Opinião - MGF - Saúde Online https://saudeonline.pt/noticias/mgfonline/opiniao-mgf/ Notícias sobre saúde Tue, 02 Dec 2025 12:34:52 +0000 pt-PT hourly 1 https://saudeonline.pt/wp-content/uploads/2018/12/cropped-indentity-32x32.png Opinião - MGF - Saúde Online https://saudeonline.pt/noticias/mgfonline/opiniao-mgf/ 32 32 Saúde Digestiva: A microbiota intestinal pode ter um papel importante na prevenção e tratamento de doenças https://saudeonline.pt/saude-digestiva-a-microbiota-intestinal-pode-ter-um-papel-importante-na-prevencao-e-tratamento-de-doencas/ https://saudeonline.pt/saude-digestiva-a-microbiota-intestinal-pode-ter-um-papel-importante-na-prevencao-e-tratamento-de-doencas/#respond Tue, 02 Dec 2025 09:41:32 +0000 https://saudeonline.pt/?p=180972 Nutricionista, Investigadora e Professora Catedrática da NOVA Medical School

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Nos últimos 20 anos a saúde intestinal tem vindo a ocupar um lugar de destaque na esfera científica e médica. Em particular, o microbiota intestinal como um órgão metabólico, endócrino e neuroendócrino importante na manutenção da saúde metabólica e imunológica. Temos mais genes e células de origem microbiana do que de origem humana. Os genes humanos não mudam ao longo da vida, já os genes de origem microbiana mudam ao longo da nossa vida. A espécie humana evoluiu o que estes microorganismos nos permitiram evoluir como espécie. A evolução deste conhecimento científico e médico, com aplicação clínica, vem colocar de parte a visão de patogenicidade associada às bactérias (noção de que todo o ‘bicho’ é mau).

O microbiota em 3 esferas: é responsável pela síntese de vitaminas, como vitamina K, folato, vitamina D, entre outras; exerce funções digestivas, resultando uma sintonia entre as funções das enzimas digestivas que são produzidas pelas células do aparelho digestivo, humanas, e as enzimas que são de origem bacteriana. Aqui fica já muito claro que alterações na composição deste ecossistema microbiano provavelmente terá impacto no processo digestivo, com falhas, o que pode levar a processos. E ainda exerce funções de regulação da expressão de genes, como por exemplo estimulam que células do intestino produzam GLP1 ou mesmo genes relacionados com a permeabilidade intestinal e ainda função do sistema imunitário. A imunotolerância que deve ser desenvolvida nos primeiros anos de vida desenvolve-se muito à custa de um microbiota intestinal competente: sistema imunológico, para a nossa defesa, deve saber reconhecer o que ‘é do próprio’, o que ‘não é do próprio’, e deste, o que é uma ameaça, e o que não é uma ameaça. Aliás, se há compromisso do desenvolvimento desta imunotolerância, podemos ter aqui uma relação com asma, dermatite atópica ou mesmo doenças autoimunes da vida adulta.

É particularmente fascinante o papel do microbiota intestinal na regulação do peso. Seja ao nível do controlo do apetite, atingir ou não a saciedade, como também se deve ao microbiota intestinal muitas das ‘decisões’ de prioridade metabólica, ou seja, se teremos mais ou menos estimulada a acumulação de gordura.

Desde o nosso nascimento, até à fase em que começamos a fazer diversificação alimentar, o microbiota vai passando por transições, muito dependentes da idade gestacional da nossa mãe, do tipo de parto (cesariana ou vaginal) e se alimentados com leite materno ou de fórmula. Nesta fase as diferenças interindividuais são grandes, mas aos 2-3 anos de vida, o microbiota atinge a sua composição de base, e as diferenças são menores. Ainda na infância, a vida urbana ou rural, com ou sem animais domésticos, com ou sem exposição a antibióticos e o tipo de alimentação praticada, têm impacto na forma como o microbiota é moldado. Outros fatores que se fazem sentir ao longo da vida, como o exercício físico (ou a falta dele), a alimentação, o stresse e alguma da medicação que tomamos, também têm impacto no nosso microbiota. Todo este conhecimento sublinha a importância do papel modulador que a dieta, e em particular os prebióticos (ingredientes ou alimentos que estimulam o crescimento e atividade das bactérias boas) e os probióticos (microrganismos que auxiliam na digestão e protegem o organismo contra as bactérias nocivas) podem exercer de benéfico neste contexto.

A disbiose é um desequilíbrio do microbiota intestinal em que existe alteração na quantidade e na distribuição de bactérias no intestino, que por sua vez pode provocar doenças como obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares ou autismo.

Em suma, alterando a comunidade do nosso microbiota intestinal, através de prebióticos, probióticos, antibióticos ou, mesmo, o transplante de microbiota fecal, poderá vir a ser uma esperança no tratamento de diversas doenças. Importa, assim, fazer o diagnóstico correto. Tudo se relaciona e nos faz refletir como muitas vezes o microbiota intestinal é negligenciado. Relacionar o microbioma com os mecanismos das doenças, numa visão mais holística, poderá ajudar na prevenção ou tratamento das principais causas de morte da atualidade.

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Microbiota poderá ter “papel relevante” na redução da gordura corporal

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Quando o silêncio da osteoporose se torna um problema de saúde pública https://saudeonline.pt/quando-o-silencio-da-osteoporose-se-torna-um-problema-de-saude-publica/ https://saudeonline.pt/quando-o-silencio-da-osteoporose-se-torna-um-problema-de-saude-publica/#respond Tue, 21 Oct 2025 07:57:23 +0000 https://saudeonline.pt/?p=179817 Médico reumatologista

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Há vários desafios no tratamento da osteoporose em Portugal: não só existe um subdiagnóstico, ou seja, muitas pessoas com osteoporose desconhecem que têm a doença, frequentemente porque os médicos não consideram esta hipótese, como há também muitos que, apesar de diagnosticados e de terem realizado densitometria óssea, não iniciam tratamento devido a hesitações que, muitas vezes, não têm fundamento.

Há ainda um terceiro grupo de doentes, composto por aqueles que têm diagnóstico, a quem foi prescrito o tratamento, mas que não o cumprem. De facto, a adesão terapêutica na osteoporose é baixa, porque estamos a falar de uma doença silenciosa, em que os doentes não sentem o real benefício dos fármacos, pelo menos no curto prazo, o que compromete a sua motivação para manterem o tratamento.

Esta situação remete-nos para outra questão essencial: o reduzido nível de literacia sobre a doença na população em geral. Existe uma ideia errada de que a osteoporose se manifesta através de dor quando, na realidade, trata-se de uma doença assintomática que apenas causa dor na presença de uma fratura.

Estes dados revelam que muitos desconhecem o que é a osteoporose e, mesmo quando conhecem, tendem a desvalorizar a doença porque a consideram uma fatalidade associada ao envelhecimento, assumindo que é normal, à medida que envelhecemos, ter os ossos mais frágeis e sofrer fraturas. Mas não é normal: não é normal uma senhora com 75 anos fraturar a anca e ficar dependente de uma cadeira de rodas e não é normal uma mulher de 65 anos sofrer uma fratura vertebral.

Quanto aos médicos de Medicina Geral e Familiar, que constituem a porta de entrada destes doentes no sistema de saúde e que os acompanham, o problema não reside no desconhecimento sobre a osteoporose ou as suas consequências, mas sim o facto de colocarem a doença no fim da lista de prioridades nas consultas. No entanto, a abordagem da osteoporose é tão simples que deveria merecer outra posição.

Afinal, estamos a falar de mais de 600 mil pessoas em Portugal com a doença, grande parte delas com risco de fratura e grande parte delas também que, se fossem tratadas, iriam evitar ter essa fratura. É verdade que existem outras doenças preocupantes, como as cardiovasculares ou o cancro, mas existe uma ferramenta de uso clínico, o FRAX, que permite avaliar rapidamente o risco real de um doente vir a sofrer uma fratura. E o seu preenchimento não demora mais do que 30 ou 60 segundos, pelo que é fundamental promover a sua utilização sistemática.

Até porque, apesar de a osteoporose ser uma doença reumática, o que a coloca no âmbito da reumatologia, quando falamos de um problema que impacta tantas pessoas em Portugal como este, não é viável que a reumatologia acompanhe todos os doentes, pelo que o papel do reumatologista, no contexto da osteoporose, está mais relacionado com o apoio a situações em que o médico de família tenha dúvidas ou necessite de orientação especializada.

Acabamos por ser aqueles médicos de última linha no tratamento da osteoporose, ou seja, somos o garante que, no caso de haver dúvidas da medicina geral e familiar, tentaremos encontrar o melhor tratamento e a abordagem mais adequada para cada doente. Refiro-me, por exemplo, aos doentes mais graves, com risco muito elevado de fratura. Quando se fala de osteoporose, é também importante referir que existem muitas opções terapêuticas com eficácia comprovada na prevenção de fraturas, que é o grande objetivo do tratamento. Vale a pena tratar, vale a pena investir e vale a pena propor aos doentes que cumpram o tratamento, explicando-lhes o seu real benefício.

Depois, existem ainda medidas muito fáceis, não farmacológicas, que devemos adotar desde tenra idade, como garantir um aporte cálcio de mais ou menos de 1000 a 1200 mg por dia, algo relativamente fácil com o leite e os seus derivados, bastando dois copos de leite por dia. No entanto, como muitas pessoas abandonaram o consumo de lácteos, devem procurar fontes alternativas.

É igualmente essencial a vitamina D, obtida através da exposição solar ou de suplementação, assim como todas as medidas que implicam a prevenção de quedas, nomeadamente em casa e, muito importante ainda, a prática de exercício físico em carga. E isto não implica irmos para o ginásio gastar imenso dinheiro: a partir dos 60 anos, uma simples caminhada de 40 minutos por dia é muito importante para ganhar massa óssea e uma medida relativamente simples e acessível a todos nós.

A realidade é que a osteoporose é uma doença demasiado importante, demasiado impactante na vida de quem dela sofre para a ignorar ou a considerar um problema exclusivo dos mais velhos. Havendo medidas de eficácia comprovada para o prevenir, temos de as adotar, temos de as conhecer e não podemos continuar a desvalorizar um problema que afeta mais de 600 mil portugueses.

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“Osteoporose: Questões Fraturantes”. Um livro para médicos de família

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Dor crónica como sintoma ou como doença https://saudeonline.pt/dor-cronica-como-sintoma-ou-como-doenca/ https://saudeonline.pt/dor-cronica-como-sintoma-ou-como-doenca/#respond Thu, 16 Oct 2025 09:30:59 +0000 https://saudeonline.pt/?p=179665 Professora Coordenadora Principal da Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro; Presidente do Pain, Mind, and Movement Special Interest Group da International Association for the Study of Pain; e Coordenadora do livro Intervenção em Dor - Comunicação e Educação em Fisioterapia (LIDEL)

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A dor é um fenómeno global com uma prevalência elevada e um impacto individual e social muitíssimo relevante. Um estudo realizado em Portugal estimou uma prevalência média da dor crónica em 37%.1 O mesmo estudo verificou que a dor está associada a maior dificuldade em várias atividades do dia-a-dia, sendo as mais afetadas as responsabilidades relacionadas com as atividades familiares ou domésticas, recreativas, de ocupação/trabalho e o sono ou descanso.

A dor pode ser um sintoma ou uma doença em si mesma. A dor aguda é, geralmente, um sintoma e a dor crónica, habitualmente definida como uma dor com duração superior a três meses, pode ser considerada um sintoma associado a uma outra doença ou uma doença em si mesma. Quando a dor permanece após uma lesão ter cicatrizado ou uma doença ter sido tratada ou existe sem que se consiga identificar uma causa nos tecidos para essa dor, a dor pode ser considerada a doença e não um sintoma.

A Associação Internacional para o Estudo da Dor desenvolveu uma classificação que distingue entre dor crónica primária (a dor é a doença) ou dor crónica secundária (a dor é um sintoma associado a outra doença).2 São exemplos de dor crónica primária, a fibromialgia e a dor lombar crónica inespecífica. Nestes casos, a dor está mais associada a alterações químicas, funcionais e estruturais que ocorrem no sistema nervoso, tais como alterações no equilíbrio entre os processos inibitórios e facilitatórios endógenos, mudança nas áreas cerebrais envolvidas no processamento da dor, diminuição na concentração de neurotransmissores inibitórios, entre outros. São exemplos de condições em que a dor é considerada um sintoma, a artrite reumatoide.

Esta distinção entre a dor como um sintoma ou a dor como doença contribui para validar as queixas das pessoas com dor, independentemente de se conseguir identificar ou não uma causa. Legitima a dor da pessoa e reforça a premissa de que a dor é real e precisa de ser tratada. Mais, contribui para reduzir o estigma associado a alguns diagnósticos. Pensar-se na dor como doença implica considerar durante a intervenção os fatores que contribuem para a sua transição de aguda para crónica e para a sua manutenção ao longo do tempo, bem como considerar o seu impacto na pessoa. Estes fatores são diversos e incluem fatores genéticos, ambientais e biopsicossociais, requerendo uma intervenção multimodal e personalizada que considera a pessoa, o seu contexto e o tipo de dor.

As crenças sobre a dor, a sua origem e o seu significado carecem de ser exploradas e consideradas durante a intervenção, bem como o seu impacto na pessoa e nos que a rodeiam. Numa intervenção multimodal, centrada na pessoa, a educação, o exercício e a autogestão têm um papel central que a investigação tem enfatizado de forma bastante consensual. Estas abordagens são exploradas com maior detalhe e profundidade num livro recente que aborda a avaliação e intervenção na pessoa com dor numa perspetiva biopsicossocial. 3

Considerar que a dor pode ser uma doença constitui uma mudança de paradigma com elevado impacto positivo no tratamento da dor. Contudo, independentemente de ser considerada um sintoma ou uma doença, o relato subjetivo da experiência de dor é o padrão de referência e deve ser ouvido, respeitado e utilizado para informar a intervenção.

 

Referências:

  1. Azevedo LF, et al. (2012). Epidemiology of Chronic Pain: A Population-Based Nationwide Study on Its Prevalence, Characteristics and Associated Disability in Portugal. The Journal of Pain. 13(8):773-783.
  2. Nicholas M, et al. (2019). The IASP classification of chronic pain for ICD-11: chronic primary pain. Pain. 160(1):28–37.
  3. Silva AG. (2025). Intervenção em Dor: Comunicação e Educação em Fisioterapia, da editora Lidel

 

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Tratar a Dor em Cuidados Paliativos Pediátricos: Um Dever Clínico, Ético e Humanitário

 

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Cuidados Paliativos. Esperança infundada? Promessa adiada? https://saudeonline.pt/cuidados-paliativos-esperanca-infundada-promessa-adiada/ https://saudeonline.pt/cuidados-paliativos-esperanca-infundada-promessa-adiada/#respond Tue, 14 Oct 2025 08:34:14 +0000 https://saudeonline.pt/?p=179570 Médico da ECSCP Gaia - ULSGE; Professor Auxiliar Convidado da FMUC e da FMUP

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Chegámos ao mês de Outubro, o mês dos Cuidados Paliativos. Esperança infundada? Promessa adiada? Talvez um pouco das duas. Mas a questão mais importante é: queremos ou não queremos implementar verdadeiramente os Cuidados Paliativos em Portugal? E como queremos desenvolvê-los?

Temos ou não temos evidências que este investimento origina retorno? Qual é ou qual pode ser o valor acrescentado em saúde desta área no nosso sistema? Traz mais qualidade? Poupa recursos? Cria mais satisfação? Sabemos isto? Temos dados ou falamos empiricamente? Há objetivos concretos ou falamos “apenas” de questões éticas? Neste mês, cumprimos 10 meses sem Comissão Nacional de Cuidados Paliativos (CNCP). Sem plano nem estratégia, que são urgentes. Porque se queremos estar na linha da frente da criação de um modelo centrado nos doentes, precisamos urgentemente de um concurso para a CNCP.

Hoje, podemos refletir com base em evidências, acerca de vários fatores relacionados com a medição de valor, incluindo qualidade, satisfação e recursos. E porque estamos no mês 10, segue uma lista de 10 reflexões acerca destes parâmetros, fruto de análise de dados já publicados:

1- Ainda conotamos os Cuidados Paliativos (CP) com o Fim de Vida. E não distinguimos o que são CP básicos dos especializados. Mas o foco dos Cuidados Paliativos especializados tem que ser a alta complexidade clínica, independentemente da(s) doença(s), e é por isso que 50% dos doentes devem ter alta…Em modelos de alta performance, temos que garantir início de acompanhamento em menos de 24h após referenciação;

2- A medicina paliativa deve ser uma especialidade de precisão farmacológica, acentuando benefícios e atenuando ou evitando dano potencial, ajustada às características individuais. No entanto, observamos práticas inconsistentes e divergentes relativamente ao controlo de sintomas e aos alvos terapêuticos para cada doente (https://www.mdpi.com/1999-4923/16/9/1152);

3- Os cuidados paliativos especializados devem assegurar que o doente tenha apoios sociais, apoio psicológico (para o próprio e para a família e cuidadores) e adequação terapêutica, com doses e posologias adaptadas à pessoa, o que não se verifica em muitos doentes (https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/21501319241285340);

4- A perda de via oral gera muita angústia nas famílias e nos profissionais. Continuamos a assistir a uma baixa preparação e fraca orientação para valor acrescentado em saúde, complicando decisões que devem ter uma orientação clara, científica e humanista. Na perda de via oral, só o doente com expectativa de sobrevivência abaixo de 4 semanas é que não beneficia de alimentação por sonda nasogástrica ou, idealmente, por gastrostomia percutânea (PEG). Todos os doentes que tenham uma expectativa de sobrevivência superior a 4 semanas apresentarão benefício em várias dimensões – do controlo de sintomas, à qualidade de vida e, claro, ao próprio aumento da sobrevivência (https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/21501319241285340)

5- Uma equipa de cuidados paliativos domiciliária de alta performance aumenta a qualidade de prestação de cuidados, custa muito menos (até 10x de poupança para o sistema), traz mais satisfação e sensação de segurança a todos os envolvidos, evitando mais de 3000 idas à urgência em 323 doentes durante um ano de acompanhamento e tendo apenas 37 recorrências, 24 das quais enviadas pela própria equipa. Ou seja, onde estão as evidências da necessidade imperiosa de se colocar estas equipas em regimes de 24/24h, 7 dias por semana? (https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2950307825000384?via%3Dihub)

6- Os cuidadores informais (em Portugal serão quase 2 milhões) são um motor económico fundamental na área da saúde. Sim, económico! Geram poupança e melhoram a qualidade da prestação de cuidados a vários níveis. Do que precisam mais em relação aos apoios formais? Dizem eles, não sou eu: precisam da equipa de cuidados paliativos. Mais até do que dos apoios financeiros (que também precisam imenso!) (https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/26323524251336764)

7- A formação pré-graduada em medicina paliativa é praticamente inexistente no nosso país, o que gera dificuldades acentuadas no controlo da dor e de outros sintomas, para além de défices de formação em comunicação e trabalho em equipa, que são áreas estratégicas fundamentais. E as formações pós-graduadas em Cuidados Paliativos revelam lacunas graves relativamente aos conhecimentos médicos que deviam ser treinados (medicina paliativa) (https://www.mdpi.com/2076-3271/13/3/167)

8- A síndrome de anorexia-astenia-caquexia é ubiquitária em cuidados paliativos especializados, independentemente da doença ou doenças principais. No entanto, o seu tratamento preventivo é praticamente inexistente e as estratégias de reabilitação e contenção da sua evolução negativa também não têm tido uma consistência de abordagem (https://www.mdpi.com/2077-0383/14/17/6167)

9- A terapêutica com antibióticos em doentes frágeis não é geradora de consensos. O nosso estudo, realizado com dados de cerca de 250 doentes em fim de vida, propõe que as abordagens em medicina paliativa deviam passar pela utilização de fármacos com maior potência bactericida e maior espectro de ação, evitando fenómenos como a perda de oportunidade, em doentes em que acreditamos no benefício da utilização dos antibióticos (https://www.mdpi.com/2079-6382/14/8/782)

10- Medirmos saúde é fundamental. Criarmos indicadores organizacionais e de resultados focados no doente e nos alvos terapêuticos/clínicos de forma individualizada é crucial. Os recursos não são infinitos. Temos que investir bem.

Vamos olhar para as evidências? Vamos reorganizar-nos com um modelo exigente, focado em melhores outcomes, melhores resultados e melhores índices de produtividade?

 

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Da recordação à assombração https://saudeonline.pt/da-recordacao-a-assombracao/ https://saudeonline.pt/da-recordacao-a-assombracao/#respond Tue, 07 Oct 2025 08:30:15 +0000 https://saudeonline.pt/?p=179426 Especialista em Medicina Geral e Familiar

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dor

O final das Administrações Regionais de Saúde (ARS) em Portugal, formalizado pelo Decreto-Lei n.º 54/2024, foi anunciado como o arranque da optimização da gestão do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

A extinção das ARS tão desejada por alguns teóricos da Saúde e a transferência das suas  competências para outras entidades, como a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), a Direção Executiva do SNS entretanto parida e a Direção-Geral da Saúde, prometia a simplificação da estrutura e a melhoria da eficiência do sistema de saúde.

Esse novo Decreto-Lei n.º 54/2024, de 6 de setembro, formalizou a extinção de há muito anunciada e gerida então pelos governos de António Costa.

Era também assegurada uma gestão de maior proximidade e de integração de cuidados com o desenho do país retalhado em Unidades Locais de Saúde (ULS).

Foi anunciada ainda uma comissão, mais uma comissão nomeada pelo Despacho n.º 12785/2024, de 21 de Outubro de 2024, esta liquidatária para coordenar e dirigir este processo e lia-se no Diário da República que, a extinção das ARS implicaria a “introdução de alterações pontuais na orgânica da Direção-geral da Saúde, do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge e da Direção-Executiva do SNS”, de forma a “refletir a transferência de atribuições e competências das ARS” e, por outro lado, “reforçar as capacidades e competências de todo o sistema”.

O seu mandato previa exercício de funções até 31 de janeiro de 2025 e deve ter sido mais complexo do que imaginário e justificou uma prorrogação até 31 de Março por novo Despacho n.º 2141/2025 assinado pelos Ministros das Finanças e da Saúde…

Por outro lado no plano da integração de cuidados o que conhecemos e assistimos mostra que, a fórmula gestionária das ULS não parece ainda ter resolvido o problema  que, de alguma forma, legitimou a sua aprovação política e generalização prática.

E curiosa e dramaticamente, até se discute agora o plano da articulação entre hospitais com uma intensidade já mediatizada após sucessivos casos embaraçosos para o sistema de saúde e lamentáveis para os cidadãos atingidos.

Os Cuidados Primários mantêm as queixas e as dificuldades identificadas e não se afigura claro qualquer salto qualitativo, seja no âmbito da contratação de médicos, na atribuição de médicos de família, na referenciação de doentes ou na prevenção da doença. Ao mesmo tempo há tarefas ou competências transmitidas para este nível de Cuidados que não foram, pelo menos, adequadamente preparadas.

Enfim, em outro plano, as ARS ainda parecem vivas e entram-nos nas caixas de correio electrónico trimestralmente.

Refiro-me como todos os médicos saberão ao “Relatório trimestral do perfil individual da prescrição de medicamentos comparticipados pelo SNS”, enviado religiosamente pelos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde a partir do endereço “sim-sns@spms.min-saude.pt”

Dirigido ao Exmo(a). Senhor(a) Dr(a). Rui Cernadas, em 14/08/2025, 15:41 horas, lemos:

“O despacho n.º 13901/2012 do Senhor Secretário de Estado da Saúde publicado a 25 de outubro de 2012 no Diário da República 2.ª série, n.º 207, cria o sistema de retorno de informação aos médicos, que no âmbito da sua atividade privada, prescrevem medicamentos sujeitos a comparticipação do Serviço Nacional de Saúde. Com a criação deste sistema de retorno visa-se incentivar, através da divulgação ao Médico do seu perfil de prescrição, o uso racional e adequado da medicação que beneficia do apoio estatal, privilegiando a prescrição por denominação comum internacional e por via eletrónica.

É neste contexto que lhe enviamos o relatório em anexo com o cálculo de um conjunto de indicadores relativos às suas prescrições, bem como o documento explicativo dos mesmos indicadores. Este relatório é enviado trimestralmente a todos os profissionais que prescreveram no âmbito da sua atividade médica privada pelo menos 30 receitas no mês.

Para qualquer esclarecimento poderá contatar a Administração Regional de Saúde através do endereço eletrónico disponível na respetiva página da internet com a designação “MPPrivados“.

A algo que ocorre na memória como resultado de experiências vivenciadas, geralmente por razões afetivas, chamo recordação.

Pensei em “assombração” que, em português, refere-se a um fenómeno sobrenatural, como um fantasma ou aparição, que causa medo ou um sensação muito estranha…

Tentei afastar o frio da espinha e dei um salto à página da ARS do Norte – lê-se a indicação disponibilizada –  “Será desativada brevemente”…

*O autor escreve de acordo com o A.A.O

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Descentralização da Saúde em Portugal: Transferência de Competências ou de Encargos? https://saudeonline.pt/descentralizacao-da-saude-em-portugal-transferencia-de-competencias-ou-de-encargos/ https://saudeonline.pt/descentralizacao-da-saude-em-portugal-transferencia-de-competencias-ou-de-encargos/#respond Mon, 29 Sep 2025 10:04:55 +0000 https://saudeonline.pt/?p=179143 Administrador hospitalar

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Nos últimos anos, a descentralização tem sido apresentada como uma das bandeiras de reforma do Estado português. No papel, pretende aproximar os serviços públicos das populações, reforçar o poder dos municípios e tornar a gestão mais eficiente. Na saúde, esta transformação ganhou corpo com o Decreto-Lei n.º 23/2019, que transfere algumas competências do Ministério da Saúde para as autarquias. Mas afinal: estamos perante uma verdadeira reforma ou apenas uma redistribuição de encargos?

O que mudou?

De acordo com a lei, os municípios passaram a assumir responsabilidades ligadas a infraestruturas, manutenção de equipamentos, transportes e assistentes operacionais. Em contrapartida, a gestão clínica e técnica permanece no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Na prática, isto significa que as câmaras municipais passaram a gerir edifícios, contas da luz e da água, limpeza e vigilância. Mas continuam sem poder decidir sobre a organização da resposta clínica ou sobre a forma como os cuidados são prestados.

As promessas

Entre as vantagens apontadas estão:

  • maior proximidade às necessidades locais;
  • gestão mais ágil das infraestruturas;
  • responsabilização política dos autarcas.

As fragilidades

Contudo, também existem riscos evidentes:

  • Quebra da cadeia de comando — Uma gestão eficaz exige uma linha clara de autoridade. Com responsabilidades repartidas, a coordenação pode tornar-se mais difícil.
  • Mais burocracia — Para articular esferas clínica e logística, a lei prevê múltiplos órgãos de governação partilhada (Conselho Municipal de Saúde, Comissão de Acompanhamento, entre outros). O risco é criar mais reuniões do que soluções.
  • Subfinanciamento — As verbas transferidas podem ser insuficientes, sobretudo para edifícios degradados. Em muitos casos, os municípios herdam encargos sem garantias de recursos adequados.
  • Participação limitada — Embora exista a Estratégia Municipal de Saúde, esta tem de alinhar-se com planos nacionais e regionais. Assim, a autonomia local acaba por restringir-se à esfera logística, não à definição da política de saúde.

O que fazem outros países?

A Europa mostra diferentes caminhos:

  • Países Baixos: municípios assumem cuidados continuados e sociais.
  • Noruega: municípios gerem cuidados primários; regiões, os cuidados especializados.
  • Itália: regiões têm autonomia, mas isso gerou disparidades na qualidade e acessibilidade.
  • Dinamarca: modelo partilhado – Estado regula, regiões gerem hospitais e ambulatório, municípios asseguram cuidados continuados e reabilitação.
  • Suécia: três níveis de governação (nacional, regional, municipal), com responsabilidades claras em cada um.

Em comparação, Portugal preferiu uma abordagem cautelosa, limitando-se a transferir encargos logísticos. Resultado: as câmaras municipais tornaram-se gestores de meios, mas não atores de governação clínica.

E agora?

É inegável que o processo de descentralização já começou e dificilmente terá marcha atrás. A verdadeira questão é: queremos municípios apenas como administradores de edifícios e contas de eletricidade ou como parceiros ativos na governação da saúde? Se a descentralização é irreversível, será necessário repensar os mecanismos de coordenação da prestação e financiamento. Só assim deixará de ser um mero exercício de redistribuição de encargos e poderá traduzir-se em ganhos reais para os cidadãos e para o SNS.

 

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