19 Dez, 2018

Maioria dos pais de crianças hemofílicas sente que doença condiciona vida do filho

Sete em cada dez pais de crianças com hemofilia sente que a doença condiciona a vida do filho e mais de metade admite ter dificuldades em gerir as emoções e os receios provocados pela possibilidade de uma hemorragia.

O inquérito “Perceções sobre hemofilia: impacto, gestão do tratamento, envolvimento e informação” que envolveu cuidadores, pessoas com hemofilia, profissionais de saúde, políticos e reguladores, foi divulgado hoje no encontro “Hemofilia – Hemorragias Zero, um mito ou uma realidade”, promovido pela Associação Portuguesa de Hemofilia e de outras Coagulopatias Congénitas (APH) e pela Assembleia da República.

Segundo o estudo, que envolveu uma amostra de 112 inquiridos, 71% dos cuidadores (pais de crianças com hemofilia até aos 14 anos) sente que a doença condiciona a vida do filho, apontando causas como as limitações físicas impostas pela doença, o receio de uma hemorragia e/ou a necessidade de ter o tratamento sempre disponível.

Também 71% dos hemofílicos inquiridos disse sentir que a doença condiciona a sua vida de alguma forma, seja em termos de mobilidade, devido aos danos provocados nas articulações, pelo tempo investido no tratamento e/ou pelo receio de ter uma hemorragia.

Apenas 14% dos cuidadores disse que o filho tem zero hemorragias por ano, enquanto 72% indicou que tem entre uma a cinco, o que revela que “o tratamento não está a ter o resultado desejável”, sublinha o estudo.

Mais de metade dos cuidadores (53%) considera aceitável que o filho sofra entre uma e cinco hemorragias por ano e 43% disse “não acreditar que é possível o filho viver sem hemorragias”.

“Sem o total conhecimento de que é possível atingir melhores resultados, estes cuidadores não poderão intervir no processo de tomada de decisão de forma benéfica para os seus filhos”, adverte o estudo.

Apesar de ser possível viver sem hemorragias, 42,3% dos profissionais de saúde ainda considera aceitável uma a cinco hemorragias anuais, o que mostra que, mesmo entre os profissionais, a hemofilia e o seu tratamento “ainda não são totalmente compreendidos.”

Para os autores do estudo, este é um “dado preocupante”, uma vez que estes são os principais responsáveis pelo tratamento e esclarecimento das pessoas, considerando fundamental estes estejam mais capacitados para sensibilizar os doentes para uma maior exigência no tratamento”.

Quanto ao grupo poder político e reguladores, as perceções divergem, por um lado consideram que o maior impacto da hemofilia na vida dos doentes se refere à autonomia e incapacidade e, por outro, consideram que esse impacto vem sobretudo pela privação imposta por amigos ou familiares para desempenhar determinadas atividades por lhes poder provocar hemorragias.

Todos os profissionais de saúde inquiridos apontam a profilaxia como “tratamento ideal e preferencial na hemofilia”. Contudo, declararam alguma resistência dos doentes na adesão ao tratamento, por não quererem ser picados, pela negação da doença, pela frequência do tratamento ou pela dificuldade na autoadministração do fator.

A grande maioria (92,3%) reconhece ser necessário incluir acompanhamento psicológico nos cuidados prestados aos hemofílicos, porque é uma doença que acarreta “uma carga emocional pesada”.

Sobre o modelo de resposta para a hemofilia em Portugal, 27% dos profissionais de saúde reconhece que não funciona e 19% dos hemofílicos considera que é insuficiente.

“Este estudo deve obrigar-nos a repensar a forma como estamos a encarar esta doença. Quase todas as pessoas com hemofilia e cuidadores aceitarem as hemorragias como uma condição normal, mesmo afirmando que fazem profilaxia, é muito grave”, afirmou o presidente da APH, Miguel Crato.

Miguel Crato sublinha que “são as hemorragias que limitam e degradam a vida das pessoas com hemofilia”, defendendo ser “urgente que a profilaxia e a adesão ao tratamento sejam melhorados, exigindo-se uma personalização do tratamento que conduza às zero hemorragias”.

A hemofilia é uma doença rara, crónica e hereditária, potencialmente incapacitante, estimando-se que que existam cerca de 700 a 800 casos em Portugal e cerca de 350.000 no mundo.

LUSA

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