A diabetes continua a ser a principal causa de insuficiência renal
Dia Mundial do Rim 2021: artigo de opinião do endocrinologista e presidente da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP).

A diabetes continua a ser a principal causa de insuficiência renal

A diabetes, nos países de maior rendimento económico, destronou a hipertensão já há muitos anos. A descoberta de que a diabetes era uma das causas da insuficiência renal foi tardia, tendo surgido já depois da descoberta da insulina.

Por causas ainda desconhecidas, apenas 40% das pessoas com diabetes desenvolvem doença renal, havendo já múltiplos estudos que tentam entrar as razões pelas quais umas pessoas estão protegidas do aparecimento da doença renal e outras não, desenvolvendo uma doença renal muitas vezes precoce.

Hoje em dia, sabe-se que a diabetes continua a ser a principal causa de insuficiência renal. E, a insuficiência renal associada à diabetes, é uma das principais causas de mortalidade dos doentes renais. Isto faz com que a diabetes seja, portanto, um fator de agravamento da esperança média de vida e um amplificador do aumento de amputações.

Claramente, o aumento da esperança média de vida motiva o prolongamento dos anos que se vive com diabetes, quando esta surge em idades mais precoces. Este facto propicia a que muitas pessoas tenham de recorrer a alternativas terapêuticas de substituição renal. Terapêuticas como a diálise peritoneal em fases primárias, nomeadamente, em pessoas com a diabetes tipo 1 e, nas pessoas com diabetes tipo 2, na grande maioria das vezes, a hemodiálise.

Nos últimos anos, não há existe qualquer evidência de créscimo, no número de pessoas sujeitas à hemodiálise. Apenas no ano de 2020 houve um decréscimo na entrada de pessoas em diálise, em parte provocado pela pandemia, mas que se acredita ser mais um atraso na entrada em diálise, do que uma diminuição real dessa necessidade. Os números deste ano deverão provar que houve aqui um empurrar da entrada de pessoas em diálise para 2021, mas por enquanto ainda não temos certezas do que é que aconteceu realmente.

Há um aspeto importante na história da relação entre a diabetes e o rim, que é o facto de há cerca de 10 anos o transplante de rim das pessoas com diabetes tipo 1 e que não têm doença cardiovascular grave, se fazer simultaneamente com o transplante de pâncreas. Este duplo transplante tem melhorado grandemente o seu prognóstico de sobrevivência, bem como a sua qualidade de vida.

Há um aspeto que me parece ser fundamental no tratamento e acompanhamento dos doentes, que é a multidisciplinariedade de especialidades necessária a esta área. A relação entre os profissionais de saúde que tratam a diabetes e os nefrologistas deve ser mais próxima, devem estar mais integrados para que este trabalho possa ser claramente relevante, tal como a perceção que hoje se tem sobre novas terapêuticas do tratamento da diabetes pode ser importante também para os nefrologistas.

Do ponto de vista endocrinologistas, dos diabetologistas e dos médicos de família, a grande preocupação é a identificação e o combate dos fatores de risco, nomeadamente, a hipertensão e a dislipidemia, do tabaco, para poder haver uma atuação precoce e diminuição do risco de doença renal. Em segundo lugar, deve ser feita uma intervenção diagnóstica precoce, que possa levar uma intervenção mais rígida, mais eficaz e mais decidida nesses mesmos fatores de risco, como a tensão arterial – que é aquilo que tem mudado ligeiramente a história natural desta doença. Mas obviamente que, ainda que com bastante evolução científica, há ainda um desconhecimento dos fatores intrínsecos da doença renal e da sua relação com a diabetes. Se conseguirmos prolongar o período pré-insuficiência renal, claro que melhoramos a esperança de vida e o prognóstico desta situação.

Desde que fui nomeado diretor do Programa Nacional para a Diabetes (2012), que está previsto um despacho do Ministério da Saúde, no sentido de serem criadas unidades integradas de tratamento à diabetes com especialistas de Cardiologia, quer de Nefrologia, especificamente dedicados à diabetes, com uma visão muito mais integrada do que aquela que hoje é possível nos hospitais, sejam eles públicos ou privados.

A divisão que hoje existe a nível hospitalar, entre departamentos de especialidades não virá fazer sentido na evolução do séc. XXI, e vamos ter cada vez mais departamentos por doença e, claramente, o departamento da diabetes deverá integrar – até como exemplo daquilo que já se faz há muitos anos na APDP – em que o trabalho integrado dos especialistas, no tratamento e acompanhamento das pessoas com diabetes, é uma mais-valia inquestionável.

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