Entrevista: 70% das pessoas com diabetes tipo 2 têm doença do fígado não alcoólico

Ao Saúde Online, Paula Macedo, professora de Fisiologia e investigadora do CEDOC, alerta que ainda não é conhecido o impacto que a NAFLD pode ter nestes doentes. Está a decorrer um estudo, promovido pela APDP, para avaliar essa relação.

Qual a relação conhecida entre a doença do fígado não alcoólico (NAFLD) e a diabetes?

A doença do fígado não alcoólico (NAFLD) tem uma prevalência elevada entre as pessoas com diabetes tipo 2 – 70% das pessoas com diabetes tipo 2 têm também NAFLD.

O que ainda não está bem distrinçado é o impacto desta doença nas alterações da glicemia características da diabetes tipo 2, especificamente a relação entre os vários estadios da NAFLD e a diabetes tipo 2, ou seja de que forma é que os diferentes estadios da NAFLD influenciam as várias manifestações da diabetes tipo 2. Estamos a tentar compreender melhor essa relação num estudo desenvolvido na APDP que olha para a forma como os diferentes estadios da NAFLD (que pode originar fibrose, cirrose ou carcinoma hepático) influenciam a evolução da diabetes tipo 2 e a sua relação com outras comorbilidades como as doenças cardiovasculares ou a nefropatia diabética.

Prof. Paula Macedo, professora de Fisiologia na Universidade Nova de Lisboa e do Departamento de Ciências Médicas da Universidade de Aveiro, investigadora do CEDOC e membro da Direcção da APDP.

É importante também realçar que em ambas as patologias NAFLD  e diabetes tipo 2 pode existir dislipidemia. O fígado tem um papel muito relevante no controlo da mesma.

Um estudo, publicado em 2016, revelava que mais de 70% das pessoas com Diabetes tipo 2 tem NAFLD. Que desafios e preocupações é que esta relação tão forte coloca à comunidade médica?

O primeiro desafio passa pelo diagnóstico da NAFLD e das suas complicações, como a fibrose ou inflamação hepática. O gold standart para o diagnóstico desta doença é a biópsia hepática o que só por si o torna inconveniente. Até haver uma forma mais fácil de avaliar a NAFLD de forma não invasiva mas precisa , o diagnóstico continuará a ser um grande desafio.

O segundo desafio passa pela adequação da terapêutica às diferentes fases da NAFLD. Alguns estudos mostram que há fármacos para tratar a diabetes tipo 2 que têm efeito na NAFLD mas há grupos terapêuticos cuja resposta ainda não é clara. Depende da população que estamos a estudar e do estadio em que a NAFLD se encontra.

Temos que tentar responder a estas questões de forma a prever de forma mais sólida qual a melhor abordagem para conseguir prevenir a sua progressão ou até mesmo promover a sua regressão.

Aquilo que alguns estudos já revelam é que uma dieta hipocalórica prolongada pode ter efeitos positivos sobre a diabetes tipo 2 e levar a NAFLD a entrar em remissão.

Em que consiste o qualitative case study da APDP, que incidiu na relação entre estas duas doenças?

Na APDP estamos a avaliar a esteatose hepática (gordura no fígado) nos doentes com diabetes tipo 2. Neste estudo estamos a tentar associar os diferentes estadios da doença à terapêutica que a pessoa faz, à progressão da diabetes tipo 2 e ao controlo desta doença. Contamos ter resultados deste estudo no final de 2020.

Paralelamente tivemos na APDP uma aluna de doutoramento que fez um inquérito de percepção sobre NAFLD junto dos doentes que nos ajudará a saber como abordar as pessoas com diabetes tipo 2 para melhorar o conhecimento desta patologia junto das mesmas.

TC / Saúde Online

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