23 Out, 2017

OE2018: SNS com menos 51,3 milhões do que em 2017

Adalberto Campos Fernandes vai contar com menos 51.5 milhões de euros, para fazer face às despesas do SNS. São menos 0.6% de um total correspondente a 4,25% do PIB previsto. Parceiros dizem que não chega…

A despesa total consolidada do Programa da Saúde prevista inscrita na proposta de orçamento geral do Estado para 2018 é de 10,289,5 milhões de euros, o que representa um aumento de 2,4% (239,1 milhões de euros) face ao estimado para 2017 e a um aumento de 4,4% (360,2 milhões de euros) face ao orçamento de 2017. Já a despesa efetiva consolidada será de menos 92.7 milhões de euros do que o valor total inscrito.

Um acréscimo orçamental, pelo menos aparente, explicado com o “aumento substancial de despesa no SNS em 2017, estando implícito um reforço do orçamento ao longo do ano de 2017”, lê-se no documento.

E aparente porque do total da despesa consolidada do Programa da Saúde, as transferências para o SNS perfazem 8 427,4 euros, menos 51.3 milhões de euros do que em 2017.

Um valor que não convence os agentes do setor, que apontam o aumento da dívida em atraso e a dilatação do prazo de pagamento (dívida vencida) como um obstáculo que a previsão orçamental não cobre, pelo contrário, torna mais difícil, já que haverá menos dinheiro para a aquisição de bens e serviços correntes.

Refira-se que de acordo com o último relatório de execução orçamental, a tendência de crescimento da dívida em atraso, que já se vem a registar desde 2015, tem-se mantido em 2017, a um ritmo ainda mais acelerado do que o verificado até final de 2016.

No final de agosto, a dívida vencida, reportada pela direção Geral do Orçamento ascendia a 903 milhões de euros, mais 51 milhões do que no mês anterior e mais 290 milhões do que em janeiro.

A manter-se este crescimento, 2017 encerrará com a dívida em atraso a ultrapassar a barreira dos mil milhões de euros, ultrapassada pela última vez em dezembro de 2011 (mês em que atingiu 1616 milhões de euros).

Na transferência prevista para 2018, a aquisição de bens e serviços correntes, onde se incluem a aquisição de medicamentos, dispositivos médicos, meios de diagnóstico e terapêutica e os encargos com as parcerias público-privadas são as que mais pesam, representando 55.3% do orçamento global.

O aumento dos encargos com as PPP da saúde, face aos valores previstos no Relatório do OE2017 é explicado, sobretudo, por uma revisão das projeções de produção, em linha com a tendência que tem sido verificada no sector”, informa o documento.

Com peso muito significativo, também, as despesas com pessoal, que absorvem 38.4% (3951.2 milhões de euros) do total, explicados com a necessidade de dotação centralizada com o descongelamento das carreiras. Um valor que também não convence os agentes do setor, desde logo porque inferior, em 41 milhões de euros, ao inscrito no OE2017.

De salientar que de acordo com o documento, o aumento de despesa no Programa Saúde tem associado uma previsão de aumento do investimento de 16,1%. Na estrutura de distribuição das despesas pelas seis medidas inscritas no Programa Saúde, destacam-se as destinadas aos Hospitais e Clínicas, aos Serviços Individuais de Saúde e à Administração e Regulamentação, as quais absorvem a quase totalidade do programa (97,4%).

As parcerias público/Privados foram comtempladas com 447.2 milhões de euros no Programa Saúde e o Simplex, com apenas 2.6 milhões.

Mais hospitais e centros de saúde

No quadro das medidas a implementar em 2018, ao nível das infraestruturas e equipamentos, o executivo inscreveu no orçamento, a reabilitação e reequipamento das unidades de saúde (unidades de cuidados de saúde primários e cuidados de saúde hospitalares). Em 2018, será lançado o concurso do Hospital de Lisboa Oriental e iniciar-se-ão os projetos do Hospital de Évora e do Seixal. Será ainda contruído o Hospital de Sintra, lê-se no documento.

De fora das contas do Governo fica o Hospital do Funchal, unidade há muito reivindicada pelo Governo Regional, que já se manifestou contra o que considera uma quebra de promessa feita por António Costa, aquando de uma visita ao arquipélago”. Nessa visita, o primeiro-ministro ter-se-ia comprometido com a comparticipação de 50% dos custos da obra, estimada em 340 milhões de euros, tendo afirmado que a verba seria inscrita no OE2018.

Tarefeiros vão ceder lugar a contratados com vínculo de emprego público

 À semelhança do que verificado na Lei de Orçamento de 2017, em 2018 o Governo compromete-se a substituir gradualmente o recurso a empresas de trabalho temporário e de subcontratação de profissionais de Saúde pela contratação, em regime de vínculo de emprego público, dos profissionais necessários ao funcionamento dos serviços de saúde. No último balanço social do Ministério da Saúde, os contratos de prestação de serviços contabilizavam 1.923 (1,6%) empregos, sendo que cerca de 73% eram médicos (1.407 trabalhadores).

Os médicos aposentados que decidam regressar ao serviço, mantêm as mesmas condições remuneratórias atualmente em vigor, que inclui a pensão de aposentação acrescida de 75% da remuneração correspondente à carreira, escalão ou posição remuneratória detida à data da aposentação, assim como o respetivo regime de trabalho.

Mantém-se também, em 2018, o regime de exceção que permite que se mantenham em funções os médicos internos que tenham celebrado contratos de trabalho a termo resolutivo incerto com que iniciaram o respetivo internato médico em janeiro de 2015 e que, por falta de capacidades formativas não tiveram a possibilidade de prosseguir para a formação especializada.

Reforço dos Cuidados continuados e paliativos

Outras das medidas inscritas na proposta de OE2017, é a do Alargamento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, promovendo o aumento do número de camas em todas as tipologias, o reforço dos cuidados de proximidade ao domicílio, a implementação de unidades de internamento e de ambulatório de cuidados pediátricos integrados e a concretização e qualificação de respostas de Cuidados Continuados Integrados em Saúde Mental, com enfase nas respostas na comunidade.

A proposta prevê ainda a operacionalização e alargamento da Rede Nacional de Cuidados Paliativos através da constituição de novas equipas quer intra-hospitalares, quer na comunidade, e a constituição de novas Unidades de Cuidados Paliativos.

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Opiniões

 

João Almeida Lopes
Presidente de Direção da APIFARMA

OE é uma deceção!

Os dados iniciais do Orçamento do Estado para 2018 são escassos. No entanto, sugerem que esta proposta de OE é uma deceção. A dotação fica claramente abaixo das necessidades, mantendo-se um quadro evidente de subfinanciamento crónico da Saúde.

Continuamos a ser confrontados com a falta de transparência de dados em relação à Saúde. É essencial responder a inúmeras questões: quando e como pretende o Ministério da Saúde regularizar a dívida? Qual o custo das negociações em curso com os profissionais da Saúde? Para quando um valor de investimento público em medicamentos em linha com indicadores da OCDE? Como se aumentará a despesa total em Saúde se prevemos menos dinheiro nas transferências?

Esta proposta de OE, pelo que podemos antecipar, é um exercício que peca por falta de transparência e não permite que os agentes económicos e os cidadãos tenham confiança na ação do Estado.

Hoje, de acordo a Direcção-Geral do Orçamento, continuamos sem vislumbrar o abrandamento da dívida hospitalar que em Agosto de 2017 superou os 900 milhões de euros, mais 47,3% em relação a Janeiro. Na verdade, em apenas um ano e até Agosto de 2017, o défice do SNS disparou para perto dos 114

milhões de euros – quando em 2016 era de 20 milhões. Isto apesar da injeção extraordinária de 270 milhões de euros, realizada este ano pelas Finanças, que impediu que o défice escalasse para os 384 milhões de euros.

Entretanto, o país mostra sinais de um crescimento económico assinalável face aos últimos anos. Os portugueses dificilmente compreenderão que o Orçamento da Saúde continue a ignorar os números do PIB, que em termos nominais irá crescer, em 2018, 3,6%, de acordo com o projeto de OE.

Nota para as medidas de contenção de despesa inscritas no OE que decorrem, uma vez mais, essencialmente da pressão sobre os fornecedores do Sistema de Saúde, que nunca deixaram de contribuir para a sua sustentabilidade.

Em resumo, a situação é particularmente preocupante. Este OE deixa a saúde para trás, confinada a uma inevitável espiral de agravamento da situação atual, o que coloca em causa a sustentabilidade do SNS e o acesso equitativo de todos os portugueses aos cuidados de saúde.

 

Paulo Cleto Duarte
Presidente da Associação Nacional das Farmácias

Farmácias apreensivas com proposta de OE

O sector das farmácias encara este Orçamento de Estado com esperança e sentido de urgência. Neste momento, 607 farmácias enfrentam processos de insolvência e penhora. Isto significa que uma em cada cinco farmácias não sabe se vai sobreviver em 2018. O espectro de falência ameaça farmácias rurais e urbanas em todos os concelhos, do continente e ilhas. O sector do medicamento foi sujeito a medidas de austeridade sem paralelo na sociedade portuguesa, seis vezes superiores ao preconizado pela Troika. O problema é que continua a viver nesse paradigma. Os doentes portugueses ainda não conseguem aviar as receitas médicas normalmente. Todos os meses faltam quatro a cinco milhões de embalagens de medicamentos, alguns deles urgentes, como insulinas para diabéticos, pílulas anticoncepcionais e anti-hipertensivos. Este Governo mostrou-se consciente do problema e focado em virar a página. Em Fevereiro de 2017, os ministros das Finanças e da Saúde subscreveram um acordo com as farmácias. Esse documento foi preparado ao detalhe para favorecer, simultaneamente, a sustentabilidade do sector e das contas públicas, mas a sua implementação está atrasada. As farmácias portuguesas continuam a ser discriminadas e excluídas das margens de referência legisladas pelo Estado português para o mercado dos medicamentos. A regulamentação e implementação de serviços farmacêuticos, em benefício das populações, está atrasada, mesmo em casos previstos no Programa do Governo, como o acesso de proximidade aos medicamentos hospitalares. Apesar destes problemas, acreditamos que a solução já contratualizada com o Governo será implementada em 2018.

 

Óscar Gaspar
Vice-presidente do Conselho Estratégico Nacional de Saúde da CIP e presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada

À Saúde o que é a da Saúde

O Orçamento é para 2018 mas a maior surpresa é dada sobre 2017. Na proposta de OE2018 apresentada, o Governo informa que injetará este ano no SNS mais 400M€ do que o previsto no OE2017. Assim, o corrente exercício deve encerrar com uma transferência para o SNS de 8.478,7M€, sendo que para o próximo ano haverá uma redução de 51M€ (-0,6%).

Dito de outra forma, a transferência para o SNS em 2018 corresponde a 4,25% do PIB previsto. Este valor parece ficar aquém das necessidades – face ao histórico, face aos objetivos pretendidos de aumento de investimento, qualidade e acesso a cuidados de saúde e também face ao expetável aumento da procura. Para termos um termo de referência, o total do programa Orçamental Saúde representa 5,3% do PIB em Portugal quando na OCDE o valor da despesa pública em Saúde é de 6,5% do PIB.

O Governo estima poupar no próximo ano 166 M€ com as medidas de redução de despesa mas também terá desafios acrescidos, seja por via da inovação, seja pelos aumentos previstos na massa salarial (progressões, 35 horas, subsídio para enfermeiros especialistas, etc.) embora esta última componente possa ser financiada a posteriori pelo Ministério das Finanças.

Outra área de forte preocupação é a da dívida. O Governo compromete-se com “um esforço substancial de diminuição da dívida das entidades do SNS”, refere a injeção de capital para esse efeito e também a criação de uma Unidade de Análise Orçamental especificamente para acompanhar as dívidas da Saúde. Esta é uma medida que tarda porque problema arrasta-se há anos e afeta gravemente os fornecedores e prestadores do SNS.

O Ministério da Saúde, e o SNS em particular, merecem e exigem dotações adequadas para prosseguir as suas responsabilidades e as respetivas administração e gestão têm que investir em medidas estruturas e procurar soluções de maior eficiência. Ou seja, de entrega de maior valor aos cidadãos e aos doentes.

 

Luís Lopes Pereira
Diretor-geral da Medtronic

Sustentabilidade do SNS é problema de todos!

A sustentabilidade do SNS, e as formas de a alcançar, têm sido tópicos amplamente discutidos no lado do pagador (Estado) mas não no lado de quem presta serviços ou fornece produtos. Mas a verdade é que a sustentabilidade deve ser uma realidade para todos os protagonistas do mercado, porque se as empresas fornecedoras saírem do País ou falirem, o SNS torna-se ainda mais insustentável.

No caso concreto das empresas de dispositivos médicos, cerca de 90% são de pequena ou média dimensão. O orçamento de Estado prevê uma contribuição destas empresas através de uma taxa extraordinária sobre o preço dos produtos, na ordem dos 2,5 e os 7,5%, que vem juntar-se ao avultado valor da dívida pública em atraso e aos dilatados prazos de pagamento, acima dos 380 dias. Esta medida poderá ter implicações nefastas para o sector, com prejuízo para a qualidade dos produtos disponíveis no mercado bem como do serviço de profissionais especializados que está implícito ao fornecimento de produtos mais complexos. A entrada de tecnologias disruptivas tem muitas vezes um efeito inicial de aumento da despesa, mas logo se dilui com a rápida e forte concorrência que este sector apresenta. Assim os aumentos da faturação de material clínico estão normalmente associados a aumentos de produção dos hospitais públicos, frequentemente com descidas do custo por doente ou por unidade.

É no sentido de promover medidas que garantam a sustentabilidade do SNS mas também a sustentabilidade dos fornecedores que deveríamos focar-nos numa estratégia focada na eficiência, como é exemplo o conceito de “value based health care”, no qual as terapêuticas são pagas consoante um determinado objetivo de resultados para o doente. Este poderá ser o caminho para assegurar que se mantém a inovação, tão essencial à qualidade da prestação de saúde.

 

Miguel Guimarães
Bastonário da Ordem dos Médicos

Claramente escasso face às necessidades

Numa primeira análise à proposta de Orçamento de Estado para o ano de 2018 verifica-se que o Ministério da Saúde mantém a tónica do seu discurso na “aposta no Serviço Nacional de Saúde”, na “necessidade de melhoria das condições de acesso ao SNS, na modernização de equipamentos e infraestruturas e no reforço do investimento em recursos humanos”.

Este discurso reflete-se num aumento da despesa total consolidada na área da saúde na ordem dos 10.289,5 milhões de euros, o que representa um crescimento de 239 milhões de euros (+2,4%) face à estimativa para 2017.

Porém, no que ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) diz respeito, verificamos que, mais uma vez, se assiste a uma redução de 51,3 milhões de euros no valor das transferências para o SNS, financiado pelas receitas gerais, cuja orçamentação se situa nos 8427,4 milhões de euros, menos 0,6% que o valor estimado para 2017.

De realçar que o valor de transferências para o SNS previsto no OE 2017 era de 8078,7 milhões de euros. Atualmente estima-se um valor final de 8478,7 milhões de euros, graças à verba adiional de 400 milhões que deverá estar alocada, em grande parte, à redução das dívidas em atraso dos hospitais aos fornecedores.

As despesas com pessoal representam cerca de 38,4% do total da despesa consolidada, ascendendo a 3.951,2 milhões de euros, a que acrescerá em 2018 um reforço proveniente de dotação centralizada com o descongelamento das carreiras. O crescimento da despesa com pessoal é 0,6%.

Este é um Orçamento claramente escasso face às reais necessidades do país e do SNS. O Ministério da Saúde tem um longo caminho pela frente nos compromissos que tem com os portugueses. É essencial renovar a maioria dos equipamentos das unidades de saúde do SNS, equilibrar o seu capital humano, aumentar a capacidade de resposta às necessidades dos doentes e melhorar as condições de trabalho dos seus profissionais. Estes compromissos não são possíveis de concretizar sem um reforço significativo do financiamento do serviço público. Como irá o ministro da Saúde alcançar todos estes objetivos, quando a dotação orçamental prevê um mero aumento de 0,6% na verba correspondente à despesa com pessoal?

Como irá o ministro da Saúde cumprir todas as metas a que se compromete quando as transferências para o SNS recuam face à verba que se estima gastar até final deste ano?

Parece-me que o Governo continua a comprometer a essência do nosso SNS, tal como está consagrado na Constituição da República Portuguesa.

 

MMM

 

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