Cuidar da saúde mental transforma o envelhecimento em qualidade de vida
A pandemia de Covid-19 deixou marcas profundas, mas também trouxe para a agenda alguns temas que pareciam quase proibidos, tal como a saúde mental. Quando todos ficámos separados por uma distância mínima de dois metros, por uma máscara, ou por paredes e portas fechadas, o peso do isolamento e da falta de convívio e atividade social pareceu insuportável. Para a maioria das pessoas, transformou-se num obstáculo ultrapassado assim que foi possível voltar às rotinas, aos abraços, às ruas, às festas, aos convívios. Mas ainda há quem permaneça no silêncio.
Num país tão envelhecido como Portugal, faz todo o sentido falarmos dos idosos. Para milhares de pessoas, atingir a terceira idade não foi uma conquista ou um motivo de orgulho, mas sim um fardo, a construção de uma rotina baseada em solidão e esquecimento. A saúde física importa, sim, mas a saúde mental não pode ficar de fora das preocupações e dos alertas.
Normalmente, pensamos que envelhecer é caminhar para um estilo de vida sem horários e longe da pressão e do stress. No entanto, também é passar rapidamente de uma vida ativa para a reforma, é vivenciar cada vez mais o luto e é ter medo. Medo de perder autonomia, medo de ser um fardo e medo de se perder na solidão. E estes sentimentos não devem, de modo algum, ser ignorados.
A solidão e o isolamento social são problemas reais. A iniciativa Censos Sénior, da Guarda Nacional Republicana (GNR), sinalizou 42.873 idosos a viverem sozinhos ou isolados em Portugal, em 2024. E os próprios têm consciência do impacto deste cenário na sua saúde, com 39% dos portugueses com mais de 70 anos a acreditar que a solidão é um dos fatores que mais provoca problemas de saúde mental, de acordo com o STADA Health Report 2025. Ainda assim, e segundo o mesmo relatório, Portugal continua a ser dos países europeus onde mais cidadãos sentem que a saúde mental e a saúde física não são encaradas de forma igualitária no sistema de saúde (70%), o que é urgente mudar.
Ao contrário do que costumamos pensar, a apatia, a tristeza e a perda de interesse não são sintomas do envelhecimento. Não é normal querer estar sempre em casa, não é normal não querer sair da cama, não é normal ser feliz apenas com a companhia da televisão ou do rádio. É sofrimento e é essencial que, em sociedade, paremos de o ignorar. Este preconceito de que envelhecer é perder utilidade só aumenta as desigualdades sociais e elimina o sentido de comunidade.
Com o apoio certo, o envelhecimento pode ser uma oportunidade para concretizar sonhos, descobrir novas paixões, criar novas rotinas. Os músculos continuam a precisar de atividade e movimento e o cérebro não pode ser esquecido, porque exige estímulos. O convívio social e a participação ativa, física e cognitiva, na sociedade são o segredo para o combate ao isolamento, à solidão, ao sofrimento e a inúmeras doenças.
A responsabilidade é de todos nós. Das famílias ao governo, que tem o poder necessário para implementar as medidas essenciais. Um país que envelhece sem políticas públicas sólidas não apoia os seus idosos. É crucial o reforço das equipas de apoio domiciliário e de saúde comunitária, a valorização das pensões, o investimento em centros de dia e universidades sénior, a criação de respostas que evitem a institucionalização precoce e a promoção de programas de combate ao isolamento.
Cuidar da saúde mental transforma o envelhecimento em qualidade de vida. Precisamos de olhar para os que nos rodeiam e garantir que ninguém fica para trás, que ninguém envelhece sozinho e que cada pessoa continua a sentir-se útil, feliz e com um propósito. Apoiar os membros mais vulneráveis da sociedade é construir uma comunidade mais inclusiva, humana, sustentável e, sobretudo, saudável, física e mentalmente.
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