Discriminação contra casais LGBT aumenta após Lei da Gestação de Substituição
Apesar da remoção de muitos obstáculos, como é o caso da coadoção ou do alargamento da Procriação Medicamente Assistida (PMA), a parentalidade para esta comunidade ainda é considerada um privilégio
O projeto de investigação Intimate conclui que a lei da gestação de substituição, aprovada em 2016, reforça a discriminação contra casais LGBTQ, nomeadamente de homens gay, bloqueando a parentalidade a essa população.
“A gestação de substituição foi aprovada recentemente, mas com fortíssimas restrições – apenas para casos em que há uma grave lesão ou ausência de útero. Isso introduz uma discriminação que já lá estava, mas que é apenas reforçada”, disse Ana Cristina Santos, coordenadora do projeto Intimate, que organiza em Coimbra a 2.ª Conferência Internacional “Queering Parenting”, hoje e sexta-feira.
O projeto consistiu na análise das questões das parentalidades da comunidade LGBTQ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgéneros e Queer) no que diz respeito à procriação medicamente assistida e a gestação de substituição em Portugal, Espanha e Itália, recorrendo a entrevistas de profundidade a pessoas LGBTQ que são ou querem ser pais e mães.
Conclui-se que as “restrições aos direitos reprodutivos” continuam a existir, o que leva a que a parentalidade não possa ser vista como “uma escolha”, mas como um privilégio, sublinhou a investigadora do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.
“Mantém-se uma hierarquia entre as pessoas que podem aceder a técnicas de reprodução medicamente assistidas e outras banidas pela sua natureza, porque não encaixam num critério apertado, que é um critério clínico, e isso inclui, por exemplo, os casais de homens”, realçou Ana Cristina Santos.
A atual lei de gestação de substituição está associada a “uma patologia” e transforma a “gestação num mal necessário. Não deve ser um mal necessário, mas mais uma forma de se aceder à parentalidade”, defendeu a investigadora.
A investigação, que está prevista terminar em 2019, conclui também que a parentalidade na comunidade LGBTQ não é fruto do acaso.
“Estes pais e estas mães são pais e mães intencionais, que programaram e planearam as suas vidas em função do projeto da parentalidade”, constatou a coordenadora do projeto, considerando “muito leviano” e desligado da realidade quando se diz que “a criança não está no centro das preocupações destes pais e destas mães”.
O estudo nota ainda que, em termos de homofobia em contexto familiar, a gravidez acaba por ser o momento escolhido “para haver uma reconciliação com a família de origem”, referiu.
Além das entrevistas a pais e mães LGBTQ, o projeto contou ainda com entrevistas semiestruturadas a peritos de diferentes áreas, como a saúde, direito ou política.
Entre hoje e sexta-feira, realiza-se em Coimbra a segunda conferência internacional do projeto, que conta com a presença de académicos, políticos e profissionais das áreas da saúde e do direito de vários países da Europa, mas também do México, Nigéria, Colômbia e Brasil, entre outros.
O projeto Intimate – A Micropolítica da Intimidade na Europa do Sul arrancou em 2014 e termina em 2019, abordando a cidadania íntima LGBTQ em Portugal, Espanha e Itália, em torno de temas como a conjugalidade lésbica, poliamor, procriação medicamente assistida e redes de amizade, entre outros temas.
LUSA/SO