Álvaro Beleza: Uma dívida à Medicina pelo muito que ela fez por mim

Eu, se ainda estou vivo, devo-o à medicina portuguesa. Tive uma doença grave e sobrevivi, graças à medicina portuguesa. Essa dívida pesou na minha decisão!

Anunciou a sua candidatura “após prolongada reflexão e muitas conversas com vários colegas”… Que argumentos o motivaram a avançar?
Entre outros, que os médicos necessitavam de recuperar o prestígio perdido e de uma Ordem dos médicos (OM) que fosse um parceiro ouvido e respeitado, que tivesse uma intervenção incisiva e concisa. Uma Ordem cuja opinião fosse tida em conta. E vários Colegas entenderam que eu, como Bastonário, poderia desempenhar esse papel. Por outro lado, eu devo tudo à medicina, e achei que era tempo de, na medida das minhas possibilidades, retribuir o muito que recebi. E falo no que a medicina me deu enquanto médico, mas também enquanto doente. Eu, se ainda estou vivo, devo-o à medicina portuguesa. Tive uma doença grave e sobrevivi, graças à medicina portuguesa. Essa dívida pesou na minha decisão!
Outro pormenor que sobressaiu da sua decisão de candidatar-se foi o argumento “porque o meu amigo e nosso Bastonário decidiu não se candidatar!!. Uma mudança na continuidade?
É lícito concluir que haverá continuidade e haverá mudança. Eu presidi ao Conselho de Auditoria e Qualidade durante o primeiro mandato do atual bastonário e participei ativamente nas primeiras normas de orientação clínica e esse é um processo que irá continuar. Noutros campos, como por exemplo a informática, haverá mudanças.

Diz querer modernizar a Ordem. Quais as principais propostas dessa modernização?
Acabo de dar um exemplo. A OM tem que se modernizar no que respeita à parte informática. Consulte o site nacional e veja como está desatualizado. Não está adaptado aos novos meios (tablets, telemóveis), que são, hoje, a forma como a maioria de nós acede à internet.
Veja o caso da revista. Veja como os médicos ainda hoje têm que se deslocar às sedes físicas da OM para tratar de assuntos que poderiam ser tratados à distância, por via informática. Há muito espaço para modernizar.

Das declarações públicas depreende-se que defende uma redução do valor das quotas que aponta de “caríssimas”. São mesmo?
Com os novos estatutos a OM perdeu fontes de financiamento. Agora passa a viver apenas das quotizações dos associados. Por isso, e apesar do valor da quota anual ser pesada para alguns médicos, não será fácil reduzir significativamente o seu valor.

Propõe, como o atual bastonário, uma redução do numerus clausus… De modo a afastar o fantasma do desemprego médico?
A redução do numerus clausus não afasta o fantasma do desemprego. Apenas o mitiga. Portugal está, claramente, a formar mais médicos do que aqueles que necessita, pelo que a redução do número de alunos é fundamental. Porém, também é preciso encarar a problemática da vinda de médicos, Portugueses e de outras nacionalidades, que se licenciaram no exterior.
Como compatibilizar numerus clausus com necessidades específicas de especialistas em determinadas áreas (anestesiologia, por exemplo)?
Uma coisa não está ligada diretamente à outra. A falta de Anestesiologistas tem a ver com problemas de contratação e de aumento das áreas de intervenção daqueles especialistas. Veja a analgesia do trabalho de parto, que não se fazia quando eu me formei.
Passo a explicar: Portugal pode formar o dobro ou o triplo dos anestesiologistas e continuará a haver falta deles nos hospitais do SNS. Veja que não há notícia da falta de anestesiologistas no sector privado. O que acontece, como noutras especialidades, é que sendo estes mal pagos no sector público, saem para o sector privado e para a emigração. É urgente, sublinho, urgente, pagar condignamente o trabalho médico no sector público. Essa é também uma das razões porque me candidato. Sendo matéria do foro sindical, trabalharei com os dois sindicatos médicos para que se possa definir um limiar de remuneração digna para os médicos, em todos os níveis da profissão e em todos os sectores.

As universidades existentes têm capacidade para absorver o atual número de estudantes?
No que concerne à medicina, são as próprias faculdades a admitir que já ultrapassaram as suas capacidades formativas. O atual numerus clausus não obedece a qualquer racional.

Qual a principal lacuna que identifica no SNS?
A gestão do orçamento. O SNS está subfinanciado e o dinheiro que existe é gasto sem um rigoroso controlo.
Perfil do candidato

Álvaro Beleza nasceu a 26 de setembro de 1958, em Lisboa. Estudou medicina na Faculdade Medicina Universidade do Porto e especializou-se em Imuno-Hemoterapia no Hospital Universitário de Coimbra. Foi diretor do Serviço de Sangue Hospital de Évora, entre 1997-2008, e do Laboratório Regional de Saúde Publica do Algarve, entre 2008 e 2010. Foi também presidente do Conselho Diretivo Instituto Português do Sangue e agora dirige o Serviço de Sangue do Hospital de Santa Maria. Membro do PS, foi secretário nacional do partido, com o pelouro da Saúde, entre 2011 e 2014, e membro da comissão política e da comissão nacional, também em 2014.

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