15% das mulheres têm perturbações obsessivo-compulsivas após o parto

Estas são "as [perturbações] menos bem diagnosticadas e as que levam mais tempo entre o primeiro sintoma e o pedido de ajuda", afirma António Ferreira de Macedo.

Foto: Ana Telma Pereira e António Ferreira de Macedo

Um estudo do Instituto de Psicologia Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra concluiu que 15% das mulheres portuguesas apresentam “pensamentos e comportamentos obsessivo-compulsivos de forma recorrente” após o parto.

O estudo, “Postpartum obsessive-compulsive phenomena: a psychometric and epidemiologic study in a Portuguese sample”, envolveu 212 mulheres, que foram alvo de um questionário seis meses após o nascimento do bebé, apesar de a maioria começar a ter um quadro sintomatológico “logo após o nascimento do bebé ou a partir do terceiro mês de gravidez”.

74,1% das inquiridas registaram pelo menos um pensamento obsessivo-compulsivo, como ter medo de deixar cair o seu bebé. Já 41,5% destas mulheres assumiram verificar repetidamente o bebé enquanto ele está a dormir, ultrapassando assim a barreira dos pensamentos e passando para a obsessão comportamental. Da totalidade da amostra, apenas 24,1% não reportaram qualquer obsessão ou compulsão.

“Estas obsessões ou compulsões não significam, por si só, que as inquiridas sofram de perturbação obsessiva-compulsiva – só 2,4% foram diagnosticadas como tal, o que distingue quem sofre de quem não sofre da doença não é o conteúdo dos pensamentos e comportamentos, mas sim o seu caráter repetitivo, intrusivo e perturbador da vida quotidiana“, esclarecem os investigadores.

As Perturbações Obessessivo-compulsivas (POC) derivam não apenas das alterações hormonais a que as mulheres estão sujeitas durante o período de gestação e no pós-parto, mas também das alterações psicossociais “vindas do grande acréscimo de responsabilidade, muito exacerbado quando a mulher engravida e principalmente quando nasce o bebé”, conforme declara Ana Telma Parreira ao Observador.

Por isso mesmo, Ana Telma Pereira, investigadora do Instituto de Psicologia Médica e principal autora do estudo, sublinha a importância de “avaliar e detetar o mais atempadamente possível a presença de sintomas e os fatores de risco em várias esferas da perturbação psicológica perinatal (como Perturbação Obsessivo-Compulsiva, depressão e ansiedade), até porque as consequências negativas não são apenas para a mulher, mas também para a descendência, podendo afetar o desenvolvimento dos filhos”.

Segundo a agência Lusa, o trabalho conduzido pela equipa do Instituto de Psicologia Médica foi pioneiro na aplicação de uma versão portuguesa da Perinatal Obsessive-Compulsive Scale, o único instrumento utilizado a nível internacional para avaliar os sintomas da POC.

O diretor do Instituto de Psicologia Médica da Faculdade de Medicina da UC e coautor da investigação, António Ferreira de Macedo, afirma que o novo instrumento de avaliação “assume particular importância tendo em conta que, entre as doenças mentais comuns (como ansiedade, depressão e fobias), “a POC é a menos bem diagnosticada e a que leva mais tempo entre o primeiro sintoma e o pedido de ajuda“.

Os investigadores estão a desenvolver um novo ensaio clínico que, coordenado pela supervisora clínica do projeto Mariana Marques, testa a eficácia de um programa de intervenção em grupo, baseado em terapias cognitivo-comportamentais, que envolem exercícios de mindfullness e autocompaixão.

No futuro, os cientistas têm como meta incluir também os pais, porque, como refere Ana Telma Pereira: “É errado ficar com a ideia de que isto são coisas só das mulheres”.

O estudo decorreu no âmbito do projeto “Screening, prevention and early intervention in perinatal psychological distress – effectiveness of a new program in primary healthcare, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

EQ/SO

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