INQUIETUDE | Vacinar vacinar vacinar… e depressa, para resolvermos a pandemia e recomeçarmos a viver normalmente
Médico de família

INQUIETUDE | Vacinar vacinar vacinar… e depressa, para resolvermos a pandemia e recomeçarmos a viver normalmente

A vida mudou, toda a gente sabe! A pandemia COVID-19 alterou tudo, como numa guerra. Estamos em plena guerra! Desconfinar onde for possível? Sim, mas muito cautelosamente. A vacinação está a resultar muito bem, mas ainda estamos a meio do processo. As novas variantes do vírus e a evolução na região de Lisboa continuam a ser uma preocupação. A aproximação das férias é um perigo! Vacinar, vacinar, vacinar? Sim muito rapidamente numa aposta máxima para ganharmos a guerra!

É necessário estar atento e “não morrer na praia”! A guerra COVID-19 que vivemos convoca-nos para procurar soluções. O conhecimento tem uma evolução rapidíssima e obriga-nos a acompanhar o que se sabe com rapidez e a seguir com perspicácia as orientações técnicas. Mesmo que seja difícil aceitar o modo de vida antissocial e tantas vezes desumano. Mesmo que seja complicado, incompreensível e desastroso do ponto de vista económico e apesar do cansaço evidente e manifestado pela comunidade. Ainda assim, temos neste início de verão uma situação sanitária instável, complexa e perigosa.

O aumento da taxa de incidência a 14 dias por 100 mil habitantes está a aumentar em Portugal desde meados de maio. Num mês quase duplicamos este indicador. Mas a variação desta taxa de incidência não é igual em todo o país. Na Região de Lisboa mais que triplicou num mês, enquanto que nas regiões Norte, Centro e Alentejo aumentou muito pouco e na Madeira até diminuiu. Nos Açores aumentou de cerca de 100 para 150 casos no último mês e no Algarve está a subir desde o início de junho. Os casos ativos aumentaram mais de 15% num mês e os doentes internados em cuidados intensivos aumentaram quase para o dobro.

E a vacinação, que diferença é que faz? Em meados de maio a população vacinada com uma dose de vacina estava acima de 30% no Alentejo, Centro, Norte e Madeira. Esta circunstância pode ajudar a explicar um pouco o aumento lento de casos nestas regiões e, simultaneamente, talvez justifique o aumento mais rápido nas regiões de Lisboa e dos Açores. As vacinas anti SARS CoV-2 são uma solução para a pandemia COVID-19. O efeito da vacinação é cada vez mais notório, tendo em conta a diminuição de pessoas infetadas com COVID-19 entre os mais idosos. Com a diminuição de formas graves da doença há menos óbitos e tem sido evidente a utilidade das vacinas para esta pandemia. Seria aliás dramático se não tivéssemos vacinado 50% da população, numa operação notável de esforço e dedicação. Temos que vacinar mais e depressa! Estamos a vacina 80 mil pessoas por dia, mas para conseguirmos vacinar 100 mil pessoas por dia teremos que fazer um enorme esforço de mobilização de mais recursos.

Contudo, o aparecimento de novas variantes do vírus SARS-Cov-2 é uma gigantesca preocupação. Inevitavelmente teremos que contar com esta realidade. Quanto mais pessoas tivermos infetadas e mais vacinados com esquema incompleto mais facilmente ocorrerão mutações. É nesta fase que estamos. No início de maio a variante associada ao Reino Unido era prevalente com mais de 90% das sequenciações realizadas nas amostras enviadas ao Instituo Ricardo Jorge. A variante associada à Africa do Sul tinha apenas 77 casos identificados e a variante associada a Manaus, Brasil tinha 101 casos. Da variante associada à India eram referidos apenas sete casos e tinham sempre associação a viagens recentes. Em apenas um mês o panorama alterou-se por completo.

A variante associada à India desdobrou-se em três linhagens e uma delas foi classificada pelas autoridades como “variante de preocupação” em 24 de maio – a variante Delta. De sete casos no início de maio passamos para mais de 100 casos da variante Delta identificados nas amostras. Aliás esta variante é já dominante no Reino Unido. Em Portugal, mais de 70% dos casos foram identificados em amostras de doentes da região de Lisboa e também mais de 70% do sexo masculino. A mediana de idades em 35 anos é igualmente preocupante porquanto temos ainda muito poucas pessoas vacinadas com menos de 35 anos. A variante Delta já está em circulação comunitária e justifica a evolução rápida na região de Lisboa. Para agravar o cenário, admite-se que esta variante possa resistir às vacinas em esquema incompleto. Ou seja, o nosso objetivo de termos 70% da população com pelo menos uma dose de vacina pode ser muito precário.

Em janeiro último fomos surpreendidos pela variante do Reino Unido, hoje dominante. Nessa altura em apenas 25 dias passámos de 80 mil para 180 mil casos ativos em Portugal. Nessa altura tínhamos o aviso de um R(t) acima de 1. Agora também temos este indicador acima de 1 durante várias semanas! Não é admissível voltarmos a um cenário de janeiro mas é necessário comunicar bem à comunidade que estamos perante um risco enorme. Não podemos “não morrer na praia”!

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