Estenose aórtica. “Os centros do SNS têm cada vez menos capacidade de resposta”
Jorge Mimoso, diretor do Serviço de Cardiologia na ULS do Algarve, alerta para o problema da estenose aórtica e para a dificuldade crescente de se dar resposta. No âmbito das X Jornadas de Cardiologia e Hipertensão do Algarve, que decorreram em novembro, o responsável apela, ainda, a que haja mais uma valência de cirurgia cardíaca e uma sala de hemodinâmica na região algarvia para se dar uma resposta local aos doentes da região.

Qual a prevalência da estenose aórtica?
A estenose aórtica é uma das doenças mais comuns das válvulas do coração. Dado que, na maioria dos casos, é devida a fibrocalcificação progressiva das sigmoideias aórticas, a sua incidência aumenta com a idade. Esta doença afeta cerca de 32 mil portugueses, a maioria com mais de 70 anos. Caso não seja diagnosticada e tratada atempadamente, o seu desfecho pode ser fatal em 50% dos doentes, dois anos após o diagnóstico.
Quem é mais afetado?
A incidência de estenose aórtica aumenta com a idade, pelo que, são as populações mais idosas, sobretudo acima dos 70 anos que são mais afetadas por esta patologia.
Existe uma grande lista de espera para tratamento no Serviço Nacional de Saúde. Porquê?
Dado o aumento da esperança de vida da população e a maior sensibilização dos profissionais de saúde para o diagnóstico e tratamento desta patologia, existem cada vez mais diagnósticos de estenose aórtica. Assim, os centros existentes nos SNS para tratamento da válvula aórtica, sejam por cirurgia cardíaca ou intervenção estrutural (TAVI), têm cada vez menos capacidade de resposta, levando a um aumento dos tempos de espera para tratamento (por vezes, superiores a 1 ano). Na prática, assistimos diariamente a internamentos por insuficiência cardíaca ou mortalidade cardiovascular em doentes em lista de espera para tratamento.
“Uma em cada 15 pessoas em Portugal tem estenose aórtica, o que significa que no Algarve devemos ter cerca de 30 mil casos de estenose aórtica, que nos próximos anos têm que ser tratados”
Como se pode melhorar esta situação?
Podemos melhorar esta situação, estabelecendo um programa nacional de tratamento da estenose aórtica, que permita aumentar o número de centros com capacidade de cirurgia cardíaca e intervenção cardíaca estrutural e aumentar a capacidade de tratamento dos centros existentes.
Tem tentado que o Algarve possa dar resposta a estes doentes. O que está a impedir de se avançar com essa resposta?
Uma em cada 15 pessoas em Portugal tem estenose aórtica, o que significa que no Algarve devemos ter cerca de 30 mil casos de estenose aórtica, que nos próximos anos têm que ser tratados. Perante estes números, é urgente criar condições no SNS para tratar estes doentes na nossa região. Assim, o Algarve precisa de abrir a valência de cirurgia cardíaca e de ter mais uma sala de hemodinâmica, que permita dar início à implantação de TAVI. Tenho explicado esta necessidade junto dos decisores, aguardando investimentos em equipamentos e recursos humanos. Espero, em 2025, conseguir vencer um conjunto de barreiras que permitam dar início a esta atividade.
Foi responsável pelas X Jornadas de Cardiologia e HTA do Algarve, onde se abordou esta temática. Que outras mensagens também marcaram o evento?
O lema das X Jornadas de Cardiologia e Hipertensão do Algarve foi a interligação de cuidados. A abordagem da doença cardiovascular deve ser multidisciplinar, com uma forte interligação entre os cuidados primários e os hospitalares, com o envolvimento de médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapêutica e outros profissionais de saúde.
Na prevenção cardiovascular foi salientada a importância do controlo da hipertensão, do benefício de novas terapêuticas para a diabetes e dislipidemia e das estratégias de desabituação tabágica na redução do risco cardiovascular. Tivemos um workshop que realçou a importância do diagnóstico e terapêutica da apneia do sono na prevenção cardiovascular. Foi destacada a importância do diagnóstico e estratégias terapêuticas nas arritmias cardíacas e o “estado da arte” dos dispositivos cardíacos eletrónicos implantáveis.
Na mesa sobre insuficiência cardíaca (IC) foi salientado o papel dos médicos de Medicina Geral e Familiar no diagnóstico de IC e de doença valvular cardíaca e foram dadas orientações sobre o diagnóstico de hipertensão pulmonar. Foi revista, numa mesa sobre imagem em Cardiologia, a importância de cada um dos exames imagiológicos no diagnóstico de diversas patologias cardíacas. Num simpósio sobre amiloidose cardíaca foram dadas indicações de como suspeitar, diagnosticar e referenciar esta patologia.
No âmbito da doença coronária foram abordadas as síndromes coronárias agudas e a importância da reabilitação cardíaca após enfarte miocárdio. Nas síndromes coronárias crónicas foi abordada a importância fundamental da terapêutica médica e em que circunstâncias se deve revascularizar. Por fim, as jornadas terminaram com uma conferência sobre “Novas abordagens invasivas da doença coronária”, na qual o Dr. Hugo Vinhas salientou a necessidade de se adequar a abordagem invasiva às comorbilidades do doente. Foram, sem dúvida, dois dias de jornadas que permitiram a melhoria da prestação de cuidados cardiovasculares na nossa região.
MJG
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