sendo de 20% caso o Especialista Médico aceitasse um regime de “dedicação plena”, associado ao esquizofrénico número de 350 horas extraordinárias por ano. Suponho que Médicos ou não, todos concordarão que esta proposta é ridícula, pouco séria, e só levará a que mais Médicos abandonem o SNS.

Ouvi há dias na TV um Médico da Comissão Executiva, a dizer muito ufano, o quanto estão empenhados em fazer uma revolução digital no SNS e um investimento tecnológico muito relevante, que irá ser muito motivador para os Médicos. Ficou mais atrapalhado, quando o jornalista lhe perguntou como seria evitado o fecho contínuo de Urgências de várias Especialidades. Lá foi dizendo que a Comissão Executiva trouxe organização, sabendo-se com antecedência quem fecha e para onde o doente se deve dirigir. É poucochinho. É realmente uma pena não haver uma qualquer App, em que o doente possa confiar para substituir o seu Médico!

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