18 Jul, 2019

Pioneiro na transplantação salienta alterações na recolha de órgãos nos últimos 50 anos

O antigo cirurgião Linhares Furtado, responsável pelo primeiro transplante de órgãos realizado em Portugal, há 50 anos, salientou hoje que, atualmente, se recolhem órgãos que outrora não eram aproveitados por questões de idade.

“Felizmente, morre muito menos gente nas estradas em condições e em idade de dar órgãos. Por outro lado, morrem muito mais velhos e aproveitam-se órgãos que outrora não eram muitos deles aproveitados por razões de idade”, disse o médico à agência Lusa.

A primeira transplantação de órgãos em Portugal data de 20 de julho de 1969, quando uma equipa médica liderada pelo cirurgião Linhares Furtado fez, nos Hospitais da Universidade de Coimbra, um transplante renal com dador vivo, intervenção pioneira, na altura, no país.

“Quando comecei, as doações andavam nas pessoas entre os 20 e tal, 30 anos e menos, muito menos. Hoje em dia, a média está pelos 60 e varia com as regiões do país”, disse o antigo cirurgião, considerando que este aspeto negativo é superado pelo facto de morrerem cada vez menos pessoas jovens de acidente de viação.

A questão da idade mais avançada dos doadores parece não ser um problema, na medida em que, segundo Linhares Furtado, o que conta é a qualidade dos órgãos e “uma boa compatibilidade” com o recetor. E deu como exemplo uma bisavó, de 103 anos, que deu um rim a um bisneto, na Grécia, há uns anos.

“Portanto, a idade biológica conta muito”, sublinhou o antigo cirurgião, que reconhece alguma diminuição na recolha de órgãos para transplante, mas “não de uma forma totalmente significativa”.

Segundo o médico, “pode haver um indivíduo de 50 anos com nefropatias (doenças renais) e haver uma pessoa de 80 ou 90 anos com rins maravilhosos”.

Neste últimos 50 anos, frisou, a quantidade de imunossupressores existentes (substâncias que impedem a rejeição) “é muitíssimo maior”, o que aumentou a eficácia das transplantações.

“A verdade é que, se a compatibilidade não era excelente, o risco de rejeição era muito elevado e hoje não. Posso recorrer, eu diria a mais de uma dúzia de imunossupressores diferentes, quase todos por via oral”, referiu.

O antigo cirurgião destaca que Portugal continua a ter um índice de colheitas “bastante alto, ocupando uma posição bastante notável desde há muito tempo, sobretudo desde que há os gabinetes de coordenação da colheita e transplantação de órgãos”.

Linhares Furtado realça que um aspeto bastante importante nas colheitas é “a doação in vivo”, considerando que “as pessoas que realmente prescindem de um órgão seu, dos órgãos pares, como o caso do rim ou do pulmão ou de uma parte do fígado, para dar a um ente próximo o afastado, são os verdadeiros heróis”.

“O grande problema é realmente órgãos para transplantar e depois há ainda a visão do futuro. Depositou-se muita esperança em órgãos de animais, geneticamente modificados, e dizia-se que seria em 10, 20, 30 anos, mas uma a primeira transplantação há 30 ou 40 anos com um fígado de macaco, em condições excecionalmente boas, falhou”, disse.

O antigo cirurgião dos Hospitais da Universidade de Coimbra deposita grande esperança nos tratamentos da “engenharia genética, o que é verdadeiramente extraordinário”, estando convencido que, dentro de mais algum tempo, “não muito, isso passa a ser acessível para muitos doentes e a muitas doenças”.

O pioneiro na transplantação de órgãos em Coimbra acredita ainda que, “um dia”, será possível criar órgãos artificialmente, nomeadamente o rim e o coração, para substituir os órgãos com lesões.

SO/Lusa

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