13 Abr, 2023

Entrevista. “A nossa filosofia assenta na máxima ‘Dar vida aos dias’ das crianças”

Fundadora do Kastelo, a única unidade de cuidados continuados e paliativos pediátricos em Portugal, Teresa Fraga é uma das dez finalistas do Aster Guardians Global Nursing Award 2023, que visa reconhecer o serviço comunitário prestado por enfermeiros de todo o mundo. O vencedor será conhecido em maio.

O que sente quando se consegue chegar a esta posição de ser uma das dez enfermeiras finalistas de um prémio que envolve países do mundo inteiro?

Ainda estou nas nuvens…Jamais imaginei isto. É um momento que vai trazer mais inovação e reconhecimento para a Enfermagem portuguesa, porque estou a representar os restantes colegas enfermeiros. É uma sensação inexplicável, uma alegria interior muito grande ver o nosso trabalho reconhecido.

 

Foi selecionada pelo trabalho que tem desenvolvido no Kastelo, que ajudou a fundar. Que desafios teve de enfrentar para que se tivesse a primeira, e ainda única, unidade de cuidados continuados e paliativos pediátricos portuguesa?

Sempre trabalhei em cuidados infantis (neonatais e pediátricos) e desde cedo percebi a dificuldade que existia em dar este tipo de apoio, porque não havia qualquer estrutura para tal. Recordo, em particular, o caso de um bebé de uns pais muito jovens que não tinham como tratar do filho e, juntamente com os meus colegas de equipa, criámos a associação No Meio do Nada a pensar nas crianças com doença crónica e seus familiares. O pior que pode acontecer a um pai ou mãe é ter um filho doente. Perdê-lo, pior ainda… Assim chegámos a um espaço em São Mamede de Infesta, Matosinhos, e com donativos conseguimos avançar com o Kastelo. Era uma quinta, que estava totalmente abandonada, e foi necessário fazer muitas obras. Mas conseguimos, graças a donativos e a um financiamento da União Europeia.

“Os Cuidados Paliativos não se restringem a doença terminal. Quando damos vida aos dias pode ser de facto apenas dias, mas também meses ou anos”

O que foi mais difícil?

Conseguir verbas. Chegámos a estar 10 meses parados.

 

E já vão 6 anos de atividade…

É verdade! Já passaram por aqui muitas crianças e muitos pais. A nossa filosofia assenta na máxima “Dar vida aos dias” das crianças, ou seja, que as crianças tenham as condições necessárias para terem qualidade de vida. Os Cuidados Paliativos não se restringem a doença terminal. Quando damos vida aos dias pode ser de facto apenas dias, mas também meses ou anos. O importante é serem felizes, que não percam a esperança e que consigam viver da melhor maneira apesar da doença.

 

No fundo, o que está em causa é sobretudo o cuidar?

Sim, sem dúvida. Na Enfermagem cuidamos da pessoa, o que exige conhecimento científico e prático. É essencial, por exemplo, saber comunicar com a família, que está muitas vezes deprimida, perdida. É um caminho muito difícil e o enfermeiro ajuda em todos os níveis, porque estamos 24 horas com as crianças. Elas não podem ser retiradas da família. Se os pais estiverem bem, tranquilos, mais facilmente vão transmitir esperança e calma aos filhos.

“Com sensibilidade e carinho, o enfermeiro consegue fazer a diferença na vida do outro”

O que mais tem aprendido com as crianças e as famílias?

Tenho aprendido muito, nomeadamente a valorizar a vida e a dar graças por coisas que costumamos achar insignificantes. E viver cada dia como se fosse o último, porque o amanhã poderá não existir.

 

Que mensagem gostaria de deixar aos seus colegas enfermeiros?

Tenham esperança! A Enfermagem exige muita dedicação e amor ao próximo e conseguimos de pouco fazer muito. Com sensibilidade e carinho, o enfermeiro consegue fazer a diferença na vida do outro. Gostaria também de deixar uma outra mensagem: lutemos sempre pelos nossos objetivos por mais difíceis que este possam ser. Temos que acreditar!

 SO

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