10 Abr, 2017

Mundipharma… Mudar o paradigma do sector farmacêutico português

Com vendas de pouco mais de um milhão de euros em 2016, a multinacional norte-americana prevê vendas superiores a 10 milhões dentro de cinco anos

A Mundipharma, multinacional norte-americana presente em 51 países, com um volume de vendas que em 2015 atingiu 4 mil milhões de dólares, está em Portugal desde Dezembro de 2015, com escritórios próprios, ainda que muitos dos seus produtos sejam comercializados no mercado nacional há mais tempo, através de licenças de comercialização, e pela própria Mundipharma, como é o caso das morfinas, comercializadas diretamente pela empresa de 2004 a 2013.

A partir de 2013 e até à sua fixação em Portugal, as dificuldades na obtenção de comparticipação de produtos, levaram a multinacional a estabelecer parcerias com laboratórios locais: com a Companhia Portuguesa de Higiene (entretanto adquirida pela espanhola Ferrer) e com a OM Pharma (hoje integrada no grupo italiano BeForPharma). Em causa quatro medicamentos; três dos quais licenciados à Ferrer e um à OM: à primeira, o DepoCyte, indicado no tratamento intratecal da meningite linfomatosa; o Levact, indicado no tratamento de primeira linha da Leucemia Linfocítica Crónica e o Targin, aprovado como analgésico e no tratamento da obstipação em doentes medicados com analgésicos opiáceos.

Já relativamente à parceria com a OM, que incidia sobre o único medicamento que a Mundipharma atualmente comercializa em Portugal, o Flutiform, uma associação fixa, única no mercado, indicada para o tratamento da asma, administrada através de um dispositivo de última geração, acabaria por não avançar por decisão estratégica da OM, mesmo após a aprovação, pelas autoridades portuguesas, da comparticipação do produto.

Uma decisão que se revelaria decisiva para a entrada da empresa no mercado nacional. “Foi uma excelente oportunidade de antecipar a vinda da Mundipharma para Portugal, prevista inicialmente para 2018”, afirmou ao SaúdeOnline Salvador López, Diretor-Geral da empresa no nosso país.

A Mundipharma tem registado, desde a sua fundação um crescimento “orgânico” sustentado, sublinha López, por via do desenvolvimento e investigação dos seus próprios produtos e não, como aconteceu com muitas outras multinacionais, por via de aquisições ou fusões com outras companhias. “O que tem permitido manter a cultura que esteve na sua origem”, que de outra forma se diluiria, sublinha.

Uma equipa com 24 diretores-gerais

A equipa “fundadora” da Mundipharma Portugal reflete, também, o espírito empreendedor que norteia toda a atividade da Multinacional e que resulta num caldo cultural invulgar: uma empresa americana, gerida por um advogado espanhol e vinte e quatro colaboradores oriundos de diferentes áreas de atividade. “Acreditamos na diversidade; que a multiplicidade de opiniões traz valor acrescentado à decisão final”, explica Salvador López. A aposta numa subsidiária portuguesa foi também uma decisão em contraciclo com a tendência de iberização do mercado, com muitas empresas a transferirem os centros de decisão de Portugal para Espanha. “Acreditamos que o know how local é muito importante e permite ganhos de eficiência muito mais significativos do que os que eventualmente poderiam resultar da concentração e partilha de serviços da iberização das operações”, explica Salvador López. “Apostamos numa cultura de agilidade e rapidez na tomada de decisões, que só a proximidade e autonomia permite. Uma cultura que é transversal a toda a empresa. Costumo dizer que na Mundipharma Portugal somos 24 diretores-gerais. Cada um é diretor-geral da sua esfera de atuação, dos vendedores aos especialistas em market access”, assegura, para logo acrescentar: “contratamos talento e deixamos que este flua, incentivando a criatividade. Esta é, na nossa perspetiva, a melhor forma de obtermos bons resultados”.

Resultados que se refletem nas vendas. Em 2016, a empresa faturou cerca de um milhão de euros. “Em 2017, as perspetivas apontam para um valor superior a 2 milhões de euros, mais do dobro do que faturámos no primeiro ano de atividade”, afirma Salvador López. Os resultados alcançados em 2016 e as perspetivas para 2017 referem-se às vendas do Flutiform, o único produto comercializado diretamente pela Mundiphama Portugal. “Trata-se de um medicamento que na opinião dos médicos junta o “melhor de dois mundos”: “combina o broncodilatador com ação mais rápida e o corticosteroide mais potente (LAMA e LADA). A que se associa um dispositivo inalatório muito eficiente e de fácil utilização, que fraciona as partículas a um diâmetro que permite atingir a árvore brônquica mais distal, e assim um melhor controlo da sintomatologia”, descreve López.

Em 2018, com a recuperação dos produtos licenciados à Ferrer, o volume de vendas da filial portuguesa irá crescer substancialmente. “Temos como objetivo atingir, dentro de cinco anos, dez milhões de euros”, precisa o responsável. Um objetivo cuja concretização está associada à previsão de lançamento, até ao final do ano, do Penthrox, um novo produto na área da dor aguda, com uma forma de administração inovadora: um spray analgésico que atua entre 2 a 3 minutos. Será o primeiro produto indicado no alívio da dor aguda inalado, sublinha Salvador López que acrescenta: o efeito prolonga-se por entre meia e uma hora, em função do volume inalado pelo doente. Uma característica também ela inovadora, já que permite que o doente possa “afinar” a administração do produto às suas necessidades específicas de analgesia.

“Acreditamos que se vai revelar muito útil para os sistemas de emergência médica, como o INEM e mesmo a nível hospitalar, dada a sua forma de administração, que dispensa o recurso a acessos venosos periféricos para administração medicamentosa, como hoje acontece, libertando recursos de enfermagem e médicos.

A substância ativa, o metoxiflurano não é nova. De facto, é já utilizada há mais de 30 anos na Austrália e na Nova Zelândia. Para além da via de administração, o Penthrox tem ainda como mais-valia o facto de não ser um opióide, com todas as desvantagens associadas a este tipo de medicamentos, desde logo a necessidade de monitorização permanente do doente.

As contingências que marcam o mercado farmacêutico Português, como as dificuldades na aprovação de comparticipação de novos produtos e os prazos de pagamento, com uma dívida em atraso à indústria farmacêutica que tem crescido, em média, desde janeiro de 2015, cerca de 30 milhões de euros por mês, com um agravamento para quase o dobro nos primeiros dois meses deste ano, não intimidam Salvador López. Apostámos em Portugal porque acreditamos que o país vai ultrapassar a crise que marcou os últimos anos. “Criámos emprego, contribuímos com impostos e as autoridades portuguesas são sensíveis a isso. Apostámos em Portugal quando muitos outros decidiram sair do país, deslocando as operações para Espanha e para outros países, porque acreditamos que a economia portuguesa vai crescer e porque é importante que os portugueses tenham acesso à inovação terapêutica da mesma forma que os demais europeus. A inovação não é uma despesa! É um investimento, que permite poupanças e uma gestão mais eficiente do dinheiro público”, defende. Uma perspetiva que, diz, é corroborada pelo aumento do número de aprovações de novos medicamentos pela Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (INFARMED) que se tem vindo a registar desde 2013. Já relativamente à dívida em atraso, não constitui por enquanto, um problema para a empresa, já que o único produto que comercializa diretamente é de ambulatório e não hospitalar. Já para o ano, quando recuperarem os medicamentos de uso hospitalar atualmente licenciados à Ferrer, “aí sim, será um problema”, reconhece, que acarretará custos “que teremos que se repercutir no peço dos medicamentos”, alerta. Mas mostra-se otimista. “A Mundipharma quer mudar o paradigma do sector farmacêutico português; trabalhando em conjunto com as autoridades portuguesas no sentido de introduzir inovação, que é necessária, a preços comportáveis para o Estado. O nosso modelo de negócio assenta na competência dos nossos colaboradores e na boa relação destes com os profissionais de saúde. Comparativamente com outras multinacionais, temos uma equipa pequena de colaboradores. Mas temos as pessoas certas, talentosas, com um nível de qualificação que nos permite superar essa aparente fragilidade”, afirma. “A atestá-lo as vendas, em 2016, do Flutiform, em que a média por delegado superou toda a concorrência”, exemplifica, defendendo que “se todas as empresas conseguissem estes resultados de eficiência, reduziriam os custos o que permitiria reduzir os preços dos medicamentos. Com isto ganhavam as empresas, o Estado e a população”, assegura. Uma eficiência que para Salvador López também deve ser objetivo dos cidadãos. “Estima-se que metade dos doentes asmáticos não têm a sua doença controlada. O que acarreta custos enormes para o Estado, com internamentos e recursos às urgências. É preciso investir também nesta área, ensinando os doentes, desde logo que a asma, tal como a diabetes ou a hipertensão, é uma doença crónica, que necessita de cuidados permanentes, que pode ser controlada eficazmente, utilizando de forma adequada os inaladores e cumprindo as recomendações dos médicos”, preconiza.

Uma empresa familiar com vocação filantrópica

Fundada há mais de 60 anos em Nova Iorque pelos irmãos Mortimer e Raymond Sackler, dois médicos de ascendência polaca, filhos de um casal de merceeiros judeus de Brooklyn, a Mundipharma resultou da aquisição, em 1952, da Purdue Frederick Company, uma farmacêutica igualmente fundada por dois médicos, que se tornou mundialmente conhecida como fabricante do antisséptico Betadine.

Líder na área da analgesia, a empresa teve, na investigação e desenvolvimento de medicamentos de libertação prolongada de morfina uma dos seus principais êxitos, que potenciaram a internacionalização das suas operações.

Na atualidade, a empresa mantém-se na posse da família Sackler, que ganhou notoriedade mundial como um dos principais mecenas das artes e ciências.

Da vasta lista de projetos filantrópicos que ostentam o seu nome, destacam-se a Sackler School of Graduate Biomedical Sciences, da Universidade de Tufts, no Massachusetts, o Sackler Institute of Graduate Biomedical Sciences, da Faculdade de Medicina da Universidade de Nova Iorque, o Instituto Sackler de Farmacologia Pulmonar, no Kings College, de Londres, o Laboratório Sacker de Astrofísica da Universidade de Leiden e a Biblioteca Sackler, da Universidade de Oxford.

De ascendência judaica, os irmãos Sackler deixaram obra, também em Israel, de que a Faculdade de Medicina da Universidade de Telavive é um dos mais importantes exemplos.

A cultura familiar marcada pela estratégia de inovação, que se reflete na aposta na investigação e desenvolvimento de novos fármacos mantém-se sob a direção de Raymond Sackler, um dos irmãos fundadores ainda vivos, que participa ativamente em todas as decisões estratégicas da companhia a nível global. Tal como o irmão Mortimer, Raymond tem-se destacado pelo apoio dado às ciências um pouco por todo o mundo, fundando universidades, cátedras, pesquisas científicas e também nas belas artes, com a criação de galerias e alas temáticas em alguns dos mais importantes museus do mundo, como as que lhe são dedicadas, no Museu Britânico, no Louvre ou no Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque.

Instituto Mundipharma

A vocação filantrópica da multinacional norte-americana repercute-se nas subsidiárias internacionais. Portugal não é exceção. Uma das novidades que marcaram e entrada da Mundipharma em Portugal foi a decisão de reinvestir a totalidade do valor faturado no nosso país. Ao SaúdeOnline Salvador López explicou como está a ser aplica a verba, superior a um milhão de euros. “Vamos investir esse montante e ainda mais em várias iniciativas, desde reuniões médicas ao financiamento de estudos de investigação e ainda em projetos de literacia em saúde, entre outros. “Neste momento, estamos a financiar três estudos de investigação na área respiratória e um outro na área da dor, com o novo produto. Colaboramos também com Organizações não-Governamentais, universidades portuguesas e outras entidades, em diversos projetos.

É o caso da parceria com a Fundação Make a Wish, que tem como missão realizar desejos de crianças e jovens, entre os 3 e os 18 anos, com doenças graves, progressivas, degenerativas ou malignas, para lhes levar um momento de alegria e esperança. Com a Faculdade de Medicina da Universidade Nova de Lisboa, patrocinamos o Hospital da Bonecada e com a Faculdade de Medicina do Porto estamos a apoiar o desenvolvimento de uma «app». Patrocinamos ainda a Equipa Olímpica Portuguesa de K2.

 

MMM

 

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